Etarismo ou ageismo é o preconceito por idade. Ainda que os jovens possam ser discriminados por serem jovens demais, o corriqueiro é as pessoas com idade avançada se sentirem vítimas de intolerância. Paulo Freire dizia que o sonho do oprimido é ser o opressor – quando não há uma educação libertadora das amarras de domínio e poder. Os adultos excluídos ou segregados pelo avanço dos anos acabam por ser aqueles que mais trabalham para parecer com os opressores, ou seja, parecer mais jovens do que são.
O caso das universitárias de São Paulo que ridicularizaram uma colega de sala de aula de 44 anos ao dizer que iriam “desmatriculá-la” porque ela já deveria estar aposentada viralizou em março de 2023 pela internet. A grande repercussão tem pelo menos um diagnóstico social: a idade importa e gera conversação. Se fosse uma questão menor, as falas das jovens teriam passado despercebidas, mas elas também produziram sentido para quem recebeu o vídeo. Na nossa sociedade, idade é identidade e quanto mais jovem, maior o valor.
Como o senhor tempo não negocia nem sequer um instante, o meu tempo de escrita quando você ler este texto será passado – e, claro, eu estarei uns dias mais velha. Assim passa o tempo no nosso passatempo chamado vida: irrefreável. E se o ser humano não consegue parar o tempo, ele trabalha para desafiar e retardar os efeitos da passagem do tempo sobre o corpo e mente humana.
O envelhecimento é pauta em pesquisas, teorias, desenvolvimento tecnológico e na indústria de diversos segmentos. Na área de cosméticos, saúde e beleza, os investimentos financeiros são significativos para sanar as maiores dores humanas: como não envelhecer ou como envelhecer com saúde ou ainda como retardar o envelhecimento. É deste conjunto de perguntas-problema que surgem diversos produtos agrupados na categoria antienvelhecimento.
Preste atenção na palavra: antienvelhecimento. O prefixo é claro porque ser anti significa ir na direção contrária, ser oposição ou simplesmente ser contra. A inteligência, esforço e investimento humanos se movem contra a própria natureza humana como se envelhecer fosse uma questão de opinião: sou a favor ou contra. Não é irônico?
O velho oprimido alimenta o círculo vicioso de combater o envelhecimento para que as novas gerações hoje opressoras se sintam também impelidas a lutar contra a própria natureza quando a idade avançar. São opressores e oprimidos girando na mesma roda do laboratório da vida.
Junto ao investimento em tecnologia, inteligência, processos, inovação, há ainda uma expressão mais dominante na nossa cultura: a construção da linguagem. O termo antienvelhecimento é um exemplo: foi aceito de tal forma na nossa sociedade que poucos questionam o que o seu uso produz de pressão e dominância sobre as pessoas. O natural é atrasar o máximo possível o parecer ser velho porque somos todos contra o envelhecimento. Os textos de revistas, as propagandas na televisão e na internet, a descrição dos produtos nas prateleiras usa o antienvelhecimento como apelo natural. A opressão e o sentido que a palavra exerce sobre os mais velhos não está em questão porque estamos todos aprisionados na linguagem que emerge da cultura etarista.
As jovens de 20 anos são resultado das práticas sociais que aceitam o antienvelhecimento como o motor econômico e estético. Elas erraram e devem ser responsabilizadas, mas esta culpa não é só delas. Elas são resultado da nossa sociedade, dos nossos discursos e da nossa linguagem. O etarismo é culpa dos velhos parâmetros sobre os quais construímos a vida em sociedade.