Como aprendi em uma aula de direito de família no início dos anos 90, o Divórcio é uma evolução do direito para regulamentar a situação jurídica daqueles que não querem mais viver juntos ou até já se separaram, pelos mais diversos e até surpreendentes motivos. Digo isso, porque sou da década de 60, e até meados dos anos 80 havia um preconceito imenso contra pessoas que se separavam.
Felizmente venho de uma família que, desde aquela época, jamais deixou de gostar de alguém pela situação civil, fosse a de solteiro, desquitado, divorciado, amancebado integrante de união estável, divorciado, tico-tico o no fubá, viúvo ou viúva. Para eles era importante que as pessoas tivessem bons sentimentos, caráter e capacidade afetiva.
Nos anos 70, uma mulher só pedia separação se o marido fosse realmente de péssimo convívio, ela aguentava até o mais amargo fim o chato ou a peste com que fosse casada. Surpreendentemente, para mim, foi uma coisa inimaginável, quando meu avô, já idoso, decidiu se separar da minha avó paterna, que foi uma das pessoas mais doces e dedicadas que conheci. Logo depois, ele faleceu. Demorei para entender que ele tinha o direito de morrer em paz. Adolescente e muito indiscreto, perguntei a ela: “Vó, por que foi que vocês se separaram?” Ela, com a maior delicadeza, me respondeu: “Não sei, meu netinho, foi por um “somenos” que o Asdrúbal saiu de casa”. Somenos, para quem não é acostumado com esta expressão pouco usada, significa por um motivo irrelevante, de menor importância. Pois bem, este foi o primeiro “gray divorce” na minha família, ou seja, o primeiro divórcio de pessoas mais velhas, de cabeça branca, e a minha avó teve a classe de não destruir a imagem do meu avô para os filhos e netos. Mulheres como ela são raras, a maioria logo “dá a real” sobre o ex-amor, e alguns bem que merecem.
Em 25 de junho de 1977, o divórcio foi instituído no Brasil por meio de Emenda Constitucional, e na esteira veio a Lei do Divórcio, de 26 de dezembro de 1977, que terminou com a indissolubilidade do casamento, algo que fazia com que muita gente sonhasse em ser viúva ou viúvo, a depender do caso. Conheço até uma senhora realmente boa, mas que, em razão do “fartão”, confessou que queria muito ser viúva, e depois não gostou do novo estado civil.
Voltando ao tema, no Brasil, a partir de 1977 o número de divórcios e segundos casamentos, bem como de uniões estáveis aceitas pela sociedade e pelo mundo jurídico cresceu exponencialmente. As relações familiares passaram a ser um pouco mais transparentes, mais baseadas na família afetiva do que na família tradicional. Hoje, com o amadurecimento da sociedade temos diversos tipos de famílias, como comentei no artigo da semana passada.
Lembro que nos anos 90, eu ainda ouvia, muito, de algumas senhoras, que era melhor ficar com o marido e seus problemas conhecidos, do que arrumar outro cujos problemas elas ainda teriam de descobrir, os casais não deveriam se separar enquanto os filhos não tivessem crescidos, que isto destruiria a vida deles, ou porque na maioria dos casos a mulher seria prejudicada na partilha e não teria condições de se sustentar no mesmo padrão que vivia.
Não precisa ser advogado, estatístico ou trabalhar no IBGE para perceber que geralmente são as mulheres que pedem o divórcio, que dão um basta a uma relação hipócrita ou infeliz. De acordo com matéria publicada pela CNN, Luiz Hanns, doutor em psicologia clínica, diz que “em 70% dos divórcios, quem pede é a mulher”.
Isso me faz crer que as mulheres são melhores cônjuges do que os maridos, e que eles são mais comodistas, mesquinhos e tendem a se consolar com relações extraconjugais, empurram com a barriga enquanto der.
De acordo com artigo, publicado há 4 anos por Abdala Siqueria Advocacia e Assessoria Jurídica, no site do jus brasil, “de acordo com uma pesquisa realizada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), as mulheres são as que mais entram com o pedido de divórcio na Justiça”.
Dados recentes informam que no último ano, mais de 13 mil solicitações de divórcio foram feitas por mulheres enquanto os homens foram responsáveis por pouco mais de 5 mil pedidos. Nos Estados Unidos, a situação é igual: 69% dos pedidos são de mulheres contra 31% dos homens (pesquisa realizada na Stanford University).”
Mais recentemente, do final do século passado para cá, temos um novo fenômeno, que são os divórcios de pessoas com os cabelos cinza, em tons de prata e até de diamante, ou seja, dos coroas em geral, fato que é chamado de “Gray divorce” desde 2004.
Este fenômeno não acontece apenas no Brasil, mas nos Estados Unidos, no Canadá, na Inglaterra e, por óbvio, em diversos outros países. Muito bom o artigo da Forbes, publicado em 2019, no site, sobre o “Gray divorce”, o qual aponta ser uma tendência dado o aumento de pedidos de divórcio por casais mais maduros.
O termo “gray divorce” surgiu em 2004, quando foi divulgado um relatório da “The American Association of Retired Persons” para definir indivíduos com 50 anos ou mais, conforme artigo publicado no site, do escritório McKINLEY IRVIN Family Law, que também informa que conforme dados do Censo dos Estados Unidos, de 2021, 33,9% dos divórcios anuais foram referentes a casais com 55 anos ou mais. Este termo está associado à cor dos cabelos, e também são muito usados os termos “diamond” ou “silver splitters”, com o mesmo significado.
Segundo publicado, no artigo acima referido, as principais causas do fenômeno são:
(i) as pessoas estão vivendo mais, nos Estados Unidos a expectativa de vida aumentou em 10 anos desde os anos 60;
(ii) houve uma redução do estigma do divórcio;
(iii) muitos casais haviam decidido ficar juntos temporariamente em razão dos filhos;
(iv) mudanças culturais e diferenças de geração; e
(iv) uma taxa maior de divórcios de segundas núpcias.
Alguns dos problemas jurídicos que precisam ser avaliados cuidadosamente antes de se divorciar, especialmente nesta faixa etária, são as consequências referentes às pensões alimentícias e aquelas decorrentes da previdência social e também das previdências privadas. Isso pode ser um problema, e cada caso deve ser avaliado com atenção, preferencialmente antes de alguém pedir o divórcio.
Neste momento é importante salientar que conforme publicado no site do Superior Tribunal de Justiça (STJ), “a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que as contribuições feitas para plano de previdência fechada, em percentual do salário, aportadas pelo beneficiário e pelo patrocinador – na forma definida pelo estatuto da entidade –, não integram o patrimônio sujeito à comunhão de bens, a ser partilhado quando da extinção do vínculo conjugal”.
Cabe também salientar que o STJ, em 23/02/2022, decidiu que os depósitos em entidade aberta de previdência privada devem ser partilhados após a separação do casal.
Outro ponto a que aqueles que querem se separar com mais idade devem prestar atenção, pois para morrer basta estar vivo, são os testamentos que deixarem, realizados antes do divórcio. Com frequência, algumas pessoas se divorciam e acabam morrendo antes de cancelarem tais testamentos. As decisões podem ser bem diversas, pois algumas vezes casais continuam se querendo bem e se preocupando com o ex-cônjuge. Todavia, existem decisões em vários sentidos, muitos entendem que a base objetiva do testamento, aquilo que justifica a sua existência, estaria quebrada. Para mim, nessas circunstâncias, o testamento deveria ser respeitado, pois se a pessoa realmente quisesse deixar a outra pessoa sem herança, teria tomado as providências legais.
Em caso de divórcio ou de dissolução de união estável, recomendo que aquele que está pensando em algo tão drástico, nessa fase em que o tempo é cada vez mais curto, procure um advogado previamente, para traçar uma estratégia para não ser lesado ou até muito lesado na separação.
E para você, qual é a causa de as mulheres liderarem os pedidos de divórcio?
Foto da Capa: Freepik
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