A pergunta mais frequente agora pós SXSW é: resuma em uma frase o que você viu, ouviu, aprendeu, entendeu sobre o futuro no SXSW? E a minha resposta vai ser a do tamanho de um slogan: Abrace o desconforto, somos a geração T. A geração da transição de um mundo e modo de viver onde criamos tecnologias para ganhar dinheiro, otimizar e automatizar processos vivendo como se a conta nunca fosse chegar, e ela chegou. Já está no presente, como bem escreveu a maravilhosa Beatriz Guareshi em artigo: “Não precisamos olhar para a frente para enxergar a complexidade. O presente já está cheio de desafios, e a solução não vai aparecer pronta – nem em uma palestra do SXSW, nem no report da brilhante Amy Web, muito menos em um newsletter semanal.”
Mas, então, trazendo este desconforto que foi acelerado em 8 dias, entre keynotes, features speakers, painel, meet ups – onde eu mesma organizei e mediei uma conversa sobre o case da Beyonce no Brasil, com as deusas Potyra Lavor e Amanda Graciano – e tive a oportunidade de interagir de forma privada com dois dos mais balados speakers Rohit Barghava e Neil Redding, o que ficou de tudo isto?
1- Perspectiva de crise global sem precedentes provocada pela IA, a grande trilha do SXSW nos palcos e nas conversas: a síntese da abordagem nas palestras são as convergências e funcionalidades geradas pela aplicação de tecnologias diversas. Neil Redding aborda isto construindo uma equação entre humanos + IA + Computação quântica. Mas se somam as abordagens de sensorização, a internet de todas as coisas e dados que vão possibilitar o avanço de tudo que existe hoje como educação, trabalho e o papel dos profissionais humanos. Este futuro é promissor, revolucionário e irá mudar tudo que conhecemos e fazemos.
Tá, mas onde que pega então? O Valor de tudo irá mudar. A criação será feita por IA. Tudo: texto, arte, design… a pergunta que se estabelece é: o que será valor numa sociedade em que as máquinas criam melhor que os seres humanos? Pelas lentes da pluriversalidade esta perspectiva é válida, pois nos levará ao próximo passo de repensarmos coletivamente onde nossa humanidade está ancorada e impacta o nosso eixo humano da criação. Até hoje, desde a saída das cavernas, nos entendemos como criadores e produtores de tecnologia em série na história. E chegamos aqui criando nosso próprio clone superior que será um reflexo da sociedade humana que somos. E aí começam os grandes dilemas que teremos que lidar. Pois, como bem sintetizou Neil Reading: ‘Os dados refletem a sociedade e seus desafios. O mínimo é a ampliação de desigualdade social no ambiente digital e no físico. Recomendo o excelente artigo de Gláucia Guarcello na Época, em que ela elenca todas a implicações e impactos da IA em termos energético, trabalho, privacidade de dados e segurança, fonte aberta. Você daqui para frente ouvirá muitooooo o termo geração T (transição). Ou seja, a hegemonia humana acaba com este estágio tecnológico e teremos que entender aí como nos tornar Centauros (transhumanostechs).
2- Perspectiva reflexiva sobre a nossa humanidade em tempos de IA e caos. Esta perspectiva foi o grande suco do SXSW com o podcast de Esther Perrel, Brené Brown e Trevor Noah. Exploração do poder da conexão entre humanos, que está sendo impactado pela solidão, intimidade artificial. A maneira como nos comunicamos está sendo transformada pela tecnologia. A matéria de Renata Rocha para a Fast Company aborda de maneira cirúrgica todos os desafios que temos para nos envolvermos verdadeiramente com os outros. Usando a minha lente da pluriversalidade vejo que é preciso ir além de movimentos de desconexão e encararmos nossa vulnerabilidade e termos coragem de relacionamentos genuínos e significativos. Eles serão essenciais neste momento de transição e futuro da humanidade.
3- Perspectiva do Sul Global para uma inovação sustentável vinda de eixos periféricos. Tudo o que eu que trouxe até agora reflete uma realidade de visão e prática do Norte global. E mesmo sendo norte e sul estamos no mesmo planeta. A inovação periférica criada no Brasil parece trazer uma contribuição “weird” para o SXSW. A palestra de Bioeconomia com participação de Txai Suruí trouxe a força do Brasil para o epicentro da discussão de crise energética e ambiental. Porém, em nosso próprio país, a visão colonizada não dá importância e espaço para perspectivas revolucionárias e ancestrais que podem ser recursos preciosos nos tempos turbulentos que já estamos vivendo. Muito do que precisaremos logo ali para continuar sobrevivendo está bem pertinho de nós brasileiros. Acordem, pois não há mais tempo, as sabedorias que temos no Brasil poderão amenizar um pouco este futuro que está vindo como centauro.
4- Perspectiva de contracultura revolucionária. Mesmo que a IA saiba criar e ninguém mais pague um humano para isto, eu tendo a acreditar na capacidade revolucionária da contracultura. Pode ser utópico, sonhador… Mas quando vejo a arte presente com força no SXSW, seja através de obras de streaming, XR, cinema, música… mesmo com os protestos de artistas, eu também tenho um pouco de esperança que não seremos superados na nossa humanidade, se ela puder ser equilibrada neste contexto.
As lentes da pluriversalidade me ajudam a levar em consideração todas as perspectivas e a partir delas abraçar o desconforto com coragem para continuar acreditando que haverá humanos neste planeta, apesar de nós mesmos. Esta capacidade de continuar lutando foi inspirada pela revolucionária Jane Fonda sobre pensar e agir coletivo. E que nossa vida não termina em nós mesmos. Ela apenas começa. E por último me julguem ou não: está coluna foi escrita por mim sem nenhuma ferramenta de AI. Um modo vintage pós 9 dias de SXSW.
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Foto da Capa: Roberto Silva | Divulgação