Parlamentares têm rejeitado a proposta do presidente Lula para que o novo PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) seja turbinado com dinheiro de emendas. Mesmo dentro da base política do governo, há líderes que veem dificuldade para que o plano do Palácio do Planalto seja acatado pela maioria dos congressistas. Os deputados e senadores têm direito a colocar verba pública em projetos e obras. Com isso, acabam irrigando seus redutos eleitorais e conseguem ampliar o próprio capital político. Esse mecanismo de uso de dinheiro do Orçamento pelos parlamentares são conhecidos como emendas.
Lula lançou uma ofensiva para tentar convencer os congressistas a aplicar emendas no PAC, sua principal vitrine na área de infraestrutura. No entanto, os incentivos foram considerados pouco atrativos, de acordo com integrantes de partidos como PP, Republicanos, União Brasil, PSD, PDT. Há diferentes avaliações nos bastidores. Uma ala diz que, se aceitar a oferta do governo, o ganho do parlamentar por meio da emenda será diluído, já que ministros de Lula também vão colher os frutos políticos. E citam que integrantes do primeiro escalão do governo continuam lançando obras pelo país, inclusive em Alagoas, estado do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP), sem que outros sejam convidados para os eventos.
Líderes partidários citam que 2024 é ano de eleição municipal e a estratégia será usar o dinheiro das emendas em projetos e ações de impacto mais imediato nas disputas locais e que atendam pleitos de candidatos aliados. Alguns membros do Congresso afirmam ainda que os projetos que fazem parte do PAC geralmente não estão nas preferências dos parlamentares, principalmente se a obra de infraestrutura for de médio ou grande porte.
Fundo de Financiamentos
Deputados, senadores e presidentes de partidos não chegaram a um acordo sobre o fundo de financiamento da campanha eleitoral de 2024. A disputa está em torno do valor do fundão e como conseguir fundos para bancar as atividades dos candidatos. A maioria da Câmara pressiona por um fundo no valor de 4,9 bilhões, o que representaria o dobro da verba da última eleição municipal, em 2020. Os dirigentes partidários também defendem esse montante. O Senado e deputados de estados menores querem que o fundão seja de aproximadamente R$ 2,5 bilhões, o que equivale ao valor gasto em 2020, corrigido pela inflação.
Na avaliação do Senado, não há justificativa plausível para distribuir a candidatos a prefeitos e vereadores, que percorrem apenas seus municípios, o mesmo montante usado em uma corrida para presidente, governadores, senadores e deputados federais. Além do gasto com a campanha eleitoral do próximo ano, o Congresso é palco de um embate sobre a engenharia que será feita para irrigar o fundo eleitoral com dinheiro público.
Uma ala tem sugerido que, na votação do Orçamento de 2024, o Congresso reduza a verba de alguns ministérios para transferir a quantia para o fundão. Até os ministérios de Saúde, Educação e Defesa entraram na lista de possíveis perdedores, mas isso ainda está em avaliação.
A proposta foi feita por deputados e senadores de estados de menor porte porque esses parlamentares são contrários à solução anteriormente desenhada e que reduz o valor das emendas de bancadas estaduais (os congressistas de cada unidade da federação se reúnem e decidem qual obra receberá dinheiro patrocinado por eles). A ideia de desidratar ministérios e programas de Lula ganhou força nesta semana. Como 2024 é um ano eleitoral, deputados e senadores estão de olho no potencial político das emendas.
Dessa forma, uma solução que não interfira nas cotas dos parlamentares tem chances de prosperar no Congresso. Para evitar um desgaste amplo com o governo, que perderia dinheiro no Orçamento de 2024, uma saída pode ser diluir o corte em vários ministérios. Parlamentares justificam que a sugestão de retirar verba de Saúde, Educação e Defesa surgiu por causa do tamanho do orçamento dessas pastas, que estão entre as que mais recebem recursos públicos. Além disso, são áreas que não estão comandadas por ministros do centrão, grupo que representa a maioria do Congresso.
Diante do impasse, a votação dos projetos que definem o Orçamento de 2024 tem atrasado. O deputado Danilo Forte (União Brasil-CE), relator da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias), que dá bases para o Orçamento, disse a aliados que não deverá se envolver na disputa do fundo eleitoral. E que apresentará a nova versão do projeto. O texto, porém, só deverá ser votado na próxima semana.
A discussão sobre o fundão, portanto, será jogada para a votação da proposta do Orçamento, cujo relator é o deputado Luiz Carlos Motta (PL-SP). Ele é próximo do presidente do PL. Valdemar Costa Neto, que tem meta de conquistar mais de mil prefeituras no próximo ano e terá direito à maior fatia do fundão. Por isso, o partido do ex-presidente Jair Bolsonaro tem defendido que o valor do financiamento público da campanha eleitoral seja de R$ 4,9 bilhões.
Esse é o mesmo patamar do fundo das eleições nacionais do ano passado, quando a disputa era para presidente, governadores, senadores e deputados federais e estaduais. Agora estarão na corrida os cargos de prefeito e vereador. Motta é quem tem poder de mexer nos orçamentos de cada ministério. Durante o processo do projeto de Orçamento, deputados e senadores podem sugerir alterações na verba de programas e projetos do governo. O relator avalia se acata as mudanças ou não.
A eleição de 2024 desperta mais o interesse de deputados do que de senadores. Se um deputado consegue eleger um aliado para a prefeitura, já larga com vantagem para 2026, data da próxima eleição geral. Por isso, líderes da Câmara veem a resistência do Senado como mais um capítulo da disputa por protagonismo entre as duas Casas do Congresso.
Pela falta de acordo para o fundo eleitoral, líderes do Congresso dizem que a expectativa é que o Orçamento seja aprovado até o fim do mês. O objetivo é deixar o terreno preparado para que as emendas parlamentares sejam liberadas já nos primeiros meses de 2024, ano eleitoral.
Se o Congresso não resolver o impasse e adiar a votação do Orçamento para o próximo ano, os repasses de emendas só começarão por volta de março, o que reduz o efeito político do dinheiro que os deputados e senadores querem enviar para seus redutos eleitorais.
O presidente Lula colocou no projeto do Orçamento de 2024 uma previsão de R$ 900 milhões para financiar as campanhas eleitorais. Essa proposta partiu do Ministério da Fazenda, comandado por Fernando Haddad (PT), que é contra um valor muito elevado para o fundo. Até 2015, as grandes empresas, como bancos e empreiteiras, eram as principais responsáveis pelo financiamento dos candidatos. Naquele ano, o STF (Supremo Tribunal Federal) proibiu a doação empresarial sob o argumento de que o poder econômico desequilibrava o jogo democrático.
Para as eleições de 2018 foi então criado o fundo eleitoral, que se soma aos recursos já existentes do fundo partidário, atualmente em torno de R$ 1,2 bilhão ao ano. Em 2020, o valor subiu para R$ 2 bilhões, o que equivale a cerca de R$ 2,5 bilhões corrigidos pela inflação. Apesar da proibição do Supremo, há brechas que mantêm o desequilíbrio em favor dos mais ricos, devido às doações de empresas feitas por meio de seus executivos, como pessoa física, além do autofinanciamento, ou seja, a possibilidade de os candidatos bancarem suas próprias campanhas, limitados apenas pelo teto estabelecido para cada candidatura.
Foto da Capa: Agência Brasil