Resolvi meter a mão nessa cumbuca por aqui provocada pelo jornalista Edu Carvalho ao trazer o assunto à tona na conversa que fiz com a Kika Gama Lobo sobre a vida pós 50 anos, envelhecimento e idadismo para nova temporada do “Pod Entrar”, podcast da Midiosfera: há ou não idadismo com relação a candidatura de Joe Biden à presidência dos EUA?
E aí sempre penso que é importante esclarecer que qualquer pessoa pode ser vítima de idadismo, ou seja estereótipo, preconceito, discriminação com relação a idade. Uma criança, quando é repreendida porque é ignorante sobre um assunto, um jovem, quando não consegue seu primeiro emprego, porque é imaginado imaturo e irresponsável, uma pessoa aos 35 anos, quando é considerada muito velha para o mercado de trabalho, especialmente se for na área da tecnologia. E, conforme envelhecemos esses preconceitos e discriminações só aumentam a carga do idadismo, a ponto de que estudo da Organização Mundial da Saúde – OMS demonstra que uma a cada duas pessoas no mundo é idadista com relação a pessoa idosa. Assim, o idadismo é um preconceito universal que atinge a todos que conseguem o privilégio de envelhecer, desde o homem mais rico do país mais poderoso do mundo até a pessoa mais vulnerável do país mais pobre do planeta.
Mas será que são legítimas as dúvidas com relação ao Joe Biden?
Aqui no Brasil tivemos alguns casos interessantes de políticos com limitações físicas concorrendo em eleições. Um exemplo: quando Bruno Covas, aos 39 anos, concorreu a prefeito de São Paulo em 2020, ele estava em tratamento de um câncer e foi reeleito. No decorrer do segundo mandato faleceu, Ricardo Nunes assumiu a Prefeitura, mas isso já é outra história. Outro exemplo: Jair Bolsonaro, 69 anos, exerceu todo seu primeiro mandato com limitações físicas, precisou fazer várias intervenções cirúrgicas, causadas pelo atentado sofrido durante a campanha de 2018. Tentou a reeleição em 2022 numa campanha acirrada e fracassou. Mas esses são exemplos brasileiros, num contexto cultural diferente. Porém, espero que nos façam refletir e empatizar com a questão.
Não conheço a cultura ou política americana suficientemente bem para me colocar como comentarista política. Mas olhando daqui, quando é questionada a capacidade física do Joe Biden, 81 anos, para reeleição à Presidência dos EUA, penso que a pergunta mais correta é se está sendo relacionada com a idade dele ou não, para saber se ele está sendo vítima de etarismo. Porque, para qualquer pessoa que fosse exercer um cargo de relevância como o da Presidência dos EUA, entendo que agilidade mental, acurácia do pensamento, lucidez, são fundamentais para o seu bom exercício, não importando a idade. Então, se há demonstrações de que pode haver problemas com a pessoa candidata, julgo serem legítimas as preocupações e questionamentos. Mas percebo que inadequadas estão sendo as formas de expressá-los.
O que me causa um tremendo desconforto é a afirmação de que uma eventual condição de demência do Joe Biden é por conta da velhice, porque velhice seria sinônimo de debilidade, fraqueza, adoecimento. Essa associação é idadista, pois conecta uma situação de saúde à idade de maneira altamente negativa, preconceituosa. Os questionamentos passam a ser com relação a idade do candidato e não mais a respeito se ele tem ou não condições físicas como qualquer outra pessoa de qualquer idade teria se apresentados os mesmos sintomas: Está muito velho? Já passou da idade? Parece um avô? (qual é o problema com os avós?)
E por isso trago um terceiro exemplo, o do nosso atual presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, 78 anos, independente, lúcido, cheio de energia a ponto de realizar uma agenda de trabalho invejável. Já passou por um câncer de laringe, tem suas limitações físicas, mas demonstra vigor e saúde física, emocional, mental. Provavelmente você também conheça pessoas das suas relações, ou políticos, vereadores, prefeitos, deputados, senadores que são pessoas idosas, e observará que não é a idade que faz a diferença nas suas atuações.
Sabemos que já nasceu a geração que viverá até os 150 anos. Isso é a longevidade, tempo de vida. Lá nas décadas de 50/60 uma pessoa de 50 anos era uma “velhinha”, hoje está na plenitude da vida. Isso foi uma conquista.
Fazer da fase da velhice um tempo de qualidade pelo maior tempo possível. Porque na velhice nosso corpo enfrentará mudanças típicas desse momento da vida, nossa saúde se fragilizará, iremos encontrar mais limites e barreiras. Tomara todos tivéssemos um envelhecimento suave, leve, um declínio quase em linha reta. Pra ficar ali, até o final com um sorriso no rosto.
Mas há aquele envelhecimento, mesmo que longevo, sem a mesma qualidade, onde em vez de declínio, observaremos a decadência da pessoa idosa querida. Aquela linha da vida se torna uma montanha russa com subidas e descidas. Com cada vez mais descidas.
Em que tipo de velhice Joe Biden se encaixa? Sinceramente, não faço ideia. Deixo essa questão para seus médicos e família. Desejo sua saúde. God Bless America.
Foto da Capa: Casa Branca
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