Você já alguma vez na juventude pensou em fazer o Caminho de Santiago e teve que adiar os planos? Quem sabe agora não é o momento. O fato é que grande parte da nossa vida assumimos tantas responsabilidades com trabalho, família e tarefas do dia a dia que quando nos damos conta já se passaram vários anos e deixamos alguns sonhos de lado. Só nos resta curtir a aposentadoria e os netos… Será? Óbvio que não! Com as mudanças de paradigmas em relação ao envelhecimento é cada vez mais comum que haja na maturidade um resgate de desejos antigos. É quase um “quero recuperar o tempo perdido”. A turma dos cabelos grisalhos está mais ativa que nunca e com disposição de sobra.
Um exemplo disso é uma pesquisa divulgada pela Universidade de Santiago de Compostela que revela dados interessantes sobre mudanças no perfil dos peregrinos do Caminho de Santiago. Atualmente as mulheres são maioria, o número de peregrinos entre os 60 e os 65 anos é superior aos mais novos com 30 anos, e a motivação para as longas caminhadas diárias nem sempre é religiosa.
Sabe aquela imagem do peregrino simples, com cajado nas mãos e mochila nas costas, que anda várias horas por dia e pernoita em albergues lotados? Pois bem, agora ele divide o caminho com aqueles que querem concluir o percurso com algum conforto e comodidade. São pessoas dispostas a gastar um pouco mais e que buscam não só a elevação espiritual, mas também conhecer vilarejos medievais, atravessar pontes romanas e visitar igrejas históricas. As noites são passadas em hotéis de charme ou pousadas. As refeições em restaurantes típicos regadas à um bom vinho regional.
Essa “nova geração” de peregrinos é composta daqueles que deixaram pra trás a bolha de responsabilidades da juventude e decidem que é hora de curtir a vida. São pessoas já com seus 50 e tantos, que nem sempre têm um preparo físico de atleta, não pensam em se penitenciar carregando pesadas mochilas e muito menos dividir banheiro e dormir ao lado de outros peregrinos. Além disso, a ideia de passar trinta dias caminhando para percorrer os mais de 800km do caminho original, que parte da cidade francesa Sant Jean Pied de Port, já não é condição “sine qua non”. A moda agora são os trechos curtos, já que é possível conseguir a credencial de peregrino percorrendo somente 120km.
Portugal tem dois destes caminhos certificados, o central, que parte de Viseu e o da Costa que parte do Porto. Do lado espanhol são oito caminhos com certificação para trajetos curtos. Seja como for, todos terminam na Praça dos Obradoiros, em frente a majestosa Catedral de Santiago de Compostela, onde está enterrado o apóstolo Santiago.
Posso dizer que vale a pena. Já fiz o Caminho duas vezes, tanto o de Portugal, quanto o da Espanha e repetiria com certeza. Estar nesta rota milenar, que é seguida por milhões de peregrinos desde o início do século IX, é uma experiência inesquecível. A última vez foi há pouco mais de um ano, no finalzinho do inverno. Dez dias para percorrer 200km desde Barcelos. Foram dias de chuva e de sol, dias de muita chuva, frio e granizo, muitas subidas, muitas descidas, horas de silêncio. Tempo de sobra para refletir, agradecer, orar. Não sou da turma dos tradicionais peregrinos, mas também não fiz com muitas regalias. Levei minha mochila nas costas, porém não fiquei nos albergues. Escolhi pequenos hotéis, bons, mas simples restaurantes. Ao final, três dias inteiros em Santiago de Compostela para aproveitar a gastronomia local e descansar.
Esse meio termo também é possível. Aliás, cada um faz seu próprio caminho. Só uma coisa é comum a todos: as dores pelo corpo e as bolhas nos pés! Disso a gente não se livra.
Ficou com vontade? Estou por aqui para conversar.
Fotos: Acervo da Autora