Ela pavimentou caminhos disruptivos para tornar o mundo mais feminino, mais inclusivo, mais civilizado. Sempre doce, assertiva e com uma escuta atenta, Monica Riffel, foi uma das articuladoras mais atuantes do coletivo POA Inquieta. De forma completamente inesperada, resultado de um procedimento médico devido a um aneurisma cerebral, ela faleceu no sábado, dia 12 de agosto. Partiu deixando o grupo enlutado, além de seu único filho, Rafael Riffel Wagner.
Para termos um pouco mais da noção do significado da Monica, fundadora da Casa de Assessoria, idealizadora do AmadureSer e Mulheres às Avessas, para o POA Inquieta, a seguir vão alguns relatos e informações dos projetos e iniciativas em que ela deixou sua marca. Ela foi articuladora do spin “Capital Humano” e participou de diversas iniciativas envolvendo capacitação, empoderamento, conexões, oportunidades e muitas outras coisas. Grande parte das vezes, ela atuava nos bastidores, abrindo possibilidades inimagináveis para o desenvolvimento de práticas antiracistas e antisexistas em Porto Alegre.
Primeiro negro na diretoria da ACPA
Através da Monica, o empresário Cristiano Barcellos se tornou membro da Associação Comercial de Porto Alegre (ACPA). Ele foi o primeiro negro a integrar a diretoria da ACPA, em 156 anos de existência. Conheceu a Moni, como era chamada pelos amigos, em uma das rodas de conversa do POA Inquieta, em 2019. “Conheci a Monica numa discussão. Falei para ela que era fácil pedir calma pra quem não sofre com o racismo, entramos naquele papo de branquitude e privilégios,” recorda Cris.
Depois daquele dia, ela chamou o ativista e empresário para várias oportunidades. “Ela e eu tivemos uma reunião virtual com a professora Cida Bento do livro Pacto da Branquitude, uma agenda do Pacto Global para levar letramento racial as empresas. A Moni também nos ajudou na construção da Semana de Consciência Negra 2021 no Nau, a primeira abertura da SECON fora de um território negro. Logo depois a Moni assume uma diretoria na ACPA, na gestão do Paulo Afonso, e leva a Reafro a fazer um contrato de parceria entre as entidades,” observa Cris. O empresário comenta que foi a primeira entidade empresarial gaúcha a firmar um convênio com uma entidade negra. Depois, as duas organizações promoveram juntas a Jornada do Empoderamento Preto. Recentemente, Monica era VP de Diversidade e Inclusão da ACPA.
Apoio às mulheres
Pelo POA Inquieta, Monica foi fundamental na estruturação de projetos com o Voz e Vez das Mulheres, uma ação conjunta com a Promotoras da Promotoria de Violência Doméstica Ivana Bataglin e Carla Souto do Ministério Público Estadual. O projeto foi iniciado em janeiro de 2020 e entregue oficialmente em 1º de julho de 2022.
O objetivo foi dar voz e fortalecer o protagonismo das mulheres para o resgate de sua dignidade. A iniciativa contou com distintas etapas, que incluíram a preparação, através de rodas de conversa, a jornada vivencial, a tomada de consciência, a decisão e tudo com o acompanhamento voluntário de mentoras ligadas ao POA Inquieta. Desde março o projeto piloto iniciado pelas inquietas conectadas pela Monica está em andamento na Promotoria de Santo Ângelo.
Outro programa onde a atuação da Moni foi crucial é o “Eu Líder de meu Destino”, da Casa de Recuperação Marta e Maria, que trabalha com a recuperação de mulheres dependentes de álcool e drogas. A iniciativa começou em setembro 2020 e encerrou em dezembro do mesmo ano, inclusive com solenidade de formatura. Cada inquieta tinha uma ou mais “mentoradas” para que o objetivo do programa fosse atingido. Ou seja, reintegrar mulheres que fizeram uso excessivo de drogas e estariam em estágio avançado de recuperação, em condições de tomarem o rumo das suas vidas novamente.
O projeto foi desenvolvido em 23 encontros, desenvolvido em três módulos, duas vezes por semana em encontros com duração de três horas. A professora Rita Carnevale, que esteve junto com a Moni nesses dois projetos, conta que após formatura, cada egressa definiu se desejava mentoria conforme o crescimento e estabilidade da egressa. No “Marta e Maria”, como as inquietas o batizaram, foram atendidas 16 mulheres, sendo que dessas, nove foram mentoradas.
Descolada e empreendedora
A empreendedora, coach de carreiras e relações públicas Monica também teve importante participação em projetos envolvendo jovens 17+, uma iniciativa articulada entre o Sine e o POA Inquieta. Para o público do 50+, além da sua iniciativa Amadurecer, também marcou presença em um projeto com a PUCRS. Também atuou fortemente na preparação dos eventos para elaboração e debate sobre a Carta POA 2050. Os encontros on line tiveram a participação de representantes da sociedade, candidatos e membros do Executivo e Legislativo. A Carta foi entregue para todos os candidatos às eleições municipais de 2020.
Nos eventos em que organizava, como o Bombordo, derivado do Mulheres às Avessas, ela concedeu quatro inscrições gratuitas destinadas a mulheres periféricas e lideranças femininas. Ela tinha uma preocupação constante em ser inclusiva e acolhedora. Monica participou ativamente do projeto de inserção de pessoas em situação de rua no mercado de trabalho, através de uma parceria entre a prefeitura de Porto Alegre e a Rede Cidadã.
Tive o privilégio de acompanhar a Monica também em lives. Ela esteve à frente do Mulheres na Política. Foi um programa aos sábados pela manhã, que antecedeu as eleições de 2020, onde participaram mulheres que ocuparam, estavam ocupando e pretendiam ocupar espaços da política. A iniciativa fez parte do Mulheres às Avessas. Foram seis edições de rodas de conversa online que aconteceram entre agosto e setembro de 2020, ou seja, em plena pandemia. Participaram mulheres de vários partidos de esquerda, de direita e de centro, que contaram os desafios de conquistar um lugar e ser respeitada em ambientes quase que exclusivamente masculinos e machistas. Ela ainda escreveu artigos para este nosso espaço aqui da Sler.
Para homenagear o legado de Monica, preparamos uma cesta de flores especialmente para seu funeral. Depois da cerimônia, a cesta foi levada por nós, do POA Inquieta, até o Asilo Padre Cacique no domingo, um dia depois da cerimônia. A ideia foi levar alegria para outras pessoas, na vibe do Mulheres às Avessas e do público maduro bem no estilo da nossa amiga. Seus ideais e sua gentileza peculiar estarão presentes, vivos dentro de todos e todas que tiveram oportunidade de conviver com ela.