Para a escritora americana Joyce Carol Oates, com muita frequência cotada para o Nobel de Literatura, “a leitura é o único meio pelo qual nós escorregamos, involuntariamente, frequentemente impotentes, para a pele de outra pessoa, a voz de outra pessoa, a alma de outra pessoa”.
Não é de agora que a ciência tem demonstrado o que para muitos sempre foi, além de um hábito saudável, uma bandeira de verdade e, até mesmo, uma necessidade vital. A leitura pode nos tornar pessoas melhores.
A jornalista científica Annie Murphy Paul, também americana, tem publicado sobre descobertas da psicologia cognitiva que podem ajudar a pensar e atuar de maneira mais sagaz. Ela afirma que “leitura profunda”, aquele tipo de leitura que a literatura exige, é uma atividade cognitiva distinta que contribui para a nossa empatia com os outros. Tem poder, portanto, de nos tornar mais sábios e tolerantes.
Na linha desse argumento, faz referência a estudos de Raymond Mar, psicólogo da Universidade de York, no Canadá, e Keith Oatley, professor emérito de Psicologia Cognitiva da Universidade de Toronto. Em conjunto, suas descobertas sugerem que aqueles “que frequentemente leem ficção parecem mais capazes de entender outras pessoas, simpatizar com elas e ver o mundo a partir de sua perspectiva”.
Os cientistas têm demonstrado cada vez mais que aqueles que leem literatura ficcional desenvolvem, muito mais do que outros, o dom da empatia.
Em meados do século passado, a revista Science descrevia a recém-surgida Teoria da Mente como a capacidade humana de compreender que as outras pessoas têm crenças e desejos e que eles podem ser diferentes de suas próprias crenças e seus desejos. Um novo estudo, em 2013, demonstrou que os leitores de ficção apresentam desempenho superior nos testes a respeito da Teoria da Mente. Ou seja, eles compreendem melhor o fato de que os seres humanos têm opiniões diferentes.
Pesquisa publicada na revista especializada Brain Connectivity descreve como um grupo de voluntários que teve os cérebros examinados por ressonância magnética funcional antes e depois de uma maratona de leitura apresentou alterações da conectividade no córtex cerebral. Efeitos que se prolongam mesmo depois de terminada a leitura. O fenômeno, causado pela plasticidade cerebral, permite mudar as conexões cerebrais de acordo com as experiências vividas. Nesse caso, as ações aconteceram apenas na imaginação do leitor. Nas palavras do autor, Gregory Berns, pesquisador da Emory University, do Estado norte-americano da Georgia: “As mudanças neurais que encontramos associadas com a sensação física e os sistemas de movimento sugerem que ler um romance pode transportar você para o corpo do protagonista. Já sabíamos que boas histórias podem colocá-lo na pele de outra pessoa em um sentido figurativo, mas agora, estamos vendo que algo também pode estar acontecendo biologicamente.”
Vivendo a complexidade da vida de um personagem de ficção, o leitor pode exercitar empatia, desenvolvendo a sensibilidade necessária para compreender, e respeitar, os sentimentos de pessoas na vida real. Vestir-se da alma do outro pode tornar possível um amanhã transfigurado.
Todos os textos de Fernando Neubarth estão AQUI.
Foto da Capa: Londres, 8/10/1940 - Autor desconhecido.