O caçador Cro-Magnon já tinha uma protolinguagem e empregava um método indiciário (indícios, sinais) para caçar bisontes na dura faina diária pela sobrevivência. Examinava rastros, pegadas, pelos, galhos quebrados, sons animais, etc.
Os gregos chamaram este método de interpretação da realidade de semiótica (semeion) e o empregaram também na medicina hipocrática.
Os médicos modernos fazem o mesmo.
Conan Doyle – que era médico – fazia Sherlock Holmes, empregava o mesmo método para identificar criminosos e decifrar crimes.
Certa vez, uma elegante senhora londrina sentou-se ao seu lado no teatro. Conan Doyle, conhecendo profundamente a anatomia humana, sabia que o formato das orelhas tem um padrão familiar. Assim, notou que o formato da orelha de sua vizinha de poltrona era igual ao formato da orelha de um homem ao qual Conan Doyle investigava o assassinato. A partir daí, ele estabeleceu amizade com ela até ser convidado à sua casa e provocá-la a contar sua vida, na qual tinha uma herança recente a ser dividida com seu irmão, o homem assassinado.
A nobre gentilmente lhe ofereceu um chá. Sherlock, porém, sugeriu que gostaria de tomar um brandy, sua bebida de escolha nas frias noites londrinas. No brandy, servido em copos grandes como convém, ficariam as impressões digitais de todos os dedos de sua anfitriã. Se pedisse um chá, só ficariam na asa da xícara, as digitais de apenas dois dedos. E isso confirmou, comparadas às impressões da dama nos objetos encontrados no local do crime, que a elegante senhora londrina fora a assassina de seu irmão.
Eis um refinado método semiótico.
Cada paciente nos fornece uma série de sinais e sintomas que temos de interpretar para fazer um diagnóstico. Ele nos conta uma história em que temos que achar um desfecho e chegar à cura.
Suspeito que talvez esteja no método semiótico empregado cotidianamente por médicos na tentativa de curar, a origem do grande número de médicos escritores. A lista é grande. Numa revisão feita por nós, [Franklin Cunha, Blau Souza, Fernando Neubarth, J.E. Degrazia na série de sete edições de Médicos Pr(escrevem)] só no Rio Grande do Sul, encontramos entre vivos e falecidos, 260 colegas que se dedicaram a escrever em vários gêneros literários e com boas qualidades de escritura. E, se bem procuremos, há um maior número e talvez da grande qualidade intelectual de um Aureliano de Figueiredo Pinto, Dyonélio Machado, Cyro Martins, Moacyr Scliar, Prado Veppo e outros.
Franklin Cunha é médico e ocupa a cadeira número 9 da Academia Rio-Grandense de Letras.
Foto da Capa: Pixabay / Gerada por IA
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