Existe uma profusão de conteúdos sobre autocuidado nas redes sociais, e uma narrativa ligada ao autocuidado com cuidado de beleza, tempo para um skincare, rituais em frente ao espelho e imagens de influenciers se admirando com cremes como numa seita de caras besuntadas. Ok, fui um pouco ácida. Mas já parou para pensar no significado e importância do autocuidado, além da estética e dos cremes?
Pensando, me vem a cabeça que autocuidado está relacionado a tempo investido em si para se tornar uma pessoa melhor do ponto de vista emocional, físico, intelectual, social e humano. Autocuidado é um universo que precisa ser gerenciado como um ecossistema fluido onde o tempo para si é o eixo central.
Vamos a exemplos. Em um mundo onde o tempo virou um ativo econômico vendido em horas de trabalho ou investimento de tempo para executar projetos que rendam dinheiro, sobra pouco tempo para viver. Muitos pensadores já dizem que riqueza de verdade é você ter tempo para viver com os recursos necessários. Então, tempo para nós meros mortais trabalhadores é ouro. E tempo para nós é a riqueza máxima. Mas ter essa noção precisa de uma longa caminhada de desenvolvimento de consciência, e colocar o foco em si, uma das coisas mais difíceis no mundo em que vivemos. Onde temos uma cultura de atender o foco no outro.
Então o skincare, em casa, vira sinônimo máximo de autocuidado, porque o “se cuidar” é atender este foco na estética que vem de mim para que eu após o meu skincare esteja mais bonita, esteja com o externo cuidado. E nem precisa muita filosofia para chegar neste sentido, pois afinal a pele humana é o maior órgão externo da nossa individualidade biológica. E o autocuidado com o nosso interno? Indo além dos treinos, da medicina, quando cuidamos dos nossos sentidos, exercitamos nossas sensibilidades, investimos tempo em fruição e tempo para sentir, pensar e fruir com liberdade?
Este autocuidado é o mais raro pois está ligado a outro exercício, o da sensibilidade artística sensorial, visual, auditiva, e a se permitir ser tocada de maneira não lógica, através de fruição, não controle e curiosidade. Tem a ver com a nossa criança interna independente da idade, de continuar descobrindo o mundo, perguntando os porquês, tendo coragem de fazer descobertas. Por exemplo, muitas das vezes que viajamos entramos neste estado de liberdade, observação, de admiração, de curiosidade e vivência do presente.
Porém, mesmo em viagens, muitas pessoas não conseguem e se vive mais um pesadelo de exteriorização do que de interiorização. Sempre penso que a culpa não é da tecnologia, mas sim dos nossos estado mentais, emocionais que nos fazem ir sempre para fora do que para dentro.
Mas o que um rolê aleatório tem a ver com isto? Primeiro, acho que devo explicar o que é um rolê aleatório para mim … Rolê é uma gíria brasileira, já um pouco antiga, que significa dar uma volta, um passeio. Se ele for aleatório, significa que é um passeio sem roteiro preestabelecido onde você vai deixando fluir as conexões e sendo levado pelos movimentos como os franceses dizem do “flanar “se apropriar do espaço público para descobrir lugares, sentar em cafés, conhecer pessoas, sair de um lugar para o outro com tempo, sem pressão de agenda e compromissos preestabelecidos.
O rolê aleatório flui e se você se permitir e for curioso vai viver momentos novos e criar boas memórias. Para isto, você precisa se permitir não ficar cuidando o tempo, mergulhar nas experiências e se abrir para se conectar. Bons rolês aleatórios acontecem em cidades e lugares pulsantes, em geral de arte, cultura, inovação e diversidade. E a qualidade do rolê aleatório está nas pessoas, em suas aberturas. Rolês aleatórios para mim é um dos skills de bons viajantes, de aventureiros e de artistas.
Rolê aleatório é o ápice do autocuidado mental, pois você sai da ditatura do tempo e da organização preestabelecida para se jogar para viver sentindo. Quando entro em modo de role aleatório é difícil me parar, e viro a inimiga do fim por uma simples e boa razão: é uma sensação de liberdade incrível.
Como são os últimos dias de janeiro, eu desejo a você que está lendo esta coluna, nesta segunda feira, que em algum momento deste ano você possa se permitir fluir sem tempo, em algum lugar fazendo o seu rolê aleatório na montanha, no mar, na cidade, ou apenas deitada na sua cama. Um tempo para si, para sua sensibilidade e pensamentos, sendo livre. Vai fazer um bem danado no seu autocuidado.
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