Envelhecer é muito difícil, os corpos perdem a força, o vigor, a memória não é mais a mesma, grande parte das pessoas queridas já se foi e o mundo de quem é uma pessoa idosa é muito diferente daquele em que ela nasceu. Além disso, há a lembrança cada vez maior da finitude que se aproxima, sem falar que, em muitos casos, o próprio cérebro não funciona mais tão bem, o início da demência ou do mal de Alzheimer começa a se apresentar, e aquele ser outrora forte e seguro fica fragilizado, com medo e até vergonha.
E justamente essas pessoas que tanto contribuíram para que as gerações que lhes sucederam pudessem ter uma vida melhor, não raramente são negligenciadas e se tornam vítimas de familiares, vizinhos, estelionatários, vigaristas e de pessoas más, que lhes aplicam diversos golpes e praticam contra eles estelionatos, violência psicológica, física, financeira, entre outras. Sobre esses assuntos, vale dar uma lida no artigo que escrevi, publicado aqui na Sler, em 05 de fevereiro de 2024.
Hoje, escrevo este artigo com base em uma excelente apresentação realizada pela Dra. Ana Luiza Caruso, titular da Delegacia de Proteção ao Idoso de Porto Alegre, realizada no V Seminário da Comissão de Proteção à Pessoa Idosa do Instituto Brasileiro de Direito de Família do Rio Grande do Sul (IBDFAMRS), em 25 de outubro recente.
Na brilhante apresentação da Dra. Ana Luiza Caruso, ela destacou que os idosos, após serem vítimas de um crime, sentem medo, vergonha, insegurança e depressão. Muitos, inclusive, em razão dos sentimentos acima elencados, preferem manter em segredo o crime de que tiver sido vítima. Outros, mais fragilizados, sequer percebem que foram vítimas de um crime. Quando a violência é realizada por um familiar, a situação é ainda mais triste, a alegria vai embora e a tristeza permanece. Vale transcrever a pergunta realizada pela Dra. Ana Luiza: “É possível devolver a alegria a quem apanhou de um neto?” Segundo ela, “a situação jamais se recompõe!”.
A drogadição de familiares ou de pessoas que convivam ou tenham acesso à pessoa idosa também é um problema frequente. Em razão do vício, muitas pessoas se descontrolam e acabam cometendo violência contra os idosos para assim poderem comprar suas drogas. Este é um problema muito frequente, e as pessoas idosas, por medo ou pena quando se trata de um descendente, acabam ficando quietas.
Além disso, a maioria dos idosos brasileiros vive em situação de pobreza, com apenas um salário mínimo, quando tem essa sorte. Alguns vivem em lares de longa permanência. No Brasil, em que pese os lindos discursos dos políticos dos mais diversos partidos de que acabaram com a miséria de milhões de pessoas, um grande número de pessoas idosas vive em situação de extrema penúria e vulnerabilidade, descartadas pela sociedade e à espera da morte.
Golpes, prevenção e tipos mais comuns
Segundo a Dra. Ana Luíza, são três as premissas para a prevenção contra golpes:
– Nada que envolve dinheiro deve ser decidido às pressas.
– Ninguém dá nada para ninguém.
– Se seus filhos não podem saber, é porque está errado.
Muitos idosos ainda caem no golpe do bilhete premiado, em que o criminoso vende para alguém um bilhete premiado de valor expressivo por um valor bem menor, alegando que por alguma razão não pode receber o prêmio. Esse golpe é antigo, mas muita gente ainda cai nessa, e os idosos, assim como muitos jovens, não raciocinam direito quando veem a possibilidade de fazer um dinheiro fácil. A ganância não vai embora com a idade…
Outros são vítimas do aviso de compra não feita, no qual são direcionados para um número de telefone onde acabam passando seus dados, suas informações, senhas, etc., para os golpistas que deste modo conseguem acessar e movimentar as contas da vítima do golpe, causando-lhes muitos prejuízos. Uma forma de evitar este golpe é ir à própria agência bancária verificar o que houve, pois “nada que se faz por telefone é proibido de fazer na agência bancária”. Passar dados por telefone é arriscado, demanda atenção.
Um outro golpe muito comum é o de rever juros e parcelas de dívidas, onde o idoso, acreditando que está resolvendo um problema, acaba criando um maior ainda. Sem falar que há casos de funcionários de bancos que são pouco confiáveis e informam para os golpistas o nome dos idosos de quem tem dívidas para renegociar.
Muito comuns são os golpes do presente inesperado, no qual é pedido para a vítima o pagamento de uma taxa de entrega, e o do book fotográfico, no qual as pessoas são abordadas para fazerem fotografias caríssimas com a promessa de oportunidades no mercado publicitário. No caso das pessoas idosas, muitas são vítimas de preços extorsivos após a realização das fotografias.
O do parente internado precisando imediatamente de um depósito para ser atendido no hospital ou do falso sequestro já são clássicos. Eu mesmo já recebi diversas ligações de um suposto filho ou filha pedindo socorro… Bato o telefone na cara.
Alguns criminosos mais audaciosos entram nas agências e fingem ser funcionários. Deste modo, se oferecem para ajudar os idosos nos caixas eletrônicos, trocam seus cartões de crédito e saem realizando compras com os cartões das vítimas.
Existem também aquelas ligações avisando que um motoboy irá passar na casa do idoso para substituir o cartão do banco. Após a troca dos cartões, o motoboy corta o cartão, mas guarda intacto o chip que lhe permite utilizar o cartão bancário ou de crédito da vítima.
Os falsos empréstimos e promessas de crédito fácil, nos quais se paga uma taxa por tais serviços, são muito frequentes.
Existe também o golpe do auxílio emergencial, no qual a vítima é iludida de que é beneficiária, e para tanto passa suas informações cadastrais, inclusive o número da sua conta bancária e da respectiva senha.
A Dra. Ana Luiza salientou ainda que mais triste do que os golpes são os crimes cometidos pelos parentes, justamente aqueles que têm a obrigação de cuidar dos seus idosos. Muitos inclusive buscam a curatela como forma de se manter, em evidente detrimento do idoso.
No seminário, também foi destacado que o abuso psicológico abrange todas as formas de menosprezo, preconceito e discriminação. Tais ações causam tristeza, isolamento, solidão, sofrimento mental e depressão para a pessoa idosa.
Outrossim, vale destacar que a Dra. Ana Luiza frisou que ofensas com referência ao etarismo têm penas maiores, pois configuram injúria discriminatória, e ela destacou como principais crimes cometidos contra a pessoa idosa os abaixo mencionados:
- Impedir o idoso de exercer qualquer ato de cidadania por motivo de idade ou humilhar de qualquer forma pessoa idosa.
- Apropriar-se ou desviar bens, proventos ou rendimentos do idoso, dando-lhes aplicação diversa da finalidade.
- Reter cartão de crédito ou documento para assegurar o recebimento ou ressarcimento de dívidas.
- Exposição a perigo de integridade e saúde física ou psíquica, submeter a condições degradantes ou desumanas, privar de alimentos ou cuidados necessários quando obrigado a fazê-los ou submeter o idoso a trabalho excessivo ou inadequado.
- Coagir pessoa idosa (com ou sem discernimento) a doar, contratar, testar, ou outorgar procuração.
- Induzir pessoa idosa sem discernimento a outorgar procuração para administrar os bens do idoso.
- Negar atendimento pela recusa do idoso em outorgar procuração.
- Exibir ou veicular imagens depreciativas da pessoa do idoso.
Alerta: caso você esteja percebendo alguma conduta que possa ser prejudicial à pessoa idosa, utilize, por favor, os canais de denúncia, o disque 100, procure a polícia civil no número 197, a Brigada Militar no número 190, e a Delegacia do Idoso mais perto. Em Porto Alegre, ela fica na Avenida Ipiranga, 1803. Vamos ajudar a proteger as pessoas idosas!
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Foto da Capa: Freepik