Tenho 57 anos e já estou na menopausa desde meus 52. Me sinto uma mulher de sorte porque tive uma perimenopausa (a fase anterior a menopausa) sem grandes efeitos. No entanto, na minha convivência cotidiana com amigas e em rodas de mulheres, tenho encontrado muitas delas carregando um grande sofrimento por causa deste período pré-menopausa, em especial, e menopausa:
“Depois da menopausa meu marido não me procura com a mesma regularidade e me culpa porque a cintura virou barriga, e estou com dificuldade de perder peso…”
“Engordei e não consigo recuperar meu peso, meu cabelo afinou, minha pele também, tudo depois da menopausa. Parece que fiquei menos mulher.”
“Foi calorão, falta de memória, alteração de humor, falta de libido, muita coisa junta para lidar nesse período da perimenopausa. Ainda bem que consegui uma orientação adequada com uma médica especializada que me indicaram.”
“Os homens não entendem… isso ajudou bastante a eu acabar um namoro de muito tempo. Eles acham frescura (a perimenopausa) ou que você não tem vontade (de transar) e no começo eu nem sabia o que tava acontecendo.”
Em primeiro lugar, eu saúdo que estejamos vivendo momentos e espaços onde estamos conseguindo compartilhar esses depoimentos, experiências, saberes a respeito deste assunto que por tanto tempo foi e, em certa medida, ainda é silenciado entre as mulheres e na sociedade em geral. Precisamos falar sobre isso. Entre mulheres que já viveram, que vivem esse momento e com as mulheres mais jovens que irão vivê-lo, para que possam se preparar, planejar e acolhê-lo sem sobressaltos.
Ainda assim, nesses depoimentos e noutros tantos que recebo, percebo que as questões da menopausa se atravessam com as do envelhecimento feminino. Pois nem sempre o que passamos nesse período da vida tem por causa a menopausa, mas a menopausa marca um “rito de passagem”, como a menarca para a menina/mulher.
Na menarca, quando as meninas menstruam pela primeira vez, há uma alegria, um certo ar de comemoração nas famílias. Afinal, agora ela ficou “mocinha”. No meu caso, lembro que a minha aconteceu no dia em que o Papa Paulo VI faleceu (faz tempo, hein? Que Deus o tenha!), e minha mãe fez um almoço especial para “celebrar” (comigo morta de vergonha e sem entender direito o que estava acontecendo). Comemorar o quê? Cólicas mensais? Agora podia ser mãe, era uma mulher completa… Eu tinha apenas 11 anos e fui proibida de brincar de jogar bola na rua com a vizinhança, andar de bicicleta, tinha que sentar com as pernas fechadas, me cuidar com os meninos… regras que não entendia e não gostava. Ah, mas não havia escolha, visto que eu tinha me tornado uma mocinha no dia de 06/08/1978! Em compensação, pra não ser injusta, pra minha alegria lembro que a Mãe me deixou comprar uma sandália com saltinho e a usar um brilho labial (sem cor, mas sabor de morango).
Quando chega a perimenopausa, ela nos encontra num momento da vida em que nosso corpo já nos mostra que a juventude nos deixou faz tempo. As rugas, as manchas, a flacidez, já se instalaram no corpo, se é que permitimos. Muitas de nós já fizemos procedimentos que esconderam esses efeitos com o desejo de nos manter jovial, pra que possamos prolongar nossa sensação de estar de acordo com o que a sociedade acha ser bonito. Então, esse tempo de pré-menopausa dá um nó na gente. É difícil conjugar essa luta hormonal que acontece nos nossos corpos, e muitas de nós sofre pra caramba com ela, e ainda com a luta mental, física e emocional de se entender envelhecendo. Então, quando entramos na Menopausa, não há mais procedimento que possa esconder, é oficializado, pelo olhar da sociedade machista, que deixamos de ser jovens, e por isso bonitas e desejáveis; e pelo olhar da sociedade capitalista, que não somos mais produtivas, afinal não poderemos mais ter filhos. O que resta pra nós?
Por que esse olhar não está sobre eles?
Fica outra pergunta: E os homens? Eles também envelhecem. Por que esse olhar não está sobre eles? “Suas cinturas também viram barriga”. Seus cabelos rareiam e ficam carecas. O que diz a Medicina? No Portal da Sociedade Brasileira de Urologia, esclarece que “comumente chamado de Andropausa, o termo correto para os homens é Deficiência Androgênica do Envelhecimento Masculino, pois diferentemente da mulher, não ocorre uma pausa hormonal, e sim o seu déficit gradativo do hormônio reprodutivo, a testosterona, ao passo de 1% ao ano, a partir dos 40 anos, causando a diminuição do desejo sexual, a dificuldade em ter/manter ereção, aumento da gordura corporal, osteoporose, perda da massa muscular, anemia, depressão e irritabilidade”. Mas o que dizem por aí é que eles continuam uma potência toda a vida. Convenhamos que, de novo, entra o machismo na história, dado que eles não mantêm esse poderio sexual a vida inteira.
Um tipo de homem que não quer entender o que se passa com as mulheres durante o processo da menopausa, é o que deseja manter uma “mulher troféu” sem refletir o significado real disso pra masculinidade dele. Por que essa mulher entra na velha dinâmica de competição masculina do melhor carro, casa mais cara, relógio mais exclusivo, homem melhor sucedido. Pra esse homem que precisa se afirmar de acordo com esse jogo do “mais forte”, o acolhimento com a parceira que passa por todas essas transformações é calculável que seja próxima a zero.
Outro tipo de homem no qual noto que pode haver esse descompasso de acompanhar e compreender o que está acontecendo com a parceira, é quando ele não vem lidando com o próprio envelhecimento, finitude, propósito de vida. Como diz Caetano “É que Narciso acha feio o que não é espelho”. Esses temas dão medo e tem quem passe a vida inteira sem tocar no assunto.
Pra lidar com tudo isso é preciso coragem para se olhar por dentro. Tem muita gente que prefere fugir. Mulher, se este é o seu caso acredite, há dor que vira flor. Sou testemunha disso.
O que resta pra nós?
Se está na Perimenopausa, se já está na Menopausa, ou não, cuide da sua saúde, ela é seu capital fundamental. A física, mental, espiritual, financeira e a social. Cuide de você, sem vergonha, sem culpa, com amorosidade e generosidade.
Tenha uma atenção muito especial à saúde social, à sua rede de amigas, aquelas mulheres que te cuidam e apoiam, pra quem você liga quando está triste ou alegre, quando conquistou algo importante ou teve um fracasso e precisa de uma palavra de incentivo. Tenho mediado encontros, conduzido rodas e feito palestras para mulheres, com mulheres e testemunhado a força que produz quando estamos juntas e nos apoiando. Procure sua tribo.
Enfim, manter a perspectiva dessas engrenagens culturais, sobre as quais falei acima, nos ajuda a manter a cabeça firme de que a “culpa” não é nossa. Há toda uma estrutura que quer manter um status quo da gente num papel de que a mulher mais velha é decadente, passada, indesejável, enquanto que só a jovem é bonita e desejável. Precisamos conversar entre nós, jovens e velhas para compartilhar nossas experiências e sabedoria, aproximando-nos.
Resta pra nós ao envelhecer, querer nos manter no “padrão” e “rejuvenescer” (o que não nos fará “valer mais” para sociedade) ou tomar consciência do que realmente quer nosso coração e nos tornarmos donas de nossas decisões e caminhos, o que nos fará ser mais cobradas pela sociedade que acabará por nos taxar de “meio bruxas, meio loucas, meio santas”, como gosto de imaginar que diria a Mestra Rita Lee, mas mais felizes ao final das contas.
Foto da Capa: Freepik
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