Pot-pourri, palavra de origem francesa, significa literalmente “pote + podre” e há referências de que surgiu em 1564 para dar nome ao ragu tradicional ensopado de carne com legumes, que de podre não tem nada. Hoje em dia, conhecemos pot-pourri como sendo um mix de flores secas perfumadas. Entretanto a palavra também é utilizada, metaforicamente, para definir a “mistura” de uma obra composta de trechos de tantas outras.
Pois bem, estamos já nos últimos dias de 2024 e resolvi fazer o meu próprio pot-pourri. De palavras e não de comida. Peguei fragmentos dos quase cinquenta textos publicados aqui nesta coluna desde o último dezembro e fui pouco a pouco tecendo essa colcha de retalhos. Por meio das minhas crônicas, opinei, divaguei, imaginei e doei parte de mim. Finalizo o ano com essa mistureba de pensamentos e, com carinho, agradeço àqueles que me acompanham.
Entre reflexões, viagens e histórias de vida
Dezembro chegou com sua habitual intensidade. Sobram tarefas, faltam horas. Com o fim de mais um ano, prometo a mim mesma que no próximo muita coisa será diferente – ainda que, secretamente, eu saiba que a essência dessa promessa se perderá no turbilhão dos dias.
Embora o tempo não diminua seu ritmo para acomodar minhas indecisões, sigo me desafiando a aprender coisas novas, a desenvolver projetos e a me aperfeiçoar como pessoa.
Entre um café e outro, percebo que a vida vai se moldando. Sou aquela que busca nos cantos do mundo meus sentimentos. Meus textos carregam mais do que palavras, eles guardam vontades e desejos próprios.
Entre laranjas e passarinhos, entre a dor da perda e a alegria de criar, entre sentir a passagem do tempo e experimentar a intensidade de me tornar avó, vou aprendendo que felicidade não é algo que se encontra, e sim que se constrói no dia a dia. Mas, se é assim tão simples, por que complicamos o que deveria ser natural?
É curioso como muitos de nós, mesmo tendo a capacidade de “voar” e “cantar”, escolhemos permanecer em gaiolas mentais, limitados por medos, convenções ou autossabotagem. Por menos gaiolas para passarinhos e pessoas, é meu desejo neste mundo.
Por mais experientes que sejamos, ainda hoje caímos na armadilha da perfeição. A revitalização da imagem da mulher madura, por exemplo, nos impõe velhos padrões. Estamos evoluindo e desmistificando por um lado, porém acho que por outro estamos criando um novo modelo de envelhecimento: as cinquentonas saradas. Será esse o caminho ou novamente “caímos na panela”?
Retirar minhas próteses foi um ato de saúde e liberdade, em um mundo que cobra sutilezas disfarçadas, porém recentemente tive que voltar a gritar:
“Os seios são meus, doutora!”
Outra vez, alguém opinava sobre meu corpo.
Vivemos uma época de vaidade e falsos gurus. E não só. Entre desastres naturais como terremotos e furacões, o insólito também nos atinge. O “banquete da intolerância”, aquela polêmica durante as Olimpíadas em Paris, nos mostra que o ser humano está constantemente em guerra consigo mesmo. Por falar em banquete, em um mundo cada vez mais rápido e superficial, a comida virou algo para saciar, não para ser saboreada. Repensar é preciso, pois a mesa, assim como a vida, é feita de histórias. E aqui mais um desejo: uma vida onde vivências, memórias e pessoas nos ajudem a equilibrar nossos próprios desejos.
Viajar, por exemplo, é um desejo constante que traz novas perspectivas. A Holanda, que eu pensava ser apenas Amsterdã, mostrou-me que é muito mais que seus canais e bicicletas. Na Áustria, descobri encantos e desencantos que me fizeram questionar minhas próprias expectativas. E na Jamaica, onde o mar azul e a brisa quente embalam os dias, vivi um turbilhão de emoções – do êxtase à vontade de voltar para casa.
Cada viagem, um aprendizado. Foi viajando que conheci a história das Aleksandrinke, amas de leite da Eslovênia que deixaram suas famílias para buscar sustento, mas foram esquecidas por sua própria terra.
Sabe a brincadeira das cadeiras? Então, a vida é um grande círculo. A cada rodada, menos espaço, mais decisões se quisermos nos manter no “jogo”. Ou fora dele, se este for nosso desejo. Nem sempre ficar de fora é ruim. E está tudo bem.
No meio dessa “dança” encontramos momentos para refletir. Como no filme One Life, que nos lembra do impacto que um único ato de bondade pode ter no mundo. Ou no Joker, odiado pela crítica, mas que escancara a fragilidade humana.
Seja ao lado de um peixe azul em um pequeno aquário ou de gatos tristonhos pela saudade, seja lendo histórias humanas em uma biblioteca viva ou assistindo a um filme que nos faz repensar a vida, seguimos avançando.
Entre reflexões, tento encontrar prazer no simples. Como em Portugal, onde cada xícara de café tem sua própria história, ou de achar graça na história do supermercado, onde um abacaxi de cabeça para baixo sugere uma nova conexão. Às vezes, viver é apenas desacelerar e aceitar que não precisamos correr para as praias mais lotadas da moda e nem aceitar tudo o que nos é imposto, mesmo que seja a banana de seis milhões de dólares. Basta respirar e entender que saber dizer não é preciso de vez em quando. É ser mais JOMO que FOMO, desconectando para reconectar com o que realmente faz sentido.
Dia destes, depois de montar sozinha a pequena árvore de Natal, sentei-me à mesa iluminada pelas luzinhas e me dei conta de que Dezembro delibera sobre meus pensamentos. E me faz voltar no tempo. E haveria sempre um Dezembro e uma árvore e uma mesa. Enquanto um de nós estiver aqui.
Então, que possamos continuar desafiando nossos medos, abraçando nossas histórias e, quem sabe, encontrando um pouco mais de nós mesmos no processo. Afinal, o que todos queremos é uma vida que caiba em nós.
Ah, “last but not least”
Botafogo, Botafogo! Em 2024, nossa estrela voltou a brilhar!
Feliz Natal e um Ano maravilhoso!
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Foto da Capa: Reprodução da Internet