O Projeto Protocolo Zero – Fim de Jogo para o Racismo, uma iniciativa da Federação Gaúcha de Futebol (FGF) em conjunto com a Associação de Afroempreendedorismo Odabá, foi lançado em 2023 com o objetivo crucial de combater o racismo no futebol. Atuamos por meio da fiscalização, punição e, mais importante, da educação, em todos os campeonatos organizados pela Federação Gaúcha de Futebol.
Este ano, durante o Gauchão, realizamos ações impactantes diretamente com as torcidas em diversas cidades do Rio Grande do Sul. Distribuímos brindes e panfletos informativos e promovemos conversas abertas e honestas com os torcedores. Ficamos gratos, pois muitos fizeram questionamentos construtivos e aplaudiram a causa, demonstrando apoio à iniciativa. No entanto, alguns se mostraram menos receptivos ao diálogo e à importância fundamental do combate ao racismo no esporte.
Sempre ouvi falar no “Gauchão Raiz”, um campeonato desafiador, cheio de paixões e emoções, e profundamente amado pelos gaúchos. No entanto, por trás de todas as suas virtudes, a história do campeonato ainda carrega casos de racismo que precisamos combater incessantemente. Durante as interações no campeonato, ouvi frases como: “somos todos iguais”, “somos todos humanos”, “não tem diferença”… e isso demonstra o quanto os atos e falas podem ser intrinsecamente racistas, mesmo que não intencionais.
Entender a nossa história e como a sociedade se constituiu é de suma importância para uma mudança de conceito. A ignorância pode ser uma bênção, mas também pode ser terrivelmente destrutiva. As escolas, infelizmente, têm sido omissas nessa questão. É imperativo lembrar que a Lei 10.639/03 tornou obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira em todas as escolas de ensino fundamental e médio do Brasil, tanto públicas quanto privadas. Essa lei foi sancionada em 2003, e ainda assim, a implementação efetiva é um desafio.
Tive a honra de acompanhar de perto o trabalho da equipe do Protocolo Zero e pude testemunhar o impacto positivo de nossas ações, bem como os desafios contínuos que enfrentamos para conscientizar a todos sobre a importância da igualdade e do respeito no futebol.
O engajamento da Federação Gaúcha de Futebol, da arbitragem, dos clubes, dos atletas que entraram em campo vestindo as camisetas da campanha e dos milhares de torcedoras e torcedores impactados pelas ações do Protocolo Zero, em 2025, fortalece esse movimento de conscientização. Durante os meses de janeiro, fevereiro e março, rodamos mais de 1795 mil quilômetros pelo Rio Grande do Sul, estivemos presentes em 12 das 72 partidas disputadas e envolvemos várias associadas e associados Odabá nas ações e abordagens.
Casos ocorridos no Gauchão 2025
Infelizmente, tivemos alguns casos que ocorreram no campeonato. O Protocolo Zero tem uma estratégia de ativação, onde qualquer ato suspeito é acompanhado e são tomadas providências.
A principal lição dessa mobilização é conscientizar as pessoas de que o crime de racismo não será aceito nem relativizado nos estádios de futebol do RS, e medidas serão tomadas sempre que formos acionados.
Em breve, tem início a Divisão de Acesso, e o trabalho permanece, como resultado de uma série de ações de letramento racial, formações e orientações que tiveram início ainda em 2023, abrangendo desde as equipes e comissões técnicas da Série A até as categorias de base. Você pode acessar aqui a cartilha Letramento Básico por um Futebol Antirracista e conhecer um pouco desse extenso trabalho, que envolve diversos especialistas.
O racismo, infelizmente, é um crime perfeito na mente de muitos, onde ninguém se autodeclara racista. No entanto, sou uma realista esperançosa e acredito firmemente que, por meio da educação, podemos realizar mudanças significativas. A cada vez que abordo este assunto, tenho a esperança de que pelo menos uma pessoa irá refletir sobre suas ações e preconceitos.
A crueldade desse crime se manifesta em todos os lugares, mas estamos falando de futebol, um ambiente onde paixão e emoção se misturam, e onde não há mais espaço para crimes de ódio. Cada um que está dentro e fora do campo, quando se omite, torna-se cúmplice desse crime hediondo.
Maiara Medeiros (@maimedeiros23) é graduada em Psicologia pela Universidade Luterana do Brasil. Especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental, pós-graduada pela Sociedade Brasileira de Dinâmica de Grupos (SBDG) e entusiasta em psicologia positiva e teoria do esquema. Soma mais de 20 anos de experiência nas áreas clínica e organizacional, em atendimentos de jovens e adultos, sendo referência nos atendimentos de mulheres que sofrem violência, abusos e em causas étnico-raciais e diversidade. Palestrante sobre temas ligados à violência doméstica e letramento racial. Atua em diversos grupos de pautas femininas e raciais. Já atuou na liderança do Comitê de Empreendedorismo do Grupo Mulheres do Brasil, é palestrante e apoiadora do Grupo Mulheres em Construção, consultora na B2Mamy e no Projeto Pretos que Voam e, como associada Odabá, é gestora do Projeto Protocolo Zero - Fim de Jogo para o Racismo, uma parceria entre a Odabá e a Federação Gaúcha de Futebol (FGF).
Todos os textos dos membros da Odabá estão AQUI.
Foto da Capa: Max Peixoto / FGF