As coligações que historicamente viabilizavam o acesso às cadeiras parlamentares foram riscadas da legislação e substituídas pelas federações. O advogado eleitoral Antonio Augusto Mayer dos Santos lembra que a nova modalidade de consórcio político foi instituída por leis aprovadas em 2021, regulamentando tópicos de leis de 1995 e 1997.
“Em vista de suas peculiaridades e exotismos, algumas considerações se justificam”, pontua Antonio Augusto, que passa a enumerar: “De início, é realçar que a partir desse novo regramento dois ou mais partidos que já disponham de registro definitivo junto ao Tribunal Superior Eleitoral têm o direito de reunir-se através do regime de federação. Após ser formalizada e averbada pelos interessados perante o TSE, juntamente com um programa e um estatuto, a mesma passará a existir e atuar como se fosse uma única agremiação”.
Pode parecer uma coligação, ou uma ideia reciclada dela. Para o pleito de 2022, três federações foram formadas perante o tribunal. Antonio Augusto destaca o vínculo entre as siglas, que, além de inédito, é pouco convincente. Caracteriza-se pela sua despropositada rigidez num país sem maior tradição de longevidades partidárias.
Ele prossegue: “Este quadro é facilmente constatável porque enquanto as coligações eram alianças locais e transitórias, fadadas ao desaparecimento após o pleito, as federações têm abrangência nacional e perduram por no mínimo quatro anos. Nesse contexto, o partido que optar pelo rompimento prematuro do pacto e, com isso, se retirar do condomínio, ficará sujeito a sanções severas, cumulativas e nitidamente desproporcionais, quais sejam: estará proibido de ingressar em outra federação, não poderá celebrar coligação majoritária nas duas eleições seguintes e, por fim, ficará impossibilitado de acessar o fundo partidário até que aquele prazo escoe”.
Não é só, diz ele.
– Pretensiosa e praticamente burlando a extinção das coligações, a lei dispôs que as federações, tanto no curso das campanhas eleitorais como posteriormente, no âmbito do funcionamento parlamentar, estarão submetidas a todas as normas que regem a escolha e registro de candidatos, arrecadação de recursos, propaganda, contagem de votos, obtenção de vagas, prestação de contas e, por fim, convocação de suplentes. Trata-se de mais uma jabuticaba(*) no país de Macunaíma ou da evolução do sistema? somente as urnas e o tempo evidenciarão. Alea jacta est.
(*) Sentido figurado da fruta jabuticaba: forma pejorativa de indicar algo que só exista no Brasil, aplicada geralmente a leis estapafúrdias.
Federações definidas no âmbito nacional
Brasil da Esperança (PT, PCdoB e PV)
Em abril, o Partido dos Trabalhadores (PT), o Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e o Partido Verde (PV) optaram por se unir numa federação nomeada “Brasil da Esperança” (FE Brasil). Os partidos têm juntos 69 deputados federais, segunda maior bancada, atrás apenas do PL de Bolsonaro.
A Comissão Executiva da FE Brasil tem 18 membros: os presidentes dos três partidos e as outras 15 vagas divididas também pela votação para a Câmara em 2018. Assim, o PT tem 12 cadeiras (11 proporcionais mais a do presidente) enquanto PV e PCdoB têm três cada (sendo duas proporcionais e a do presidente).
O órgão máximo decisório da federação conta com 60 membros, sendo nove igualmente divididos (três por partido) e as outras 51 cadeiras divididas proporcionalmente ao quantitativo de votos obtidos para a Câmara Federal em 2018. Com isso o PT tem 43 cadeiras (40 proporcionais e três da divisão igualitária), o PV tem nove cadeiras (seis mais três) e o PCdoB tem oito (cinco mais). Essa composição dura até o fim deste ano.
Apesar da ampla maioria petista, as decisões precisam ser aprovadas por três quartos do grupo (45 membros), de modo que o PT, mesmo votando em bloco, ainda precisa de votos dos aliados para aprovar medidas. Cada partido tem a obrigação de indicar mulheres para pelo menos 30% das vagas e um mínimo de 20% das vagas para pessoas negras ou indígenas. O PSB participou das tratativas para integrar a federação, mas acabou recuando.
PSOL e Rede
Os partidos têm, juntos, 10 deputados federais. A federação ainda não tem nome e a aprovação rendeu atritos internos nas duas organizações. Na Rede há certa resistência pelo apoio à candidatura de Lula, enquanto no PSOL as queixas são justamente pelo posicionamento de direita de parte dos políticos filiados à Rede. No tema da descriminalização do aborto, por exemplo, os partidos têm posições opostas. Na tentativa de pacificar os atritos, a federação tem um estatuto mais “flexível” quanto à obediência às determinações. Tanto nas votações no Congresso como nos apoios a candidaturas, os parlamentares terão “liberdade” para desobedecer a determinações da federação. A expulsão ou não de um parlamentar ficará a cargo exclusivamente do partido, sem interferência da federação.
Para o Rio Grande, além das duas federadas, existe mais a do PSDB e Cidadania. A primeira apresenta a candidatura de Edgar Pretto (PT) ao governo. A terceira, a do governador Eduardo Leite (PSDB) ao governo.