O Brasil sancionou recentemente a lei que regulamenta a telemedicina. Com o apoio da classe médica, o ordenamento determina as normas para o atendimento de pacientes a distância com auxílio de aparatos tecnológicos.
Eu, como entusiasta do teletrabalho (como o trabalho remoto é chamado aqui em Portugal), acredito que é um grande passo para a medicina. Contudo, precisamos esperar para ver como isso vai se dar no Brasil.
É que, de um modo geral, não confio nos médicos brasileiros, nos agentes da saúde e nos órgãos que regulam o setor.
Focando nos médicos, sempre acreditei que são profissionais essenciais para sociedade. Aqueles que tratam, mas que também acolhem e salvam vidas ao mesmo tempo que confortam a alma.
Só que, com raras exceções, a medicina no Brasil desvirtuou a missão nobre e digna para uma corrida por dinheiro e status. Gente que não deveria nem cuidar de plantas, escolhe atender pessoas, pensando somente no tanto que é possível cobrar por cada procedimento.
Nos últimos 30 anos, conto nos dedos os médicos que chegaram perto de mim. E olha que eu sou caxias com check-up e tenho até geriatra desde os 40 anos. Em compensação, o número de situações absurdas que ouvi e vivi … vixe.
Teve o pediatra da emergência que diagnosticou meu filho com passagem de pedra nos rins. Detalhe: ele tinha dois anos e, mais tarde, descobrimos que ele estava passando por um dos seus primeiros episódios de enxaqueca.
Na Santa Casa de Porto Alegre, minha mãe com câncer terminal, recebeu alta para morrer em casa sem o consentimento da família. Bonito, exceto pelo fato de que, ao sair do hospital, ela deixaria de receber medicação intravenosa para controle da dor, a única que ela suportava. Diante de uma junta médica irredutível (mesmo com aparente desconforto de alguns), só conseguimos reverter a decisão ao ameaçar chamar a imprensa para que ela pudesse morrer sem sofrer.
O parto do meu filho mais velho – que era para ser normal – virou uma cesariana de emergência desnecessária porque era véspera de Natal. Como éramos marinheiros de primeira viagem, acabamos por só entender o que havia acontecido alguns dias depois do fato feito.
Um sem-número de profissionais duvidou que o mais novo tivesse alergia à proteína do leite (alergia, não estou a falar de intolerância), sendo que um renomado especialista chegou a dizer que o choro que não parava por horas era “manha” para dormir no colo, mesmo vendo seus exames.
Poderia ficar dias a citar casos tristes da relação que temos com os “doutores”, mas imagino que cada um de nós também tem algumas dezenas deles. Então paro por aqui afirmando que é bom saber que, ao final de percursos tortuosos, podemos sempre encontrar as exceções. Então, vou deixar as queixas de lado e voltar para a telemedicina.
Mesmo antes da regulamentação das consultas médicas virtuais, elas já eram praticadas de forma presencial no Brasil. Afinal de contas, nos poucos minutos que passamos dentro do consultório, o mais comum é o médico sequer sair de trás de sua linda mesa. A vantagem que temos agora será economizar o tempo investido em deslocamento e salas de espera.
A questão que fica é como os bons e velhos corporativistas vão ficar quando o povo descobrir que pode gozar de ótimas consultas remotas ao invés de perder seu tempo com a “celebridade” que tem o consultório mais “chique” da sua cidade? Será que a telemedicina se sustenta com uma categoria que quer menos médicos para poder reservar mercado, mesmo com brasileiros morrendo de leishmaniose?
Só acredito vendo.