Quem é Narges Mohamamadi? E qual o impacto de uma mulher como ela para nós brasileiras? E qual o impacto desta mulher no mundo? Começo a coluna desta semana convidando você, mulher, a conhecer o que nos conecta a Narges, a sua luta e o preço caro que ela paga por seu posicionamento público há 22 anos contra um governo teocrático, que promove uma cultura de violência e opressão contra as mulheres no Irã. E você vai entender que a minha admiração por Narges inclui, mas vai além do seu ativismo.
Um dos meus pontos de admiração é a coragem firme e radical de Narges em usar a sua voz e romper o silencio, e o quanto isto ainda é revolucionário, mesmo em 2023. “Narges poderia ter saído do país, mas sempre se negou, tornou-se a voz das sem voz. Mesmo na prisão, não esquece seu dever e relata a situação dos presos.”, conta Reza Moini, ativista Iraniana, radicada em Paris.
Mas vamos lá: quem é Narges Mohammadi? Mulher iraniana, ativista e jornalista de 51 anos, se tornou um exemplo para muitas mulheres ao redor do mundo, mostrando que a luta pelo direito das mulheres é uma batalha que deve ser travada de forma incansável e permanente. Estudou Física, se formou em Engenharia e paralelamente fez jornalismo. Nos anos 2000 se juntou ao Centro de Defensores do Direitos Humanos, fundado pela também iraniana, ganhadora do prêmio Nobel da Paz, Shirin Ebadi, que, junto com outras causas, lutavam pela abolição da pena de morte. “Narges sofre há mais de 20 anos um perseguição judicial e policial para silenciá-la.” segundo a ONG Repórteres sem Fronteiras.
Mas silenciá-la por quê? O que ela denuncia que a torna tão potente? Ela dá voz a um amplo movimento de protesto na República Islâmica que contesta a vigilância moral e religiosa em relação as mulheres, e ainda clama por liberdade e igualdade de direitos. Em artigo recente no New York Times, disse: “Meu objetivo naquela época era combater a tirania religiosa, que junto com as tradições e costumes sociais levou à profunda repressão das mulheres no Irã.” Este artigo foi publicado no dia 16 de setembro deste ano, data do primeiro aniversário da morte de Masha Amini, de 22 anos, assassinada pela polícia da moralidade iraniana.
Neste mesmo texto, Narges define que o regime teocrático propaga propositalmente uma cultura de violência contra as mulheres. “O que o governo não compreende é que quanto mais eles nos prendem, mais forte nos tornamos.” Os protestos se espalharam no país após a morte de Masha Amini e geraram mais opressão. Narges relata nunca ter visto as enfermarias tão lotadas de mulheres presas e espancadas por desafiarem o regime. A voz de Narges, sua insistência em falar, gritar ao mundo mobiliza e inflama mais mulheres. “O moral entre as novas prisioneiras está elevado. Todas elas, independentemente da forma que foram presas, tinham uma exigência: derrubar o regime da República Islâmica.”
Paralelamente, o regime faz avançar no Parlamento a Lei do Hijab e da castidade, estabelecendo multas e penas de prisão a quem desobedecer ao rigoroso código de vestimenta, que será imposto também como critério de contratação as mulheres. O projeto foi classificado como apartheid de gênero por oito peritos independentes do Conselho de direitos da ONU.
A Anistia internacional relatou a expulsão de mulheres das universidades, impedidas de realizar exames finais, por não usarem o véu. Mais de um milhão de mulheres receberam mensagens de texto, alertando que poderiam ter seus carros confiscados, se fossem filmadas por câmeras de vigilância sem lenço na cabeça. Por estas e outras tantas razões que o Nobel da Paz concedido a Narges Mohammadi legitima o movimento deflagrado há um ano no país e renova o fôlego das iranianas.
E o que esta mulher e a luta pelos direitos das mulheres no Irã pode inspirar a nós mulheres brasileiras? Que usar a voz de forma posicionada pode nos ajudar a dar visibilidade a transformações urgente que precisamos aqui no Brasil, como o feminicídio, a ascensão do masculinismo dos Red Pills da vida. Realidades como a do Irã demonstram que a cultura de violência contra as mulheres, em vários níveis, resiste através do tempo, e que se não houver vigilância permanente quem poderá estar sendo obrigada a usar véus, e seguir códigos de moralidade patriarcal seremos todas nós. Narges me inspira, me faz pensar que somos da mesma geração X, e ao mesmo tempo me renova também, ao me defrontar com sua firme resistência em reimaginar radicalmente um futuro para as mulheres no mundo.