Pode ser o meu, pode ser o seu. Eu vim fazer uma introspectiva do ano que está acabando. Essa nostalgia típica dos finais, que nos convoca a olhar para trás num movimento de revisitação e reavaliação. É bonito, é necessário, mas também cansativo. O que você faz com o que resgata do que fez?
Quando olho fotos do início do ano fico pensando sobre mim naquele exato momento. Eu não sabia que o tempo estava passando. Sabia, mas não sabia. A gente não sabe de muita coisa além do momento. Talvez seja protetor. Eu não sabia se estaria viva em Dezembro, apesar de guardar uma ilusão quase inocente de que sim. E cá estou.
Estamos todos cansados. Não sei o quanto esse ano foi difícil para você que me lê. Eu lancei um livro em 2023, realizei um sonho. Aliás, sempre falo isso para quem me pergunta ou felicita pelo êxito de publicar um livro. Digo que realizar um sonho é uma sensação muito louca. Tem o inegável gosto da conquista, de não ter ficado só na categoria sonho e eu efetivamente ter realizado movimentos importantes e significativos para vê-lo se concretizar. Mas ao mesmo tempo, tem uma sensação estranha da incompletude. Aquele “tá, mas e agora?” Insatisfeita? – pensarão. Eu digo inquieta. Brinco que publicar um livro me pareceu como fazer uma tatuagem. Mal terminei o primeiro já estou louca pelo segundo.
Eu estou cansada. Foi um ano bonito. Ano de amor, ano de busca, de descobertas difíceis que no fundo eu sempre soube. Quanto de rímel ficou perdido em toalhas de banho, lençóis que rasgaram, meias desparceiradas, guarda-chuvas perdidos, canetas preferidas perdidas antes do fim da carga.
Cada ano, um inventário.
Invenções de uma vida que cresce e acaba ao mesmo tempo.
Uma das surpresas já nesse suspiro de 2023 foi conhecer um poeta incrível, daqueles privilégios que a vida por vezes oferece. Ele elogiou meu livro e quando falei sobre minha poesia, disse que preciso saber guardar mais o que produzo. Publico rápido demais. Pediu para eu cuidar das minhas pepitas, que postar rápido demais faz a peça sair com muita areia junto. Há que lapidar melhor os próprios tesouros. Isso vale para minha escrita, sua música, sua pintura ou qualquer coisa que você leitor esteja querendo fazer sair de si. O poeta também me contou que escreve à maquina de escrever. Eu sou uma amante desse objeto. Ele contraria a pressa, contraria a urgência da correção. Ele me disse: “é que eu preciso ver o poema logo fora de mim.”
“O poema é um objeto. Não perca o jato da poesia. Não espere, não tranque, deixe sair. Mas guarde, deixe descansar. Só então retorne e afine.”
Isso vale para tanta coisa na vida. Não perder o jato, mas saber contê-lo para o mundo lá fora. Eu aposto numa vida criativa, ainda que doa. Eu aposto numa introspecção, mais do que retrospecção. Eu às vezes falo demais quando não sei o que escrever. Eu sabia que um texto por semana não seria fácil. O poeta me recomendou que eu tomasse cuidado para não me perder da minha poesia.
Não se perca da sua poesia. Seja ela qual for. Dezembro ainda não acabou. Talvez seja para a vida inteira.
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