Antes de mais nada preciso fazer uma confissão estratégica kkk eu não era fã da Xuxa. Ao contrário ficava infernizando minha irmã para que lesse um livro, e ela como boa ariana me mandava longe, colocava a TV no volume máximo e cantava “Lua de Cristal” … só de lembrar dá um quentinho no coração e começo a rir só desta memória.
Hoje me arrependo de naquela época eu estar tão fixa em me tornar uma intelectual (que coisa mais idiota, mas a adolescência é assim), pois devia ter dançado mais frente da TV, cantado “Lua de Cristal” e sonhado em embarcar na nave da Xuxa. Mas, além de estar focada em ler livros para além da minha idade e maturidade, até me parecia que a Xuxa era OVER, aquele cenário, o jeito dela com as crianças, as paquitas, aquelas crianças em histeria querendo tocá-la, conhecê-la.
Xuxa sempre foi um fenômeno midiático: mostrou que existia um mercado latino, e não saía da revista Caras por seus namoros com Pelé, Ayrton Senna, sua mansão, sua alimentação vegana, sua relação com Marlene e uma suposta relação lésbica, e assim por diante.
Eu era pelo jeito hater da Xuxa pois não perdia uma notícia, mas não dava o braço a torcer kkk.
O mundo se transformou. Xuxa saiu de cena. Minha irmã começou a amar as Spice girls. Eu já era jovem universitária e perdi o foco em ser hater da Xuxa. E não é que muitos anos depois Xuxa ressurge na mídia potente explorando sua maturidade, dando entrevistas transgressoras falando de liberdade sexual, de envelhecimento, de tudo que passou no passado e de como encara a vida hoje: no mood máximo de uma ariana.
Tenho falado sobre etarismo desde 2018, mas hoje resolvi dar uma checada na # no Instagram e achei 20 milhões de conteúdos. Ou seja, o assunto explodiu. No dia pós a entrevista da Xuxa no Saia Justa do GNT vi um vídeo do perfil 50emais:
“Muita gente em choque com o envelhecimento da Xuxa.
O que que isso significa?
Isso significa primeiro que a gente vive numa sociedade etarista.
O espanto com o envelhecimento de qualquer pessoa e o fato de a gente precisar ficar ali no canto falando: nossa, tal pessoa envelheceu. Nossa, você viu como ela está velha, tá caída. Isso se chama etarismo. Uma sociedade que valoriza a juventude e que pontua as pessoas socialmente quanto mais jovens elas aparentam ser. Uma sociedade etarista condena as pessoas que envelhecem ou que não fazem subterfúgios para mostrar que estão envelhecendo. E que vai eclipsando a importância e visibilidade das pessoas quando elas vão envelhecendo. Sabe o que é isso? Isto é uma dificuldade que nós temos de lidar com o nosso envelhecimento. A partir do momento que olhar para a Xuxa ou quaisquer outras pessoas sob os holofotes: É o tempo passa para ela. Isto me ajuda dizer… ele também passa para mim. E cada um desta sociedade pode estar mais em paz com o processo natural de envelhecimento.”
No perfil da @eucrisguerra não aparece o nome do autor do vídeo, mas me parece um psicanalista fazendo uma análise didática sobre o impacto de uma personalidade midiática como a Xuxa aparecer em público sem subterfúgios de esconder seu envelhecimento. Polêmica, sendo estratégia de marketing ou não, para colar na narrativa emergente contra o etarismo, Xuxa faz um favorzão de levantar esta bola comemorando com toda exposição seus 60 anos no próximo dia 27 de março.
Estes dias, lendo um relatório de tendências, li que a influência prateada cresce de forma exponencial trazendo novas vozes para discutir, refletir e mostrar uma sociedade que envelhece sobre outros parâmetros. O sinal mostrava o nicho de influência prateada na Ásia, onde há movimento de mulheres 60+ vivendo suas vidas, se descolando de comportamentos como ser a “avó “como papel social.
Mas, na realidade, mais que falar de economia prateada e seus desdobramentos e temos vários especialistas já aqui no Brasil, me preocupo em buscar desconstruir o etarismo no cotidiano, na vida e na boca das pessoas comuns. Vi um post no TikTok que dizia: “As de 20 me chamam de velha com 30. Mas saem com os homens de 50.” Então saiba que este pequeno post diz muita coisa: além de etarismo, isto é o machismo puro se reproduzindo nas gerações mais novas.
Que bom que a Xuxa vai comemorar seus 60 anos com muito alarde, pois assim é possível puxar o tema e descontruir mais um pouco esta sociedade que está estruturada para excluir. E, lembrando disto, está acontecendo, em Austin, o SXSW 2023, com a comunidade de futuros do mundo e a fala de Douglas Rushkoff que é um teórico de mídia americano, escritor, colunista, palestrante, romancista gráfico e documentarista. Ele é mais conhecido por sua associação com a cultura cyberpunk inicial e sua defesa de soluções de código aberto para problemas sociais:
“É preciso desnaturalizar o poder: construções sociais não são leis da natureza, foram criadas por um grupo de pessoas para atender a necessidade de um momento histórico.”
Então, balança Xuxa… fala bem direto sobre tudo que você quiser. Porque se a gente balançar bastante estes padrões vão mudar.