Então foi Natal e já avançamos os primeiros 13 dias do ano. Por enquanto, temos uns dez meses pela frente sem pensar no dono do saco vermelho. Agora ficam as dívidas e as dúvidas sobre os êxitos e desafios do novo ano.
Apesar disso, Santa Klaus, esse redneck rico e seletivo, em qualquer época, é o contraponto de tantas pessoas vulneráveis e carregadoras de sacos, de todas as idades. Pessoas que vemos todos os dias nas grandes cidades. Gente com fome, com vontade de tomar um banho decente, sentar numa cadeira confortável, dormir bem e receber um olhar que não seja condescendente. Em vez de almejar um presente a mais, essas pessoas têm um saco cheio – aqui sinto cheiro de duplo sentido – de tudo o que puderam ter, quer dizer, quase nada.
No meu tempo de infância e, ainda antes, alguns pais e mães insistiam em aterrorizar as crianças com as histórias do Velho do saco. Lá em casa, esse conto, por sorte, não circulou, mas deixou efeitos em colegas e amigos que me contaram. Quero crer que hoje já não se usa mais esse artilugio para desestimular os pequenos a sair de perto. Sei que, às vezes, difícil mesmo é convencê-los a sair, já que as telas são os grilhões modernos. Havia ameaças ainda mais disparatadas, mas melhor nem dar ideias. Que as ruins morram por seu próprio peso.
Na verdade, nossas tecnologias são mais perigosas, mas insistimos em deixar correr solto tudo o que nos faz mal. Nossos impulsos autodestrutivos nos colocam em bretes de lógicas de consumo que consomem mais rápido o nosso tempo, dinheiro, inteligência e esperança. Esse consumo incessante em parte é porque algo em nós sabe exatamente o que está no fundo do saco. E haja antidepressivo para amortecer ou esquivar essa realidade.
Assim como o velho do saco da ameaça familiar, também o Grinch visita a nossa imaginação infantil. No entanto, essa figura estraga prazeres pode ser menos nociva do que aparenta. O Grinch surge como a amargura do Natal, mas também se converte em um alerta para a futilidade excessiva da data. Nossos medos e aversões, via de regra, são excelentes recobrimentos de nossos desejos, às vezes tão ou mais infinitos e sem fundo como o saco do papai Noel.
Esse lado B do Natal, o Grinch, nos lembra que todos somos feitos de um saco um tanto vazio, borocochô. Ele também traz a recordação de que, por vezes, é humano estar de saco cheio, no pior dos sentidos. Feliz desNatal!
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Foto da Capa: Divulgação