O COVID-19 nos coloca contra a parede. É uma crise global que nasce da expansão dos impactos humanos sobre o planeta, se espalha pelas veias abertas da globalização e nos força a considerar nossos valores mais profundos, como o direito à vida. Eu pesquiso sobre os efeitos de crises globais nas cidades, como a mudança climática e a pandemia de COVID-19 no Centro de Pesquisa das Ciências da Terra e Sustentabilidade da Universidade de Hamburgo. Também sou membro do POA Inquieta desde 2019 e gostaria de te convidar, leitor, para uma reflexão sobre o futuro de um planeta incerto, mas cheio de riscos.
Os erros e acertos durante a pandemia falam muito sobre nossa capacidade de colaborar, de criar soluções em conjunto, de tolerar as diferenças e de usar a ciência e a informação como base para decisões nada simples. Infelizmente, o Brasil se destacou como um dos países com pior desempenho. Tivemos um número de mortes absurdo e desnecessário, apesar da ampla experiência que o país contava em conter a epidemia de HIV/AIDS e nossa capacidade de vacinação em massa em um sistema público, gratuito e universal de saúde. Além disso, o país sofreu econômica e socialmente. O aperta e solta das regras de contenção não poupou a economia dos choques internos ou externos. A falta de políticas sociais de amparo catapultou milhares de famílias para a condição de miséria, com muitas delas tornando-se sem-teto e passando fome. As gerações futuras pagarão esse preço.
Olhando para o futuro, novas crises nos aguardam, infelizmente. O país e o mundo não limitam suas emissões de gases causadores do efeito estufa e o planeta se aquece. Segundo o IPCC, painel da ONU para as mudanças climáticas, nossa região sofrerá efeitos graves como aumento das chuvas torrenciais, secas mais longas e severas e até mesmo a savanização da Amazônia.
Como queremos enfrentar essas crises? Durante o COVID, muitos fecharam os olhos e outros fecharam-se em si mesmos, esquecendo que são parte da sociedade e que não conseguem passar ilesos quando todo mundo estiver sofrendo. Se formos seguir este exemplo no futuro, ficaremos mais pobres, mais desiguais e graves crises sociais são prováveis.
Temos um outro caminho: podemos apostar no desenvolvimento sustentável e na cooperação. Podemos prevenir perdas futuras virando a chave das energias renováveis, investindo na produção agrícola ecológica, por exemplo. Podemos também apostar nas comunidades periféricas como fontes de capital humano e expertise em resiliência: quem vive com salário-mínimo é mestre em fazer muito com menos. Podemos apostar num SUS forte, que cuide do todo da população brasileira. Podemos promover cidades que cresçam juntas e justas, promovam oportunidades para trabalho, educação e bem-estar. No todo, apostar que juntos somos mais fortes.
No Antropoceno, novas crises nos aguardam. O business as usual por vezes egoísta e egocêntrico que fizemos até aqui não nos ajudou. Se o COVID nos ensinou alguma coisa, é que é preciso mais ambição para fazer junto ou sofrer mais, sozinhos.
Alexandre Pereira Santos é planejador urbano e doutorando em geografia na Universidade de Hamburgo. É membro do POA Inquieta desde 2019 e articula o grupo Arquitetura e Urbanismo.