Hoje volto a falar de um artista que conheci criança e que conquistou o mundo com sua arte espalhada por muros e paredes. Sua trajetória ousada espalhou-se do Ocidente para o Oriente. E da imersão no Oriente Médio, que conhecemos tão pouco, nasceu O Islã e a Maçã (Pubblicato Editora, 2024), um livro que acompanhei desde o início. Revisei, participei de reuniões e troquei ideias com o autor e o editor. A jornalista Eliane Brum escreveu um prefácio, eu outro, e Rosina Duarte, mãe do Amaro, o posfácio. A foto da capa é de Nair Benedicto. Diagramação e edição de Vitor Mesquita, da Pubblicato Editora. A poeta egípcia Amar Al Qady também participa. O livro tem um primeiro lançamento no dia 2 de maio na ALICE – Agência Livre para Informação, Cidadania e Educação, especial para as pessoas que adquiriram na pré-venda e contribuíram com a edição.
Imaginem a emoção quando coloquei as mãos no livro impresso
Na introdução, Amaro escreveu – “Importante dizer que houve duas sementes que me fizeram decidir com convicção contar todas essas histórias. O livro autobiográfico da amiga jornalista Lelei Teixeira “E fomos ser gauche na vida” e o livro que Andressa Brzezinski me deu, “Infiel – a história de uma mulher que desafiou o Islã”, de Ayaan Hirsi Ali. E aí dou total razão à Rosina Duarte – “Lelei e Amaro são um caso destes que chamam irmandade de almas, afinação cósmica, sei lá. Ele era um piazinho com dentes de leite quando a conheceu em uma Feira do Livro. ‘Os olhos dela parecem um aquário cheio de peixinhos’, me disse o guri, nascido sob o signo de Aquário. Talvez tenha guardado este lindo olhar na memória durante anos e muito, muito tempo depois, ambos se reencontraram pelos caminhos da vida passando a compartilhar uma profunda parceria. Gracias por tudo, sempre, Lelei querida”. Quem agradece sou eu!
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Amaro é formado em Artes Visuais e trabalha desde 2006. De um jeito muito peculiar desenha pelos espaços urbanos. Cria paisagens em um planeta desconhecido, onde plantas e seres evoluem em harmonia com a natureza. Pelo Brasil, lá no início, sua exposição Vida Paralela passou pela Galeria Mario Quintana/Porto Alegre, pelo Instituto Goethe/Salvador e pela Jeffrey Store/Rio de Janeiro. Também deixou seus traços em muros e paredes de Santa Catarina e São Paulo, Em 2016, publicou “Habitat” (Editora Libretos), um livro muito bonito que traz desenhos instigantes e alguns textos. Fui uma das pessoas convidadas para escrever, o que fez com que eu me aproximasse ainda mais dele. Hoje somos muito amigos.
O que dizem os seres criados por Amaro? “Dizem de nós, tão coletivos e tão solitários nessa caminhada frenética em busca de um final feliz”.
Para além das nossas fronteiras, Amaro pintou e participou de eventos em países da América do Sul, Europa e Oriente Médio, inclusive no Muro de Berlim. Em 2015, passou um período no México para conhecer a região e fazer contato com artistas locais. Em 2018, esteve em uma residência no Oriente Médio. Andou pelo Egito, Líbano, Síria e Índia. Nesta jornada inquietante, participou da Bienal do Cairo, realizou oficinas, fez palestras, pintou no campo de refugiados palestinos Nahr al-Bared e foi para as ruas com o objetivo de conviver com a população e entender um pouco mais aquele universo que o impressionou muito. E assim foi nascendo o livro que lança agora.
Vivências sempre são fontes de inspiração para Amaro
O reconhecimento da sua produção artística pela Artmossphere Biennale, realizada em Moscou/Rússia, um dos principais eventos internacionais de arte, foi um grande impulso. Amaro foi o único brasileiro entre os 48 artistas selecionados para a edição de 2023. No júri, integrantes de grandes museus como o de Arte Moderna/Momma de Nova Iorque. Em seguida, inaugurou a exposição Vida Paralela na Galeria Jóia, em Lisboa/Portugal.
Com lápis, tintas, sprays, nanquim, aquarelas, fantasias e desejos, Amaro cria seres e paisagens inusitadas a partir de um olhar sensível e crítico. Sua arte atravessa fronteiras. Está em muros, paredes, painéis, exposições, pulsando em todo lugar. Das suas mãos brotam desenhos que falam da vida vertiginosa que levamos, do que nos ampara no dia a dia, das relações que nos acolhem, das nossas fragilidades, sonhos e diferenças, da urgência de atitudes para proteger o meio ambiente.
O que dizem esses seres circenses e melancólicos, brutos e lúdicos, enraizados e soltos, frágeis e fortes que desenha? Saltitantes, voadores, lisérgicos, à beira do abismo, amordaçados, à espreita, despedaçados e inteiros, ingênuos e intrépidos, suaves, carnavalescos, de olhos arregalados, inconstantes e genuínos na sua adorável imperfeição? Dizem de nós, seres fragmentados, assustados, urgentes, às vezes dilacerados, sonhadores, felizes e infelizes que somos. Humanos! Dizem dos outros que nos habitam. Revelam nossas tantas faces, nossos sentimentos divididos diante de um mundo multifacetado e sedutor, encantador e cruel, que descobrimos e construímos, exploramos e destruímos. Reconstruímos? Habitável?
“A verdade é que estamos acabando com o ar que respiramos, envenenando a comida que comemos, poluindo a água que bebemos e destruindo o solo onde plantamos”. “O ser humano conseguiu a façanha de ser a espécie mais inteligente e mais burra ao mesmo tempo”.
Dizem da nossa frágil condição e das vidas paralelas que tentamos equilibrar. Dizem da nossa coletividade e da nossa solidão nessa caminhada frenética em busca de luz, harmonia e ar puro para respirar profundamente.
* Atualização de um texto que escrevi em 07 de junho de 2023
Foto da Capa: Reprodução da Capa do Livro
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