Uma das características e desafios de quem atua no campo dos Direitos Humanos, o qual compreende a Diversidade, Equidade e Inclusão, é trafegar por temas e vivências que extrapolam a identidade pessoal, mas não invalidam sua participação nos debates. Como? Vamos ao exemplo: como homem negro de pele parda, heterossexual e cisgênero, abordo temas como o antirracismo (que tem a ver com a minha identidade étnica-racial), mas também trago em meus textos, conversas, eventos e postagens o debate sobre as pessoas com deficiência, sobre o feminismo, sobre a causa migratória e sobre a comunidade LGBT+, entre outros.
A questão não é saber tudo sobre todos os assuntos, mas entender o meu (o seu!) lugar de fala. A partir da minha identificação inicial, tenho legitimidade para falar de racismo e antirracismo. Também reconhecendo quem sou, posso falar sobre as demais pautas ligadas à Diversidade, à Equidade e à Inclusão entendendo que pessoas que integram os demais grupos minorizados têm mais legitimidade pelo seu lugar de fala. Isso, porém, não me impede de ser uma pessoa aliada nessas causas, e assim que me vejo. É bom lembrar a diferença entre “falar de” e “falar sobre”. Se entendermos isso, vamos bem além nesse diálogo.
Como entendedores(as) dessas diferenças, tenho muitas amigas e amigos brancos que são aliados do movimento antirracista e falam sobre racismo, pois compreendem essa causa e muitas vezes a vivem em suas relações sociais (como mães, pais, amigos, companheiros/as).
O óbvio, sim, continua na moda
Em tempos de fake news e distorção de fatos a partir de fragmentos de discursos, é preciso dizer o óbvio. E o letramento faz parte disso. Para falar sobre as pessoas que se identificam como LGBT+, precisamos abrir a sigla: Lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transgêneras, transexuais e interessexuais. A sigla pode ser até maior (LGBTQIAPN+ em alguns casos), abarcando e respeitando todas as novas possibilidades de expressão. É preciso, também, entender as diferenças entre sexualidade, identidade de gênero, sexo biológico (veja esse manual da Aliança Nacional LGBTI). E lembrar da Revolta de Stonewall Inn.
O debate LGBT+ no cristianismo
Superando a fase de letramento, me deparei na véspera do Dia Nacional do Orgulho LGBT+, com uma live promovida pelo IHU – Instituto Humanitas Unisinos com o tema “A tarefa de desmasculinizar a Igreja: um olhar a partir das comunidades LGBTQIA+”. Entre os esclarecimentos trazidos pelas pessoas teólogas e pesquisadoras, veio o debate sobre o Papa Francisco, sua postura de diálogo e acolhimento e a polêmica criada em torno de sua fala este ano, em ambiente restrito, quando ele usou o termo “frociaginne”, tido como homofóbico. Mas isso foi só um fragmento de uma discussão de alto nível.
Também veio a leitura acurada dos integrantes do debate sobre as pessoas poderem estar de corpo e alma ao professarem sua fé. Foi mencionada a presença feminina, seu valor e seus saberes no meio católico. Referências de leitura foram sugeridas, como a revista que fala de todas as possibilidades do gênero, os livros Viemos pra comungar, Teologia e os LGBT, além de sites como Diversidade Católica e Rede Católicos LGBT.
Trabalhei por anos em instituições confessionais, conduzidas por homens ou por mulheres, mas o debate sobre diversidade, neste segmento, nunca me pareceu tão vivo, acessível e transparente. E essa é apenas uma parte (nesse caso a religiosidade cristã) de um universo amplo e rico em possibilidades. Poderíamos falar sobre conquistas e desafios na representatividade política LGBT+, sobre a criação de políticas públicas, sobre parentalidade em casais homoafetivos, sobre a aplicação das decisões do STF sobre LGBTfobia, sobre a discriminação na empregabilidade…
Meu convite neste dia 28 de junho, tão significativo para a comunidade LGBT+, é que se ouça, se acolha e se fale “de” e “sobre”, sempre com disposição ao aprendizado permanente. Não é sobre ser hetero, homo, cis, trans. É sobre saber que não basta apenas postar a bandeirinha arco-íris, mas aprender sobre os significados.
Somente com formação e informação é possível se posicionar sobre temas relacionados que tramitam no Congresso Nacional e em outras esferas de forma lúcida e, acima de tudo, humanizada, respeitadora e livre de dogmas.
Eduardo Borba é jornalista graduado pela PUCRS, praticante de corridas de rua e de ações para promover a Diversidade, Equidade e Inclusão. Mestre em Comunicação Social e especialista em Direitos Humanos, Responsabilidade Social e Cidadania Global.
Foto da Capa: Freepik
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