O PL apresentou na última semana o resultado da auditoria contratada pelo partido para testar a integridade das urnas eletrônicas. O presidente Valdemar Costa Neto e o engenheiro Carlos Rocha, do Instituto Voto Legal, defenderam que os votos de cerca de 193 mil urnas, cerca de 41% do total, sejam desconsiderados pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Até o advogado do PL, Marcelo Bessa, entende o óbvio, que a anulação de votos seria desfavorável a Luiz Inácio Lula da Silva, vencedor da eleição presidencial. Bessa afirmou que, no segundo turno, o petista foi vitorioso nas seções eleitorais onde foram usadas as urnas que, segundo ele, teriam apresentado “inconsistências” (urnas de modelos 2009 a 2015), enquanto Bolsonaro ganhou nas seções que funcionaram com urnas com operação regular (as urnas de modelo 2020).
A auditoria alega que os registros do funcionamento das urnas não mostram o código de identificação correto das impugnadas (um mesmo número aparece em todas elas), o que tornaria “impossível associar o registro de cada atividade ao hardware, ao equipamento físico, que teria gerado aquela atividade, disse o advogado. Para ele, é um indício de mal funcionamento que “gera incerteza” sobre o resultado eleitoral.
Especialistas da área já afirmaram que problemas nessa numeração não têm impacto sobre a apuração dos votos. A identificação individual das urnas pelo TSE é feita pelo programa usado nas máquinas, que garante uma assinatura digital a cada uma delas. Além disso, o cruzamento de outros dados disponíveis nos registros do tribunal permite a identificação de cada urna mesmo sem o número de identificação. As mensagens de erro registradas pelos relatórios do sistema eletrônico, quando algumas urnas travaram, mostram, em cerca de 200 casos, nomes dos eleitores e números de títulos eleitorais. Segundo o advogado, o fato é grave porque significa “violação do sigilo do ato de votar”. Porém, os votos desses eleitores foram revelados nos registros.
O pedido tira conclusões incorretas a partir de dados identificados. O PL questiona, também, a ausência do código de série das urnas no “diário de bordo” desses equipamentos mais antigos. Alega que, com isso, não é possível fiscalizá-las. Há, porém, outros dados e formas para identificar essas urnas. Ou seja, diferentemente da afirmação do parecer, a falha apontada não impossibilita a vinculação do arquivo gerado pela urna (conhecido como log da urna) com sua urna física correspondente.
Na comparação feita por um especialista, é como se um órgão estatal, por um erro, não tivesse em sua planilha os dados do INSS ou de um cidadão. Mas com seu RG ou CPF, poderia identificá-lo. Além disso, o documento do PL possui lacunas ao ignorar o primeiro turno da eleição e a distribuição dos diferentes modelos de urnas dentro de um mesmo estado. No primeiro turno, o PL conseguiu eleger governadores, senadores e a maior bancada da Câmara dos Deputados, e isso não lhe interessa questionar.
Apesar da adesão pública de Bolsonaro ao golpismo, Valdemar Costa Neto procurou ministros do Supremo e do TSE para dizer que só age em razão de pressão do presidente, como contou a jornalista Malu Gaspar, do jornal O Globo. Valdemar Costa Neto chegou a dizer que o relatório de auditoria não expressa a opinião de seu partido. Há quem acredite que Waldemar esteja fazendo jogo duplo, para não atacar sem provas a credibilidade do sistema eleitoral, o que é proibido pela legislação, e ao mesmo tempo agradar ao presidente Jair Bolsonaro e a parlamentares bolsonaristas.
Reação imediata e multa milionária
O presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TSE), Alexandre de Moraes, negou a pretensão do PL e pôs um ponto final na polêmica, em menos de 24 horas. Ele ainda condenou a coligação de Bolsonaro, formada por PL, PP e Republicanos, ao pagamento de multa no valor de R$ 22.991.544,60 por litigância de má-fé. Determinou ainda o bloqueio dos fundos partidários das três legendas até o pagamento da penalidade imposta. Além disso, por entender que na iniciativa encampada pelo PL houve “finalidade de tumultuar o próprio regime democrático brasileiro”, o presidente do partido, Valdemar Costa Neto, será alvo de investigações no STF (Supremo Tribunal Federal) no inquérito das milícias digitais. Depois de declararem que respeitavam a decisão das urnas e que não autorizaram o PL a falar em seus nomes, o PP e o Republicanos foram excluídos da multa por Alexandre de Moraes.
A volta do presidente sumido
Bolsonaro voltou ao seu local de trabalho, o Palácio do Planalto, um dia após o PL apresentar o relatório golpista. Ele não ia ao local desde dia 3 de novembro, em que ficou pouco no palácio. Nesta semana, Bolsonaro chegou por volta das 9h e ficou pouco mais de 5 horas, quando voltou para o Alvorada. Seu único compromisso foi uma agenda com o senador Rogério Marinho (PL-RN), entre 11h30 e 12h. Inicialmente, o encontro estava previsto para acontecer na residência oficial.
Depois, o local foi alterado na agenda oficial de Bolsonaro para atender conselheiros que o recomendaram a “reaparecer”. Agora, parece que a verborragia do chefe do Executivo está contida. Mudou o comportamento após a derrota que parece tê-lo abatido demais. Ele adotou o silêncio depois da vitória petista nas urnas. Os apoiadores, por sua vez, continuam bloqueando rodovias e pedindo intervenção militar para evitar a posse de Lula. As autoridades policiais mantêm uma estranha inércia nessas situações. Bolsonaro criticou as estradas fechadas, mas não desestimulou protestos antidemocráticos contra o resultado eleitoral.
Como um cacoete antigo, um dia depois da decisão de Moraes, Bolsonaro reuniu, na residência oficial no Palácio da Alvorada, os chefes militares: os comandantes do Exército, Marco Freire Gomes, da Marinha, Almir Garnier, e da Aeronáutica, Carlos de Almeida Baptista. Na agenda oficial do presidente, constava apenas uma reunião com o subchefe de Assuntos Jurídicos da Secretaria-Geral da Presidência, Renato França, no Palácio do Planalto. General da reserva e candidato a vice no pleito deste ano, Braga Netto também esteve na reunião.
Quis mostrar força e embutir ameaças?