Somos atletas nas Olimpíadas, subimos ao pódio, não nos contentamos com o bronze e reivindicamos o ouro, denunciamos o juiz que tira foto com o competidor adversário e seguimos animados até o final da competição. Até rolou uma trend nas redes sociais da ginástica artística, em que influenciadores faziam acrobacias ao som da narração da ginástica.
Neste momento, não há cor, diferenças sociais, gênero, orientação sexual; apenas resiliência e determinação na jornada. Só que a realidade é muito diferente, como lembrou a ex-atleta Daiane dos Santos, em um desabafo emocionante durante a transmissão da Globo, ao comentar sobre a representatividade de duas medalhistas olímpicas: Rebeca Andrade e Beatriz Souza.
“A Rebeca falou sobre representar a todos. Sim, ela representa a todos, mas é a representatividade de 56% de uma nação, que é excluída, que é subjugada… Que, muitas vezes, quando ganha, ela é pertencente, mas e quando não ganha? A gente viu a Simone Biles sofrendo vários ataques, a maior atleta da história da ginástica, para mim, sofrendo múltiplos ataques por conta do cabelo, da cor…”
É como um show, que, quando acaba o espetáculo, cada artista encara seus demônios. Daiane finalizou sua fala torcendo para que estes resultados façam com que as pessoas reconheçam o valor das mulheres pretas. A promoção da equidade, ou seja, dar às pessoas o que elas precisam para que todas tenham acesso às mesmas oportunidades, é uma escolha consciente e intencional; então, precisamos influenciar a promoção de políticas equitativas e construir ações efetivas de inclusão social.
Nesse sentido, o esporte é uma importante ferramenta de desenvolvimento social e econômico. Beatriz Souza, a Bia, por exemplo, além de sargento do Exército Brasileiro, é do Instituto Reação, que utiliza o judô como ferramenta de inclusão social e é parcialmente financiado pela Lei Federal de Incentivo ao Esporte. Um instrumento poderoso para o investimento social privado. Ou seja, as empresas são essenciais nesse processo.
“Elas investem no desenvolvimento de jovens como Bia, Roberta Ratzke (Instituto Compartilhar), Isaquias Queiroz (projeto Remando em Águas Baianas), Rebeca Andrade (projeto Futuro Campeão) e Djenyfer Arnold (projeto Escolinha de Triatlo). Para aqueles que não têm recursos financeiros e são provenientes de escolas públicas, onde os esportes com bola são valorizados pelo baixo custo, ter a possibilidade de frequentar um ambiente de descoberta de talentos e de formação é uma oportunidade única. É crescer com dignidade, pois não se trata apenas de querer, mas de ter a infraestrutura e as condições para desenvolver o seu potencial.”
Segundo o Ministério dos Esportes, dos 60 medalhistas em Paris — 48 mulheres e 12 homens — 100% são integrantes do Bolsa Atleta ou estiveram em editais ao longo de suas carreiras. Neste cenário, o recurso federal é fundamental. Pois mesmo indo para uma Olimpíada, as dificuldades não cessam.
Fernando Balotelli, do atletismo, criou uma vaquinha virtual para fazer o decatlo. Como a prova é composta por 10 modalidades diferentes, ele precisava variar as sapatilhas para praticá-las. Nesta competição, ele ficou em 14º lugar, melhor resultado da sua carreira, e em 3º lugar, no lançamento de dardo, melhor prova do brasileiro. Agora, sua cabeça está no próximo ciclo olímpico, Los Angeles 2028.
O relato de todos os atletas mostra que o esporte exige constância. As lutas nos fazem querer abraçá-los e as suas famílias. Quantas Rosas, Marias, Terezinhas hoje não têm o básico para alimentar seus filhos e contam com a refeição oferecida no projeto social, no contraturno escolar, para que eles possam ter uma alimentação saudável. O abismo e a desigualdade social são gritantes e não podem ser ultrapassados pelo lugar-comum de que, por meritocracia, será possível avançar.
Com o investimento na Lei de Incentivo ao Esporte, as empresas podem contribuir diretamente com este alicerce, tão necessário, para futuros saltos, como o DTY, Yurchenko com dupla pirueta, usado por Rebeca Andrade. Ele não é considerado difícil para os especialistas, mas para os reles mortais, nos quais me incluo, não seríamos capazes de executar. Que eles possam ser ultrapassados por novas atletas e que elas consigam batizar outros saltos. Ao invés de pular a fome, a miséria, a pobreza, o feminicídio, a violação de direitos.
Existem leis federais (imposto de renda) e leis estaduais (ICMS), via renúncia fiscal, que garantem o investimento de pessoas físicas e jurídicas. Informe-se, divulgue em suas redes de contatos, seja incentivador, mas mais do que isso, contribua efetivamente para a mudança.
Chega de preconceito, discriminação, injustiça. Pode ser utópico, mas que os malabarismos da vida sejam suficientes para nos fazerem crescer.
Paula Martins – Associada da Odabá – Afroempreendedorismo, busca um mundo melhor, carregando na mochila a comunicação, o marketing digital, a responsabilidade social, a diversidade e a inclusão (@ppaulamartinss)
Fontes:
Daiane dos Santos faz desabafo após Ouro de Rebeca Andrade | TV & Famosos | gshow (globo.com)
Balotelli fica em 14° no decatlo e tem melhor resultado da carreira
Entenda os saldos de Rebeca Andrade e Simone Biles
Rebeca Andrade percorreu longo caminho para se tornar a maior medalhista olímpica do Brasil | Jornal Nacional | G1 (globo.com)
Foto da Capa: Montagem Patuá Studio / Divulgação
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