No POA Inquieta, onde a diversidade e inclusão são alguns um dos propósitos do coletivo para a Porto Alegre, esse tema sempre traz muito interesse nas conversas nos grupos. E quem está atento a diversidade de raça, por exemplo, sabe da sua importância e provavelmente já está conectado ao quanto que a linguagem foi utilizada para reforçar o sistema de poder entre pessoas brancas e pretas. Assim, movimentos de enfrentamento ao racismo nos apresentaram palavras e expressões que estão cobertas de preconceito e violência contra as pessoas negras. Isso nos possibilitou refletir e substituí-las, porque compreendemos o quanto elas magoavam e ofendiam um grande número de pessoas.
É a partir deste olhar que gostaria de conversar com você sobre o Idadismo (ou etarismo e ageismo), quando a idade é utilizada para categorizar as pessoas de maneira a causar danos, humilhações e injustiças. Jovens são alvo de etarismo ao duvidarem das suas capacidades quando recém-formados, por exemplo. Porém, com o envelhecimento, as pessoas são mais vulneráveis ao ageísmo em diversas áreas das suas vidas: em menores oportunidades de trabalho, na inadequação de produtos, serviços e no atendimento para as faixas etárias mais velhas, por estereótipos de que são mais doentes, lentas, ranzinzas, esquecidas e atrapalhadas. Assim, o idadismo está presente nas pessoas, internamente, nas relações entre as pessoas, e na sociedade em geral. Mas, voltando a enxergar sob as lentes da linguagem, perceba que quando usamos determinadas palavras, expressões ou frases, muitas vezes somos idadistas e sequer percebemos. Veja esses exemplos:
Você ainda trabalha / estuda / dirige / dança / sai à noite…?
A gente usa muito essa frase querendo elogiar uma pessoa mais velha, sem perceber que a palavra “ainda” parte da ideia preconcebida de que essa pessoa não teria mais condições de exercer com autonomia o que desejar. Assim, quem sabe, sugerindo que essa pessoa tenha que renunciar àquela atividade.
Você está ótima/o! Nem parece a idade que tem!
No geral usamos essas frases quando estamos surpresos ou mesmo quando queremos elogiar a boa aparência de alguém. Por que é uma frase idadista? Porque a expectativa é de que com o envelhecer a pessoa esteja cheia de rugas, frágil e “acabada”. No Brasil, país campeão mundial de cirurgias plásticas (e aqui não me refiro às corretivas), essa frase também remete à uma supervalorização e uma conexão entre juventude e beleza. Assim, lembro velhice é um processo heterogêneo, que não é igual para todos, e que o belo não está ligado apenas a juventude.
Ih, estou ficando velho/a! Não sei onde coloquei a chave do carro!
Traz a ideia de que só pessoas idosas são esquecidas, quando na realidade o esquecimento ocorre em pessoas de qualquer idade, especialmente em períodos de estresse e falta de atenção.
Essas são apenas algumas frases que demonstram o quanto o idadismo está escondido na nossa linguagem cotidiana. E se o idadismo está na nossa linguagem é porque está no nosso pensamento e sentimento. Então, estando neles, te convido a pensar: como percebemos o envelhecimento? O nosso e o daquele que nos rodeiam?
A maior parte da população brasileira já tem mais de 30 anos. O Brasil possui mais de 36milhões de brasileiros com mais de 60 anos. No Rio Grande do Sul, temos uma população de 60+ maior do que de crianças e adolescentes de 14 anos. Porto Alegre está entre as capitais com o maior número de idosos do país. No entanto, estudos da Organização Mundial da Saúde – OMS apontam que uma em cada duas pessoas no mundo é considerada idadista e que o idadismo pode encurtar a vida de alguém em até 7,5 anos. Ou seja, ainda que não se perceba e o idadismo seja invisibilizado na sociedade, é preciso trazê-lo à consciência e começar a combatê-lo dado seus grandes prejuízos, em nível pessoal e institucional. Vale a pena.
Então, fica meu convite: acolha a velhice! O velho é o jovem que deu certo! A batalha da longevidade a medicina já nos concedeu, mas estar bem com o nosso próprio envelhecimento e com as pessoas idosas a nossa volta é algo que ainda precisamos alcançar.
* Karen Garcia de Farias é articuladora do POA Inquieta e graduada em Comunicação Social.
**As frases e expressões deste texto fazem parte do 1º Glossário Coletivo de Enfrentamento ao Idadismo de Palavras, Expressões e Frases, realizado pela Consultoria Longevida e parceiros em 2021, e que faz parte da Campanha Lugar de Pessoa Idosa É Onde Ela Quiser. Baixe ele gratuitamente no site www.longevida.ong.br