A recente operação da Polícia Federal, que revelou fraudes bilionárias em descontos indevidos nos benefícios de aposentados e pensionistas do INSS, não pode ser tratada como apenas mais um escândalo entre tantos. Estima-se que cerca de 9 milhões de brasileiros tenham sido impactados, com prejuízos que podem ultrapassar os R$ 8 bilhões. Trata-se de um dos maiores ataques já registrados ao sistema de proteção social do país — e às pessoas que mais precisam de amparo.
Segundo as investigações, os criminosos utilizavam dados vazados de beneficiários para filiações forjadas em entidades sindicais e associações fictícias. Os descontos, feitos automaticamente nos contracheques do INSS, ocorriam sem consentimento das vítimas. É uma apropriação indébita escancarada, realizada em larga escala e com impacto direto sobre a renda de milhões de aposentados, muitos deles com condições financeiras já fragilizadas.
Diante disso, a reação precisa ser à altura do dano causado: investigação profunda, responsabilização exemplar e devolução imediata dos valores desviados. Mas é igualmente necessário que esse episódio não sirva de combustível para uma narrativa perigosa e simplificadora: a de que todo o sistema sindical ou associativo do país é corrupto ou desnecessário.
Essa generalização é tão injusta quanto contraproducente. O Brasil tem uma história marcada por lutas trabalhistas que garantiram avanços sociais concretos: direitos, proteção legal, negociação coletiva e representação profissional. Existem milhares de entidades sérias, transparentes e comprometidas com a defesa dos trabalhadores — e é preciso preservá-las e fortalecê-las, não colocá-las sob suspeição generalizada.
A fraude exposta pela Polícia Federal revela, acima de tudo, uma falha sistêmica de controle. A vulnerabilidade no cruzamento de dados, a ausência de consentimento explícito e a falta de canais de fiscalização eficazes permitiram que um esquema dessa magnitude fosse implementado. Corrigir essas brechas é fundamental para restabelecer a confiança no sistema e proteger quem mais precisa.
Não há dúvidas de que estamos diante de um crime grave. Mas é necessário separar oportunismo criminoso de representação legítima. Jogar todos no mesmo balaio, por conveniência política ou desconhecimento, não fará justiça às vítimas nem contribuirá para a construção de um ambiente mais ético e seguro.
O que está em jogo, no fim das contas, não é apenas o ressarcimento de valores, mas a própria credibilidade de um sistema que deveria estar a serviço do cidadão. Que os culpados sejam punidos com o rigor da lei. E que a sociedade tenha maturidade para reconhecer quem são, de fato, os defensores do interesse público — e quem se aproveita dele para benefício próprio.
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Foto da Capa: José Cruz / Agência Brasil