O Lulu Santos tem uma música com um refrão que diz assim: “E logo eu, que era o campeão do twist/Naquele tempo eu era tão feliz/Hoje eu não consigo impressionar mais ninguém com isso.” Tenho, inclusive, uma foto que ficou famosa na minha família. Era eu com cerca de quatro anos dançando twist.
Vamos primeiro ao esclarecimento, para quem não suspeita do que se trata. Twist é uma dança inspirada no rock and roll. Entre 1959 e 1960, tornou-se uma febre pelo mundo. E seguiu pela década toda.
Causava repulsa dos conservadores pois era considerada muito provocante. A inspiração vem de uma dança afro-americana chamada “wringin and twistin”, que remonta a 1890. O estouro musical para a popularização nos anos sessenta veio na voz do cantor Chubby Checker: “Come on, baby/Let’s do the twist!”.
Pois bem. O Lulu fala de um eu que não consegue entender o presente: “Em que pensar/Como me sentir/O que beber/ Quem entregar/O que enrustir”.
Gosto muito de um conceito de história do pensador francês Foucault. Em vez de entender a história como uma diacronia, ou seja, como uma sequência em que uma coisa desemboca na outra, pensa como uma sucessão de sincronias. Como conjuntos de tempos que se separam por verdadeiros fossos. Há um buraco entre um tempo e outro.
A base de conceitos que possibilita a existência de uma sincronia se desfaz ou é suplantada por outra. De tal modo que não há uma ponte. Há um fosso.
Ficamos perplexos com a nova sincronia. Indagamos como pode haver comportamentos tão diversos do que esperávamos. Queríamos que a evolução de um processo seguisse, trazendo uma nova etapa evolutiva dentro da mesma base conceitual.
Mas a nova sincronia se apoia em outra base de conceitos. E a base, como todo alicerce, não está à mostra. Fica lá embaixo. É preciso que, se não conseguirmos enxergar, alguém que entenda desse novo código nos ajude a decifrar.
Caso contrário, vai se ficar tentando explicar o presente com os conceitos da sincronia anterior, que não dão conta da nova. Por exemplo, quando entendi que uma das bases conceituais do nosso tempo é a filosofia da diferença, o meu olhar sobre o agora mudou. Deixei de me sentir como o “campeão do twist”.