Pesquisei no Google alguma entrevista ou trabalho sobre Dorival Caymmi. Encontrei uma em que ele dizia procurar para suas composições as palavras mais simples, mais doces, que pudessem ficar com as pessoas depois que ouvissem. Seu ideal era compor algo como Ciranda, cirandinha. Algo que todo mundo pudesse cantarolar.
De fato, algumas das suas músicas são parte da memória brasileira. “Eu vou pra Marcangalha, eu vou…”. “O que é que a baiana tem?”. “Quem não gosta de samba/bom sujeito não é/É ruim da cabeça/ou doente do pé”. Entre outras que todo mundo quando ouve logo sai cantando.
Gosto muita da sua capacidade de fazer letras pequenas, de poucos versos: “Só louco amou como eu amei/Só louco quis o bem que eu quis/Oh, insensato coração/por que me fizeste sofre?/Por que de amor para entender/é preciso amar?/Por quê?/Só louco.”
Em outra entrevista que vi, essa já faz mais tempo, Caymmi fala de um amigo que conheceu na pensão em que foi morar no Rio de Janeiro. Seus pais pagaram para Dorival estudar a preparação para ingressar na faculdade de Direito, na então capital do Brasil.
O colega de pensão era um sujeito com muita leitura, conhecedor de música e artes. Meio quieto e distante, acabou se aproximando do jovem baiano, pois, afinal, havia entre eles algumas afinidades, como perceberam em algumas conversas esporádicas no refeitório.
Numa visita do amigo ao quarto de Caymmi, ouviu composições, ainda totalmente desconhecidas, como É doce morrer no mar, No tabuleiro da baiana e mais algumas outras que anos mais tarde viriam a ser sucesso nacional e internacional.
Depois de escutar, incrédulo, o amigo perguntou se aquelas canções eram mesmo de Caymmi. Com a resposta positiva, perguntou o que ele tinha mesmo vindo fazer no Rio. A resposta foi estudar para ser advogado. O amigo falou que achava que Caymmi não iria conseguir ser advogado, porque, com aquelas músicas e com a vida cultural, noturna e boêmia da cidade, certamente teria outro rumo na vida.
A visão estava totalmente certa, mesmo que, na hora, tenha parecido a Caymmi meio absurda. Um tempo depois, o destino, e, claro, os caminhos do desejo e do inconsciente se encarregaram de fazer o que devia ser feito. Uma de suas canções sobre o amor pode valer também para ilustrar sua trajetória e para o amor que os brasileiros têm por Caymmi: “Não fazes favor nenhum em gostar de alguém/Nem eu/Quem inventou o amor não fui/Não fui eu nem ninguém/O amor acontece na vida/Estavas desprevenida/E por acaso eu também/Mas como o acaso é importante, querida/De nossas vida, a vida/Fez um brinquedo também”.
Sim. O acaso é importante. E não fazemos favor nenhum em gostar de Dorival Caymmi.