O fato ocorrido com a Ministra do Meio Ambiente e do Clima, Marina Silva, no Senado Federal, em pleno dia da Mata Atlântica, 27 de maio, merece e precisa ser analisado por distintos ângulos. O que aconteceu com ela foi muito além do desrespeito a uma mulher negra com trajetória ilibada.
Os senadores que disseram o impensável seguem a linha do presidente dos Estados Unidos. Já pensou se esse modus operandi pegar por aqui? O que aconteceu à ministra foi um ataque a todos e todas que defendem o artigo 225 da Constituição, que é o que assegura que todos têm direito ao ambiente equilibrado.
Eu fiquei extremamente incomodada. Assim que o fato ocorreu, um colega jornalista de atuação nacional me mandou a notícia. E, mais uma vez, percebi o quanto esses tempos exigem estômago de avestruz, ou seja, precisamos aprender a como conseguir sobreviver diante de tantas insanidades.
Acompanho, desde o século passado, o quanto setores difundem o discurso de que a proteção ambiental entrava o desenvolvimento, o quanto o licenciamento ambiental e as Unidades de Conservação sofrem com a visão tacanha. Quem tem um pouco mais de meio século deve lembrar do que foi Cubatão em São Paulo, ou do cheiro que vinha da Borregard, na Zona Sul de Porto Alegre, quando não se tinha controle ambiental por parte do Estado. O que os parlamentares querem fazer é nos deixar ainda mais suscetíveis às mudanças climáticas. E eles ignoram solenemente o que a região Sul vem atravessando com desastres.
O jeito trator de esteira dos nada ilustres senadores é o suco, ou melhor, o óleo essencial dos valores dos mesmos congressistas que querem destruir o Sistema Nacional do Meio Ambiente, através da aprovação do PL 2159, também conhecido como PL da devastação. A ministra estava na Comissão de Infraestrutura do Senado a convite dos próprios parlamentares e foi recebida com grosserias e insultos enquanto ela tentava explicar o projeto de criação de Unidades de Conservação marinhas na costa do Amapá.
Em 2016, eu coordenei a produção e a edição da publicação Projeto Gestão de Florestas do Amapá – Experiências, Oportunidades e Desafios. A publicação, depois que ficou pronta, não foi disponibilizada pela administração estadual. Tirem suas conclusões. O Amapá é um dos estados brasileiros de maior biodiversidade e com diversos tipos de áreas protegidas e Terras Indígenas. O governo federal quer implementar Reservas Extrativistas, ou seja, um tipo de UC de uso sustentável, pois há muitas comunidades de pescadores que dependem da natureza para sobreviver.
A jornalista Vera Magalhães, em sua coluna no Globo, destacou que foi construída uma armadilha para Marina, a reboque da aprovação do PL da devastação. Se você não tem muita ideia do que isso significa, informe-se minimamente do que prevê esse projeto, que flexibiliza muito a legislação ambiental. Pesquise, tem tudo a ver com o seu futuro, com o de seus filhos e netos.
No domingo, dia 1º de junho, haverá mobilizações em várias cidades contra esse PL. Em Porto Alegre, a concentração será nos arcos do monumento do expedicionário, na Redenção, às 10h. Estarei lá!
Meandros da comunicação
Na semana passada, de 19 a 22 de maio, participei do XIX Congresso Brasileiro Científico de Comunicação Organizacional e Relações Públicas, promovido pela Associação Brasileira de Pesquisadores de Comunicação Organizacional e de Relações Públicas (Abrapcorp). Esta foi a primeira edição do evento com tema principal sobre risco.
Assisti a vários painéis, apresentação de trabalhos, conheci gente de cantos diferentes do Brasil e aprendi muito. Serviu para me situar um pouco no meio desse universo onde academia, mercado, influenciadores, órgãos públicos e empresas forjam o que rola dentro e fora das telas.
Foi um debut para mim que tenho vivido as dores e as delícias de ser jornalista, empreendedora e pesquisadora independente. Cada vez mais precisamos sair dos nossos cercadinhos e procurar compreender outros sistemas. Ouvi “pérolas”, tipo: as universidades estão no século XIX, os professores no século XX e os alunos, no século XXI. Muitos estudantes podem dominar a técnica, mas estão longe de ter conteúdo consistente e noção de responsabilidade do que espalham. O problema é que o nível do público é tão baixo que aceitam qualquer coisa.
Outra frase que me marcou foi atribuída a Jacques Lacan: “Não podemos estar tiranicamente atrelados ao capital. Podemos estar atrelados, mas não tiranicamente,” comentou o professor Rennan Mafra, da Universidade Federal de Viçosa. Ele explica que Lacan trouxe essa reflexão não apenas em relação ao capital, mas também na nossa relação com o outro. A grosso modo, para ele, um processo de análise nos ajuda a não ficarmos tiranicamente submetidos a esse outro (mesmo sabendo que a não submissão total e absoluta seria impossível). No contexto da fala, ele se referiu aos capitais dessas empresas de tecnologia. Aliás, fiz uma entrevista com ele no meu insta, clica aqui para conferir, ele contou algumas inovações que a UFV tem feito em extensão.
Tipos diferentes de debates e apresentações foram realizados. Hoje está muito mais difícil trabalhar com comunicação nas organizações do que quando trabalhei em governos e ONGs. Quem está na labuta é provável que esteja com problemas de saúde e sem tempo para nada de tanto trabalhar. O zap, as redes sociais, a instantaneidade da internet exigem de quem se preocupa com a reputação e o atendimento às demandas. A propósito, quem mesmo se beneficia com tantos avanços tecnológicos?
Por fim, encerro defendendo a regulamentação das redes sociais. E o ponto central do debate precisa incluir como se estabelecem os algoritmos. Por que alguns conteúdos viralizam e outros não? O único interesse das big techs é com o lucro e não interessa se está jorrando mentiras e desinformação. Um exemplo citado no grupo de trabalho sobre Comunicação Pública e Comunicação de Risco foi o caso da bruxa do Guarujá, onde uma mulher foi espancada até a morte porque foi confundida com uma suposta sequestradora em 2014. Em todo momento, o Facebook lucrou: quando espalharam a mentira, quando se comentava o episódio e o pós-evento. Ou seja, para eles, não há interesse algum em regulamentar a desinformação.
Estamos diante de situações em que os parlamentos das três esferas estão repletos de representantes que estão longe de defender o bem comum, o melhor para nosso convívio integrado à natureza. A sociedade, ou pelo menos quem tem a noção do que significa o que estamos atravessando, precisa agir, nem que seja conversando com o vizinho, com um amigo, sobre as atrocidades que têm acontecido. Se hoje está assim, imagina para as próximas gerações.
Confiram as entrevistas que fiz com pesquisadores no Insta.
O papel da comunicação no enfrentamento às Doenças Tropicais Negligenciadas:
Uma análise das campanhas de saúde no Brasil (2021-2025)
Ramirio Costa Ribeiro, Luciana Saraiva de Oliveira Jerônimo e Melissa Silva Moreira Rabelo (UFMA)
Comunicação pública de um Hospital Universitário Federal frente à epidemia de acidentes de transporte terrestre no Vale do São Francisco
Mateus Gonçalves Ferreira dos Santos e Williany Bezerra de Souza (UNIVASF)
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Todos os textos de Sílvia Marcuzzo estão AQUI. Foto da Capa: Frame/COP28/United Nations Climate Chang