Cortina de fumaça é uma expressão coloquial usada para expressar quando algo precisa ser encoberto e se coloca outra coisa em primeiro plano para ocultar o que realmente é o “problema” ou a “questão”.
Há dias o Brasil está coberto numa grande cortina de fumaça, ou talvez o mais apropriado seria dizer que estamos debaixo de um teto de fumaça sobre nossas cabeças. À parte de todas as questões ambientais e políticas que estão por detrás dessa fumaça, fico pensando nas cortinas de fumaça de nossas vidas e seus responsáveis.
As queimadas ilegais e o afrouxamento histórico nas políticas ambientais foram autorizando uma escalada desenfreada no desmatamento. Nesse caso, governantes e lideranças deveriam ser responsáveis em fiscalizar e penalizar casos em que a lei é descumprida. Interesses econômicos à parte, sabemos que essa fiscalização tem vistas grossas e não é de agora.
Mas como estabelecemos nossas leis de proteção pessoal e individual que regulamentam nossos territórios de dentro, nossas políticas de proteção contra invasão, desmatamento e uso indevido de nossos recursos vitais? O sol está encoberto em fumaça e insiste em nos iluminar e teima em brilhar. Eu, aqui dentro do meu ecossistema individual, driblo minhas cortinas de fumaça para não morrer sufocada. Tento respirar, tentando enxergar o que a fumaça encobre de medos, covardias e arrependimentos. Com sorte, poderíamos todos compreender as próprias poluições e que recursos naturais, emocionais e mentais podemos estar deixando que sejam explorados sem impor limites nem multas.
Quem vem usando sua natureza ilegalmente? Quem te desmata? Você pensa que um dia esse desmatamento pode acabar com tudo e que não vai ser mais possível nem respirar? Você joga seu lixo de dentro nos lugares cabíveis para ser devidamente descartado? Suas águas conseguem ficar limpas?
Em relação ao nosso planeta, sabemos bem o que essa cortina encobre de interesses escusos e criminosos e deveríamos saber mais ainda – embora neguemos – as consequências já perceptíveis em nossa saúde e até em nossa expectativa de vida. Sabemos (ou deveríamos saber) da nossa responsabilidade nesse cenário em relação aos pequenos delitos diários que cometemos mais ou menos conscientemente contra a natureza. Está tudo bem, óbvio, parece-me.
Já as fumaças de dentro são outros quinhentos. Saber o que elas encobrem, saber olhar através delas e não ficar enroscado, tossindo e reclamando dos “outros” que poluem nosso ar é infantil e ineficaz. Também não existe exaustor grande suficiente que sugue essa fumaça magicamente. Exaustivo é o caminho mais eficaz para compreender a fumaça, saber de onde vem e o que encobre. Respirar melhor deveria ser direito de todos, mas sabemos muito bem que em ambos os casos – da natureza de fora e da de dentro – é privilégio de quem tem coragem.
Foto da Capa: Freepik
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