Iniciar uma semana com o desafio de escrever um artigo para este espaço nos remete a refletir sobre os motivos de nossas opções ao longo da vida. Lembrar o contexto em que nós nos encontrávamos na hora de decidir que rumos tomar. Principalmente, avaliar o que poderíamos oferecer a uma cidade que 60 anos atrás não era a que vivemos hoje. Nós e ela mudamos ao longo deste tempo. A minha formação – Física (graduação) – em especial a Física Quântica e na medida que cultivamos nossas inteligências múltiplas e damos uma atenção especial à nossa inteligência emocional, maior se torna nossa responsabilidade.
Saber olhar criticamente, com os olhos de hoje, as caminhadas que nos trouxeram para o aqui e agora e, com maturidade, dar uma resposta sincera e colaborativa, para somar-se aos dizeres expressos nos belos e ricos artigos da série Sler, é uma provocação como poucas, por mim recebidas nesses últimos anos.
O desafio torna-se maior, quando o coração emocionalmente ainda está pulsando de forma intensa, após a participação, colaborativa e intensiva, do processo de planejamento e acompanhamento à distância, do 1º Congresso Popular para a Educação Cidadã. Os objetivos do evento foram muito além do desejado. Em especial, constatar que os principais aprendizes, no meu entendimento, foram os integrantes dos coletivos Ponta Cidadã e POA Inquieta, que organizaram o evento. Portanto, as respostas a oferecer devem libertar-se de um pensamento um pouco romântico e fundamentar-se em pensamento programático.
Optei em viver em Porto Alegre, como cidade porto seguro, no início da década de 60, e reconheço que foi nesta cidade que obtive oportunidades, aproveitadas pelo meu esforço e dedicação, em um território que tinha condições favoráveis. Ela me oportunizou estudo universitário, casa de estudante para morar, trabalho em educação em escolas pública estaduais e junto à Secretaria da Educação do Estado, universidades públicas e privadas na Capital, ao longo de mais 40 anos. Continua me oferecendo espaços para atuar mais 20 anos, após obter minha “aposentadoria”. Ainda acredito que poderei desfrutar outras tantas possibilidades para continuar agindo em direção ao rumo de uma cidade mais humana, sustentável, inovadora, inclusiva e deixar de falar em “nós” e “eles”.
Há 26 anos participei da criação do Conselho Municipal de Ciência e Tecnologia de Porto Alegre (COMCET). Até hoje participo de seu funcionamento, o que me permite ter uma visão de como a cidade foi mudando, a cada mudança de Administração, a cada crise social e econômica, e ao crescimento gradativo do distanciamento entre diferentes segmentos da sociedade civil organizada. Estudos sobre Economia Criativa no COMCET, em 2018, fizeram me aproximar do POA Inquieta, na reunião realizada na recém-criada sede do SEBRAE/RS, oportunidade em que decidi aderir ao movimento.
Quando convidada, cerca de três anos atrás, a integrar este Coletivo – POA Inquieta, acreditei em ter mais uma possibilidade de aprender mais sobre a cidade, suas potencialidades e seus entraves para mudar para uma cidade cidadã e retomar seu status de Cidade Educadora, reconquistado neste ano. A maior aproximação ocorreu num jantar comemorativo ocorrido em março de 2018, com uma amiga, que ainda tem forte aproximação com o Ministério Público, quando tomei um cafezinho em fim de tarde, em um bar próximo do TECNOPUC, com uma integrante do POA Inquieta, muito especial para mim até hoje. Minha participação junto ao coletivo passou a tomar outra abrangência, além da participação das rodas de conversa e ter participado de Grupos de Trabalho do coletivo, desejando qualificar mais a sua ação.
Esses movimentos foram a porta de entrada para participar de ações junto ao Ministério Público da Infância e Adolescência: O Programa dos 17+, ou seja, preparo para o trabalho e a cidadania de jovens prestes a sair das casas, onde estavam abrigados, com assinaturas de termos de ação com a Associação Brasileira de Recursos Humanos/RS e com a Carris, em processos de formação profissional como alunos nos projetos de cursos de aprendizagem. Paralelamente, também iniciei a participação do Programa 50+ junto à PUCRS, com a criação do Spin correspondente 50+. Outras participações, em sequência, ocorreram quando do desenvolvimento do programa de atendimento a mulheres depende de drogas, desenvolvido junto à Copiosa Redenção – Eu dona de meu destino, em 2019, que originou processo de mentoramento das egressas do programa. Atualmente, ainda dou mentoria a quatro egressas, com resultados altamente satisfatório, diante do plantado no curso.
Outra atuação do qual me dediquei com muita garra, foi a atuação prolongada desde fins de 2018, até o presente momento, como mentora junto aos moradores da comunidade Alameda. Oportunidade em foi construída, com a participação efetiva dos moradores de lá, a Associação dos Moradores Alameda Inquieta, que no momento, enfrenta muitos percalços. Problemas no setor público municipal, a crise sanitária, que deixou não apenas mortos físicos, mas pessoas com sérias sequelas físicas e emocionais, além do período eleitoral de 2020. As doações que pretendiam amenizar a fome e os desconforto causado pelas estações do ano e da pandemia, desejo de comemorar datas comemorativas (dia das crianças, da mãe, do pai e dos avós), no sentido de valorizar estes seguimentos, as referidas ações passaram a ser quase a uma moeda de troca por votos.
Outra ação importante realizada junto ao Ministério Público Estadual, foi o programa Vez e Voz, voltado a mulheres em estado de vulnerabilidade consumada que resultou em um projeto entregue ao próprio Ministério Público, inclusive com texto publicado aqui na Sler.
Por outro lado, percebo que cada coletivo tem seu tema básico de estudo e proposição. A riqueza dos temas abordados, em cada Spin, leva a entender o comportamento, princípios e valores de seus participantes e os motivos de como agem, como dialogam entre si e como interagem com os integrantes de outros grupos. A participação em cada um deles nos ajudam a pensar, a partir de nossa disponibilidade de ouvir com atenção o que outros pensam, vivem, sonham.
Nesta caminhada, sem dúvida, aprendi muito, como pessoa, como profissional. Certeza que tenho crescido, em especial, como cidadã porto-alegrense. Aprendi ao ler alguns diálogos entre os integrantes dos diferentes spins a que pertenço, a respirar fundo e procurar refletir sobre o dito e o escrito ou buscar fundamentos em fontes de referência. Ou seja, aprendi a ouvir a pensar em alternativas de solução. Em especial, que reconheço que ainda não consegui adquirir competências e habilidades necessárias para ajudar meus pares no coletivo a olhar o que já temos cheio no copo, o quanto as gotinhas vem enchendo, mesmo que não seja no ritmo desejado. As aprendizagens para realizar mudanças ocorrem na medida da evolução da nossa maturidade. Desejo imensamente olhar o que está vazio e passar a propor soluções construídas com a participação de vários segmentos de forma focada e colaborativa.
Creio que na sociedade atual ainda existem muitas exigências quanto aos nossos direitos nos esquecendo que, paralelamente, temos que avaliar em que medida cumprimos com nossos deveres. Além disso, o quanto ajudamos os outros a cumpri-los, por ter consciência que isto faz bem a todos. Gostaria de poder estender-me mais.
Penso ter respondido, minimamente o que tenho feito junto ao POA Inquieta. Quanto à segunda questão, quanto tempo tenho dedicado, respondo como uma premissa pessoalmente assumida, ao ingressar em ações voluntárias é preciso organizar nossa vida profissional, na mesma dimensão nossa vida pessoal, verificamos que tempo existe de sobra. O importante é acreditar na causa – querer é poder. Esta é uma das minhas máximas e, segundo a física quântica, é possível aproveitar o tempo melhor, reservando um tempo para viver e crescer como pessoa, como integrante de uma sociedade que precisa da gente.
*Rita Maria Silvia Carnevale, Professora, articuladora do POA Inquieta, integrante do COMCET e de GTs do Porto Alegre Cidade Educadora