O Mestre Luis Fernando Veríssimo gosta de falar que “como dizem que disse o Mao Tsé-Tung” é cedo para falar sobre as consequências da Revolução Francesa.
Se o nosso cronista maior via nisso uma concepção de tempo diferente dos orientais ou que a história se rege por outra temporalidade, hoje, afirmo sem medo do erro: a Revolução Francesa ainda não acabou.
A mensagem revolucionária, vinda do Iluminismo, de uma sociedade baseada na Razão e no humanismo, onde todos nascem livres e iguais, prevaleceu no Ocidente. A esquerda perguntou quem são esses “todos” (e as todas? e os todes? e os que não são brancos e cristãos?) e lutou por uma sociedade em que a igualdade não fosse apenas formal.
Já a direita, sempre criticou a retirada de Deus da esfera pública e se agarrou na liberdade, do lema complementado pela igualdade e fraternidade. Mas, em tempos de crise, os reacionários muitas vezes tomaram o poder, mandaram a liberdade às favas e dispararam contra a herança de 1789, evento odiado por Mussolini & cia.
Nas últimas décadas, a extrema-direita se tornou uma espécie de pária política ao ser (corretamente) responsabilizada pela morte e destruição causada pelo nazifascismo na Segunda Guerra Mundial. Depois, foi sufocada pelos anos de crescimento econômico contínuo que duraram até a crise do petróleo. Governos nacionalistas e autoritários, só no Terceiro Mundo, onde era tiro, porrada e bomba, conforme canta Valeska Popozuda.
A crise financeira de 2008 impulsionou a extrema-direita, fazendo com que a política e os eleitorados de diversos países cedessem aos fanfarrões que clamavam por “Deus, Pátria e Família”, lema que havia sido gritado por Mussolini, Salazar e o integralismo um século antes.
A onda chegou ao Brasil, que também elegeu um presidente extremista que disparava contra as minorias, os direitos humanos e demais conquistas civilizatórias que levam diretamente à Revolução Francesa e suas contemporâneas. Seus ministros e assessores, ao cometer divagações mais ideológicas, não disfarçaram seu objetivo de avançar contra o legado iluminista.
Tomemos como exemplo o chanceler Ernesto Araújo, discípulo de Olavo de Carvalho, cuja obra inspira o atual governo, inclusive na obsessão por palavrões e pelo cu alheio (e eles adoram essa palavra).
Araújo detesta a Revolução Francesa, aquele “momento tenebroso” em que intelectuais sedentos por poder traíram o povo ao adotar a República e desrespeitar “a fé e a monarquia francesa”. Culpa, dentre outros, de Voltaire que era um “lacrador”, segundo ele, e do Iluminismo que rejeita e abandona “o passado, os heróis, a fé e a família” afastando o ser humano da fé e da “verdade”.
Um dos grandes problemas do Iluminismo, para eles, é a secularização e o Estado Laico. Os pensadores ultraconservadores chamam isso de “abandono de um legado” e, como disse Bolsonaro: “Essa historinha de estado laico, não. Este é um estado cristão”. Afinal, se os nazistas diziam “Alemanha acima de tudo”, sua versão tupiniquim acrescenta: “Deus acima de todos”.
Então, voltando à frase atribuída a Mao Tsé-Tung, talvez seja muito cedo mesmo para avaliar os efeitos da Revolução Francesa, já que ela ainda não terminou, e a próxima batalha será na esquina da sua casa.
E você?
Quer viver no século XXI ou prefere voltar para o século XVIII?
Às urnas, cidadãos!