Existem pessoas que são especialistas em viver relacionamentos difíceis.
Todos conhecemos pessoas assim.
Falam e se lamentam sobre seus relacionamentos anteriores, mas repetem, repetem e repetem situações e modelos nas relações seguintes.
Estão sempre procurando, inconscientemente, por alguém parecido com o companheiro ou a companheira anterior.
(Ops, antes da sequência do artigo, é necessária uma informação: não sei se você, leitor ou leitora, sabe, mas além de trabalhar como jornalista e cronista, tenho um site de relacionamento chamado Coroa Metade, voltado a pessoas a partir dos 40 anos de idade, que criei e lancei há 12 anos e cujo “aniversário” foi há pouco, no dia 22 de novembro. Nessa mais de uma década, encontrei pessoalmente com muitos usuários e usuárias do site e recebi milhares de mensagens com informações, dúvidas, reflexões e desabafos.)
Os relacionamentos ruins que se repetem ao longo da vida talvez sejam os que mais me intrigam e fascinam.
As mulheres, em especial, têm que tomar cuidado com essa questão.
Através do Coroa Metade, conheci várias mulheres que tiveram durante anos um relacionamento ruim. Muitas contaram que foram amantes, no sentido clássico da palavra: se relacionaram durante anos com homens casados.
E eles sempre diziam que deixariam a esposa.
Depois que a filha se formasse!
Quando a mulher finalmente se curasse de um câncer!
Depois que, sei lá, há tantas e tantas desculpas para se prolongar uma relação que é muitas vezes cômoda para quem está traindo…
Algumas relataram que namoraram, às escondidas, com um chefe, que não podia assumir a relação.
– Ele dizia que poderia interferir na empresa…
Nada mais claro.
É a lei do mercado.
Namorados, namorados, negócios à parte!
Essas mulheres passaram anos sofrendo.
Sofrendo e pensando o tempo todo no homem amado.
Todos os pensamentos do dia voltados para ele!
– Será que ele vem aqui no Natal?
– Será que finalmente ele vai assumir-me diante dos outros?
– Será que é verdade que ele não dorme com a esposa?
– Ele dará um jeito de viajar comigo no meu aniversário?
Nas histórias que me contaram, em algumas poucas vezes o amante de fato acabou se separando da esposa.
Mas a nova relação não resistiu à convivência diária, ao acordar junto de cara amarrada e amassada, à mesmice e cobranças do cotidiano.
Na maioria das vezes, porém, a promessa não foi cumprida.
Sempre havia ou acontecia mais alguma coisa.
A situação se prolongava quase ad infinitum.
Finalmente conseguiam se livrar do traste que empacava suas vidas.
A vida muitas vezes traz novas oportunidades e muitas dessas mulheres encontraram, após saírem das suas relações neuróticas, um novo companheiro.
Um homem legal, fiel, carinhoso e apaixonado.
Mas aí, veja só, o que aconteceu com várias delas: sentiram que faltava alguma coisa, que tinha algo errado e terminaram a relação.
– Você tem tudo com que sempre sonhei. É a melhor pessoa do mundo. Eu não quero te magoar, por isso preciso ser sincera. Gostaria de estar apaixonada por você, mas falta algo – disseram, mais ou menos assim, cada uma delas, ao terminar o novo relacionamento.
Você – leitor, leitora – sabe o que faltava?
A neurose!
O sofrimento!
Essas mulheres se acostumaram a sofrer, a pensar o tempo todo no outro, naquele que durante anos se tornou a figura central da relação, o ser mais importante de suas existências. Aquele sem o qual não poderiam mais viver!
Quando a gente ama e é amado de verdade, não pensa 100% do tempo na pessoa amada. Pelo contrário, estamos livres para ler, pensar no trabalho e curtir inteiramente o estar com os amigos, com a família ou mesmo sozinhos assistindo a um programa de televisão.
Somente em uma relação neurótica e infeliz a gente pensa 100% do tempo no outro.
Pessoas como as que citei não sentem a falta do amor. Sentem falta é da doença!
Ter um novo e bom relacionamento se torna mais fácil para a pessoa que, após colocar no “outro” toda a culpa do fim de um namoro ou casamento, aos poucos percebe também erros que ela própria cometeu.
Esse é o verdadeiro segredo para ter uma nova relação!
Claro que todos temos dentro de nós questões tristes ou mesmo traumáticas dos relacionamentos que acabaram, mas, como diz aquela velha frase, “o segundo casamento é o triunfo da esperança sobre a experiência”.
Já contei em algumas das entrevistas que dei para rádios e televisões de todo o País que aprendi muito – e continuo aprendendo – à frente do site. E que mudei conceitos, graças às histórias que conheci com os usuários e principalmente com os muitos casais que se formaram no Coroa Metade.
Uma delas é que eu imaginava que as pessoas maduras sabem o que querem.
Não, caro leitor, cara leitora; isso é uma balela! Quase ninguém na vida sabe exatamente o que quer. Mas uma das poucas e grandes vantagens de a pessoa ser mais velha é ao menos saber o que não quer.
Saber que não queremos ter um casinho, queremos encontrar alguém simplesmente para ficar, que não vale a pena ficar anos esperando pela decisão de um companheiro ou companheira assumir a relação, ajuda muito na hora de se encontrar um amor.
Oxalá mais e mais pessoas saibam que não devem repetir padrões!
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Muitas vezes me perguntam se eu, como criador de um site de relacionamento, penso que as pessoas solteiras não podem ser felizes.
É claro que sim!
Você já reparou que geralmente quem reclama quando está solteiro também reclama quando se casa?
A felicidade também depende de como encaramos a vida.
Um dos aspectos positivos da sociedade atual é existirem menos cobranças no tocante aos modelos familiares. Ninguém precisa se casar para ser feliz, nem para mostrar para os outros.
Não é preciso ter filhos só porque a sociedade assim exige.
São opções de cada um.
Mas, de modo geral, as pessoas percebem que precisam ter alguém para compartilhar a vida.
Nas primeiras entrevistas sobre o site, eu costumava lembrar um dito popular, que eu repetia aos quatro ventos: “os opostos se atraem”.
Felizmente, há muitos tipos de casais e não há fórmulas para o amor, mas falando em termos gerais, quando as pessoas são parecidas e com gostos e objetivos semelhantes, os relacionamentos são melhores e mais duradouros.
Na maioria das vezes, quando os opostos se atraem, a atração dura pouco.
Talvez até possamos dizer que “os opostos se traem”.
Claro que a outra pessoa não precisa ser igual. Ninguém deseja – ou deveria – casar-se com o próprio espelho, embora o mundo moderno seja tão convidativo ao narcisismo.
É mais provável que, se eu gostar de cinema europeu e a minha esposa de teatro, um acabe acrescentando uma nova paixão no outro. Mas se eu gostar de jazz e a minha companheira adorar pagode, será difícil existir uma soma verdadeira.
Obviamente que toda regra tem uma exceção. No caso dos relacionamentos, felizmente, há muitas exceções. Mas de modo geral é fundamental também ter objetivos individuais, paixões, amigos, uma boa família.
Tudo isso ajuda demais quando a gente encontra um amor. Uma vida social torna a pessoa menos dependente. Quando é inexistente, quando a solidão apavora, o cenário está montado para que a gente se apaixone pela primeira pessoa que aparece.
Quem está sozinho deve tentar se aproximar de alguém com valores e objetivos semelhantes. E não deixar que a carência afetiva faça com que fique com alguém que não tem nada a ver com aquilo que procura.
Ainda assim, eu teria um pé atrás em uma relação em que a mulher que conheci não abdicasse em nada da sua vida social pela nossa relação. O mesmo vale quando o homem não abdica de nada pela companheira e para o caso dos casais homoafetivos. É preciso manter os amigos, é preciso ter momentos individuais, mas quase todos os casais que conheci, onde os dois viajavam sozinhos com os amigos, saíam para dançar sozinhos, acabaram se separando.
No contato com os casais que conheci no site e fora dele (amigos, conhecidos e parentes), percebo que também fundamental para um relacionamento sadio é saber viver o dia a dia e entender a magia que existe no cotidiano. Todo mundo é perfeito à distância. Todo mundo tem uma vida maravilhosa pelas redes sociais. O Facebook do vizinho é sempre verde e atraente! Na vida real existem problemas, existem momentos desgastantes e não dá para ser feliz o tempo todo. A vida não é uma propaganda. O verdadeiro amor implica também em tolerância, em compreensão e em ser companheiro nos grandes e pequenos momentos, nos instantes de plenitude e nas horas difíceis.
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Foto da Capa: Gerada por IA