No ultimo domingo, dia 4 de fevereiro, completei mais uma volta ao redor do sol. E neste ano, mais uma vez, festejei no Parque Estadual de Itapuã, em Viamão. Desta vez, o local foi na Praia da Pedreira, num dia excelente para se banhar nas águas doces e limpas do Guaíba, quase Lagoa dos Patos.
Não me lembro bem desde quando, mas há tempo venho promovendo momentos festivos em meio a natureza. Meu casamento foi embaixo de uma baita figueira. Algumas comemorações de aniversário do meu filho foram no Parque Marinha do Brasil. A gurizada subiu em árvores, jogou bola e cantou o parabéns diante de uma imensa toalha com bolo e docinhos.
Tenho vários motivos para proporcionar esses momentos. Antes de mais nada, sempre penso que todos precisam sair felizes, satisfeitos de uma comemoração. E qualquer junção pode servir como uma forma de conscientização sobre o quanto precisamos respeitar e honrar o planeta que temos. Hoje, então, sair das telas, estar em contato direto com ambientes naturais, conhecer pessoas diferentes, deixar de lado a zona de conforto é algo que quem se permite só sai ganhando. Nesse ano, boa parte dos convidados – apreciadores de santuários ecológicos Brasil afora – não conhecia o Parque Estadual de Itapuã.
Esse pedaço do paraíso, distante a 60km do centro da Capital, guarda testemunhos da história geológica do planeta. Foi palco de batalhas da Revolução Farroupilha, fica próximo do Hospital Colônia, para onde eram mandados os leprosos (como eram chamadas as pessoas com hanseníase) no século passado. As distintas paisagens com ambientes repletos de vegetação de diferentes portes, com uma orla recortada, bem acabada por areias brancas e rochas graníticas são perfeitas para se compreender como era originalmente a Região Metropolitana. Antes da chegada dos europeus, o nosso atual território, era muito parecido como é hoje aquela área.
Mas talvez o que mais faça as pessoas valorizarem essa Unidade de Conservação (UC) é a trajetória – de muitos capítulos e da mobilização – para a sua implantação. Boa parte do granito que está nas calçadas, logradouros consagrados como a Praça da Alfândega tem como origem Itapuã. Dentro da área do Parque saíram milhares de toneladas de pedra que foram para diversos destinos. Essa atividade empregava muitos moradores da região.
Parque está consolidado graças à mobilização da Clepei
Se hoje existe esse lugar preservado, paradisíaco, com um plano de manejo que não permite uma ocupação abusiva, foi por que, na década de 80, um grupo de jovens que participou de uma das excursões organizadas pela Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan) se mobilizou para isso. Em um acampamento para limpeza da Praia do Tigre em janeiro de 1985, foi criada a Comissão de Luta pela Efetivação do Parque Estadual de Itapuã, mais conhecida como Clepei.
A história do parque é recheada de episódios insólitos. Eu quero e preciso registrar isso em um livro (é uma das metas da minha existência). Até porque expressiva parcela de tomadores de decisão, formadores de opinião, pessoas que gostam da natureza precisam conhecer e valorizar esse lugar tão especial. Perdi a conta de quanta gente já me disse que nunca foi lá.
Na trilha que fizemos – foram formados três grupos com cerca de 13 pessoas – todos se maravilharam com o que viram. Descortinaram paisagens exuberantes, árvores de vários tamanhos e incontáveis borboletas, de várias cores e tamanhos. Ao mesmo tempo, meus convidados se chocaram com a quantidade de resíduos que o Guaíba trouxe devido ao volume de chuvas.
Uma das convidadas, a Simone, minha prima segunda, disse que o que mais chamou a atenção no parque foi o respeito com a natureza. Ela acredita que as medidas de limitar o número de pessoas, os acessos às trilhas, não ter som, bares, é essencial. “No início parece antipático, mas ter conhecido um pouco da história da fundação do parque e ter visto os bugios chegarem perto e não terem medo da gente, fortaleceu que as medidas são necessárias”. Ela achou fundamental o papel dos guias e a revista do carro na saída. “Dá um alento saber que tem lugares assim perto da gente,’ confessou Simone.
Duas praias estão abertas ao público. Em cada uma delas há um limite de público: 350 na Praia das Pombas e 120 na Pedreira. Para frequentar o parque há várias regras a serem seguidas, conforme o plano de manejo: não podem entrar animais de estimação, é proibido jogar bola e muito menos ouvir algum tipo de música, ou seja, levar caixa de som. E há guardas transitando o tempo todo. O lugar é para quem gosta mesmo de natureza, quer ouvir o canto dos pássaros, o barulho das ondinhas (quando tem) e o balançar dos galhos e folhas ao vento. Há várias pesquisas sendo realizadas por lá.
Para mim, que acompanhei parte da mobilização da Clepei, quando era repórter do Correio do Povo, depois participei ativamente das ações e confecção dos materiais de divulgação do parque durante o governo que reabriu o parque em 2002, foi uma alegria em vários sentidos testemunhar o cuidado que a atual administradora, a Dayse Rocha, está procurando ter com a UC. Vale seguir o perfil do Parque no Instagram. Isso, sem falar que meu marido tem uma estreitíssima ligação com o Parque, pois pesquisou cinco anos o comportamento dos bugios por lá e também foi um dos fundadores e articuladores da Clepei.
Antes de reabrir, havia uma rejeição grande da comunidade local em consolidar a UC. Negociações de várias frentes foram tecidas tanto pela diretora do parque Jane Vasconcellos, quanto pelos servidores da recém criada Secretaria Estadual do Meio Ambiente. Minha grande satisfação no domingo foi sentir que as sementes lançadas naquele tempo – como o curso para condutores de trilhas no parque organizado pela Jane – se desenvolveram e hoje dão frutos. O valor pago aos guias pela trilha, R$35,00 por pessoa movimentou a economia local.
As orientações, a dedicação e o conhecimento da história do local pelos guias no domingo de quase 40 graus na trilha da Praia da Pedreira até a Praia do Araçá, deixaram todos encantados. Minha satisfação em comemorar meu aniversário naquele paraíso foi completa. Quando o trabalho envolve o coração das pessoas, independente do governo, ele tem muito mais chance de dar certo. Quero voltar muitas vezes lá e levar mais gente para conhecer esse lugar que todos precisam admirar e respeitar.
Clique aqui pra ver o folder feito para a reabertura do Parque Estadual de Itapuã.
Fotos: Acervo da Autora