Quem escreve semanalmente, como tem sido o meu caso, amiúde se encontra duvidando da tarefa. Afinal, haveria tanto assim a dizer? Quem vai querer saber? Quem perguntou isso que estou colocando no texto?
Bom senso? Talvez sim, mas, além disso, armadilhas egoicas que geram resistências à atividade de escrita. Nesse sentido, é libertador assumir que poder escrever passa por não estar desesperado em ser interessante. Sair dessa pressão e vaidade é um alívio enorme. É um aprendizado que se atualiza em muitos momentos, já que a condição ultrapassa outros campos da vida.
Há muitos anos, me meti em uma situação de idílio bastante duvidosa, na qual meu interlocutor me enrolava com belíssimos e longos e-mails. Coisa fina e literária. Minhas respostas iam nessa mesma direção de trabalho com a palavra, além de, é claro, acalentarem uma ânsia de demonstração de dotes intelectuais… Quanta bobagem!
Foi preciso que uma amiga querida – que, aliás, nem sabe o quanto me ajudou –, num intervalo pequeno dessa loucura, apenas dissesse: “Por que ele acha que a vida dele é tão interessante?”. Pois é, por quê?, me vi repetindo. A partir daí, uma pequena janela se abriu e, em seguida, a porta de saída. Nada como uma boa pergunta colocada na hora certa. Melhor dito, as perguntas decisivas fazem a hora certa. Naquele caso, a atitude de se crer tão interessante só podia denunciar um vínculo esquisito.
É que, às vezes, essas situações nos capturam pela fascinação que geram. Haja análise para sair e, ademais, boas amizades que sabem ser precisas, porém oblíquas, pois de nada adianta o confronto com o fascinado. O despertar de certas hipnoses não se faz com uma sacudidela, mas com a simples lembrança de que há outras coisas. Sempre há! Saí dessa situação risível relembrando o valor das amizades nessas sutilezas. Não era novidade, já que outro querido amigo – este mais sabedor de sua importância em minha vida – também fora fundamental quando tive que passar por uma real separação. Absolutamente tudo apontava para aquela decisão, mas eu não me animava a seguir adiante. Então, ele simplesmente me disse: “Essa relação é uma empreitada, mas tu sabes que sempre vou estar do teu lado, qualquer que seja a tua decisão, amiga”.
Essas palavras foram tão decisivas, porque lembraram que o amor não é fazer a coisa certa e ganhar tapinhas nas costas, mas ter afetos, apesar das coisas erradas, equivocadas e trapalhadas de nossa vida. Enfim, é mesmo um alívio não ter que ser interessante, porque interessante mesmo é ter amigos que suportam essas “desinteressâncias”. Desejo um 2025 em que nos permitamos não ser tão interessantes.
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Foto da Capa: Gerada por IA