O Código Civil brasileiro enumera duas hipóteses de exclusão dos herdeiros, a declaração de indigno por sentença judicial ou a deserdação por testamento realizada pelo autor da herança. Tanto a indignidade quanto a deserdação são reguladas pelo Código Civil (CC).
Da indignidade
Serão excluídos da sucessão, por indignidade, os herdeiros ou legatários:
I – que houverem sido autores, coautores ou partícipes de homicídio doloso, ou tentativa deste, contra a pessoa de cuja sucessão se tratar, seu cônjuge, companheiro, ascendente ou descendente;
II – que houverem acusado caluniosamente em juízo o autor da herança ou incorrerem em crime contra a sua honra, ou de seu cônjuge ou companheiro;
III – que, por violência ou meios fraudulentos, inibirem ou obstarem o autor da herança de dispor livremente de seus bens por ato de última vontade.
Para tanto há a necessidade de sentença que declare que houve a indignidade. O prazo para que os interessados proponham a ação de indignidade será de 4 (quatro) anos contados da abertura da sucessão, leia-se, da morte de quem deixou a herança. Vale salientar que, na hipótese do inciso I acima, o Ministério Público também poderá demandar em juízo a exclusão do herdeiro ou legatário.
Recentemente houve uma alteração legal sobre o tema que dispôs que, nos casos de indignidade acima referidos, o trânsito em julgado da sentença penal condenatória acarretará a imediata exclusão do herdeiro ou legatário indigno. Essas regras estão conflitando, pois uma determina que deve ser ajuizada ação de indignidade para a exclusão da sucessão, e a outra considera como suficiente para a exclusão da sucessão, ou seja, da herança, a sentença condenatória das respectivas ações penais. E se o autor da herança, ou seja, aquele que morreu, tiver perdoado seu filho, ou mesmo naquelas hipóteses quisesse manter seu filho herdeiro. Teria ele de fazer um testamento para que seu filho volte a ser herdeiro? Não tenho dúvida que isso será amplamente discutido nos tribunais.
Cumpre destacar que o fato de alguém ter sido excluído da sucessão, não significa que os filhos ou herdeiros do indigno deixem de receber a herança. Ao contrário, eles receberão como se o seu pai, por exemplo, tivesse morrido, antes que o avô. Eles sucederão o excluído, como se ele tivesse morrido antes da pessoa que deixou a herança. E se os sucessores do excluído falecerem, ele também não terá direito à eventual sucessão desses bens. O excluído sequer terá direito ao usufruto ou à administração dos bens que a seus sucessores couberem na herança.
Se o excluído da sucessão tiver recebidos frutos e rendimentos em razão dos bens da herança, ele terá de restitui-los, mas poderá ser indenizado, cobrar as despesas que tiver realizado para a conservação dos bens.
Vale ressaltar que se o ofendido pela indignidade conhecia a causa da indignidade ao fazer um testamento, e mesmo assim contemplou o indigno, essa disposição testamentária será válida.
Da deserdação
As causas de deserdação são mais amplas do que as de indignidade. Além da deserdação ser permitida nas hipóteses de indignidade, acima mencionadas, autorizam a deserdação dos descendentes por seus ascendentes as seguintes causas:
I – ofensa física;
II – injúria grave;
III – relações ilícitas com a madrasta ou com o padrasto;
IV – desamparo do ascendente em alienação mental ou grave enfermidade.
Outrossim, além das causas de indignidade, autorizam a deserdação dos ascendentes pelos descendentes os seguintes motivos:
I – ofensa física;
II – injúria grave;
III – relações ilícitas com a mulher ou companheira do filho ou a do neto, ou com o marido ou companheiro da filha ou o da neta;
IV – desamparo do filho ou neto com deficiência mental ou grave enfermidade.
Muito importante, somente com a expressa declaração da causa pode ser a deserdação ordenada em testamento, ao herdeiro instituído, ou àquele a que aproveitar a deserdação, caberá provar a veracidade da causa alegada no testamento. Esse direito de provar a causa de deserdação extingue-se no prazo de 4 (quatro) anos.
Salienta-se que embora haja muita controvérsia jurídica a esse respeito, não é qualquer ofensa, desavença ou desentendimento que poderá fundamentar a ação de indignidade. De acordo com entendimento recente do Superior Tribunal de Justiça é imprescindível que a ofensa seja grave a ponto de ocorrer condenação pelo juízo criminal.
A este passo vale transcrever os seguintes de acórdão referente ao Recurso Especial nº 2.023.098- DF (2022/0270996-3), do Superior Tribunal de Justiça, de 07 de março de 2023, cuja relatora foi a brilhante Ministra Nancy Andrighi.
“INDIGNIDADE POR OFENSA À HONRA DO AUTOR DA HERANÇA. PRÉVIA CONDENAÇÃO NO JUÍZO CRIMINAL. IMPRESCINDIBILIDADE. EXPRESSA DISPOSIÇÃO LEGAL (ART. 1.814, II, 2a FIGURA, DO CC/2002). CONTEXTO FAMILIAR EM QUE DESAVENÇAS E EVENTUAIS OFENSAS PODEM SER PROFERIDAS. NECESSIDADE, CONTUDO, DE QUE A OFENSA SEJA GRAVE A PONTO DE ESTIMULAR AÇÃO PENAL PRIVADA DO OFENDIDO E CONDENAÇÃO E DECISÃO CONDENATÓRIA PELO JUÍZO CRIMINAL.
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5- A imprescindibilidade da prévia condenação criminal também decorre do fato de que, nas relações familiares, é razoavelmente comum a existência de desavenças e de desentendimentos que, por vezes, infelizmente desbordam para palavras mais ríspidas, inadequadas e até mesmo ofensivas.
6– Em razão disso, para que haja a declaração de indignidade e consequente exclusão da sucessão, a ofensa à honra desferida pelo herdeiro deve ser tão grave a ponto de estimular o autor da herança a propor uma ação penal privada em face dele e gerar a prolação de decisão condenatória pelo juízo criminal reconhecendo que a presença de todos os elementos configuradores da infração penal.
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Se o ofendido não pretendeu buscar a sanção penal em vida (ou, se pretendeu, não a obteve), não faz sentido que se apure o eventual ilícito, após a sua morte e apenas incidentalmente no juízo cível, com o propósito de excluir o suposto ofensor da sucessão.”
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