Peter e Kathleen formavam um belo casal, na Ledig House, o clube de Escritores de Omi, a pequena cidade no estado de Nova Iorque, onde passei dois meses, nos anos 90. Arquitetos, em uma atitude tipicamente americana, davam um tempo em suas profissões e, para ganhar experiência de vida, estavam trabalhando de caseiros no clube. Supostamente, eu estava lá para escrever, mas havia uma piscina e uma quadra de tênis, no meio do bosque, e retomei os exercícios ao ar livre. Livro nenhum poderia superar esses momentos, era o que eu explicava ao Frances, o dono milionário daquela terra, cuja serventia também era reduzir os seus impostos. Ele parecia entender, e eu jogava, todos os dias. E, depois, nadava.
Sim, a vida era maior do que a arte. Peter tinha uma batida forte e jogava bem melhor do que eu. Mas voltei a utilizar a grande arma de minha infância que era compensar com estratégia a falta de um talento maior. Com muita paciência e alguma força mental, eu ganhava de Peter. Sempre. Às vezes, de fato, eu precisava irritá-lo com alguns balões de fundo de quadra, mas isso fazia parte do jogo.
Um dia, após o café da manhã, Kathleen pediu para falar comigo e foi logo avisando que o assunto era delicado, mas que contava com a minha compreensão. Contou-me que o marido andava arrasado com as derrotas, que considerava injustas, e que se traduziam em muito mau humor, à noite. Na madrugada, chegava a sofrer pesadelos estridentes. Estava difícil, quase insuportável para eles, e suplicou para que eu o deixasse ganhar, ao menos uma vez. No dia seguinte, um dos últimos daquele verão, o sol ainda dourava o piso de saibro, quando eu vi, no adulto Peter, uma criança de 3 ou 4 anos. Com muito disfarce para supostos erros inaceitáveis, deixei-o vencer (apertado), gritei como quem não suportasse uma frustração inesperada, e o seu sorriso finalmente tomou conta da tarde que caía aos poucos, em Omi.
À noite, no jantar, entre um cachorro-quente e uma coca cola, Kathleen agradeceu-me com um piscar sutil de olhos expressando o final dos pesadelos e o recomeço da serenidade. Mas, no dia seguinte, retomei a estratégia que compensava, com alguma força mental, a minha grande falta de talento. Afinal, Peter, todos precisamos crescer, um dia, e isso não se faz sem perder muito.
Foto da Capa: Freepik / Gerada por IA
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