Volto a falar da Bahia e do livro porque tudo segue reverberando.
O momento foi de emoção genuína e muita alegria. Até porque, desde que meu livro ficou pronto, o desejo de lançar na Bahia pulsou forte. E o estímulo do meu primo Júlio César Lopes Martins foi fundamental. Sempre que nos encontrávamos, ele sinalizava: “Está mais do que na hora de organizarmos a nossa viagem para os autógrafos baianos”.
Quando decidimos que seria em janeiro de 2025, minha memória descortinou histórias incríveis da minha convivência com a turma baiana. Foi lá, no apartamento do prédio 16, no Pelourinho, onde moravam um bando e muitos outros, que aprendi sobre diversidade, sem conhecer a palavra. A experiência inusitada que vivi naquele espaço com pessoas tão livres ficou muito bem guardada e aos poucos foi se revelando. Com o passar do tempo, acabei me tornando uma lutadora por acessibilidade e inclusão. Participei de encontros para falar sobre deficiência, conversei com adolescentes em escolas, dei palestras e entendi a importância da fala para desconstruirmos barreiras. Em 2016, um ano depois da morte da minha irmã Marlene, fui convidada para assinar uma coluna semanal no Sul21, o que fiz durante quatro anos. A partir deste convite, comecei a escrever sobre a vida de pessoas que, como eu, com nanismo, tinham uma diferença marcante. E não parei mais!
Assim, a escrita passou a ser um ato de resistência na minha vida.
E assim nasceu o livro “E fomos ser gauche na vida” (Pubblicato Editora, 2020). Vivíamos o horror da pandemia e precisávamos de cautela. Mesmo com a caminhada contida, a primeira edição esgotou rapidamente e os retornos foram maravilhosos. A primeira sessão de autógrafos foi em 2021, na 67ª Feira do Livro de Porto Alegre, e a segunda em abril de 2022, em São Francisco de Paula, na Miragem Livraria. E fui convidada para a Feira do Livro de Jaquirana, também em 2022. Estimulada pelo Vitor Mesquita, meu editor e amigo, parti para a segunda edição em 2023, incluindo alguns comentários que recebi. A trajetória de vidas à margem por conta da discriminação e do preconceito que trago na minha escrita abriu muitas portas, expandiu o entendimento sobre a deficiência, em especial do nanismo, e apontou para a crueldade do capacitismo, que não acredita nas potencialidades de uma pessoa diferente da média.
Portanto, chegar à Bahia – terra que me deu amigos e aprimorou minha régua e meu compasso – com o livro foi mágico. A repercussão do lançamento no Restaurante Mar Aberto, em Arembepe, e na ADM Livraria, em Salvador, ratificou a minha certeza de que precisamos falar e repudiar qualquer tipo de discriminação. Os bons encontros, os novos amigos, as boas energias que circularam e as conversas que tive também contribuíram para isso. Já disse e repito: somos diversos, sim! E esta é a nossa grande riqueza. Só tenho a comemorar e agradecer aos amigos e à família que me acompanha desde o início e não me deixa desistir. E quando falo em família, falo da família do mundo, biológica e não biológica.
Afirmo no livro que nós, com a nossa diferença e, quem sabe, com o nosso jeito estranho de ser, não queremos apenas atrapalhar o trânsito “feito um pacote tímido”, como diz a canção “Construção”, de Chico Buarque, que fala da tragédia de um operário, mostrando que a morte de um trabalhador não significa nada para a população. É apenas um empecilho na rua por onde as pessoas passam. O Brasil vivia na época uma cruel ditadura militar.
O que queremos é parar o trânsito para que nos olhem como seres humanos, com direito à vida plena.
E assim foram as férias na Bahia, que teve também o show “A Roda Gira”, lindo demais, apresentado pela Rezadêra, com Vicente Benin (voz e direção executiva), Johnnys (voz, violão e direção artística), Lorena Lélis (voz), Juju Macêdo (voz, pandeiro e ukulele), Celso Celes (percussão, voz e efeitos sonoros), Jorge Galvão (voz, capoeira e percussão regional), Silas Silva (teclados) e Eduardo Valverde – Rathobare (flauta transversal, percussão e Maracá). Somaram-se aos tantos momentos estimulantes, uma exposição de joias usadas pelas escravas que vimos no Museu de Arte Contemporânea e a Festa de Iemanjá em Arembepe no dia 2 de fevereiro. Só tenho a comemorar e agradecer.
Agora é seguir escrevendo, tocando novos projetos e trabalhando com fé e esperança porque 2025 está só começando.
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Foto da Capa: Acervo da Autora.