“O discurso está fortemente condicionado pelos modos em que diversos grupos sociais tentam acentuar suas ideias através das palavras, de maneira que elas expressem suas aspirações de domínio e manipulação. Elaborado por grupos dominantes, a linguagem do discurso é o produto de relações de forças e não um consenso”. (Slavoj Zizek)
Na feira, encontramos uma prestigiosa revista de economia e procuramos, sem êxito, nas edições de 2005 a 2008, algum aviso, uma advertência ao menos, de que a atual crise econômica mundial se aproximava. No número de dezembro, conhecida revista de publicação e prestígio nacionais pergunta em sua capa: ‘Para que servem os analistas. E os gurus da economia?’ E segue: ‘A atual crise mundial escancara nossa incompetência em fazer previsões – e a imprudência do mercado em acreditar nelas’.
Como sabemos, o capitalismo conseguiu sua unificação global através dos setores financeiros, informáticos e das comunicações no sentido de que nos fez acreditar num modo de produção sem bases materiais, pretensamente ancorado em signos abstratos, quase metafísicos e em pura semantização da realidade.
O dinheiro, fetiche da mercadoria, se reproduz, eletronicamente, de forma especulativa. As redes informáticas, ao cruzar o planeta em tempo real, ao derrubar limites geográficos e hábitos culturais, criaram um novo universo simbólico e imaginário. Assim, a indústria midiática, hegemonicamente dissimuladora, impôs uma totalidade cultural, facilitando a penetração de mercadorias completamente transnacionalizadas, condicionando culturas tradicionais, introduzindo nelas sua própria lógica de produção, de consumo e de preferências intelectuais. E, dessa forma, trilhões de dólares, criados por sugestivas palavras que chamaram de ‘derivativos’ e de outros epítetos tão atraentes quanto falsos, de repente foram para o espaço sideral. E o rombo nas finanças de milhões de economias familiares foi exponencialmente maior do que o causado pela crise de 1929. E, como no afundamento do Titanic por um inadvertido ‘iceberg’, na falta de botes salva-vidas, tiveram prioridade no salvamento os passageiros de primeira classe, também agora só há ‘botes’ para os ricos que estão se salvando graças à mão tão misteriosa quanto dadivosa do mercado capitalista.
Mas, se as publicações nacionais nada viram e de nada nos advertiram de que uma montanha de gélidos dólares iria em breve nos afundar, faça-se justiça a Joseph Stiglitz, Nobel de Economia em 2001, que em seu livro ‘Os Exuberantes Anos 90 – As sementes da destruição’ nos avisou que a década mais próspera da história estava gestando a crise econômica atual.
Só não viu quem não quis ver ou quem pouco ou nada se questionou sobre a veracidade do discurso de certos economistas tão em moda, até o aterrador estrondo da bolha financeira atual.
Franklin Cunha é médico e membro da Academia Rio-Grandense de Letras (franklincunha1933@gmail.com)
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