Escrevi um texto chamado Função analítica da mãe, função poética do analista. A Diana Dadoorian, do Círculo Psicanalítico do Rio de Janeiro, jurou que se tratava de um artigo e publicou na Revista de lá. Tempos depois, recebi uma longa carta de um professor de Filosofia, da Universidade de Belgrado. Vamos por partes.
Na parte do meu texto, escrevi sobre o quanto mães são poéticas. E poetas. Investem no som, nas imagens e, sem se preocuparem com os sentidos de uma prosa, introduzem o bebê no mundo da subjetividade. E da linguagem. Poesia fora do livro. Poema em vida. E nada no desenvolvimento pode ser mais importante do que isso. Mães perdem tempo, tal qual os poetas, mães não se limitam ao que é concreto, tal qual os poetas, mães apostam suas fichas na prosódia, tal qual os poetas, e assim por diante para irmos adiante. Como se tratasse de um suposto artigo, precisei descolar algumas referências e incluí o linguista Roman Jacobson, que é o cara para decifrar os meandros indecifráveis de uma linguagem poética.
O professor Pavle Pavlovic, de Belgrado, encontrou o artigo na Internet e pensou que eu fosse um especialista em poética. No começo, achei que era uma pegadinha de algum amigo brasileiro, disfarçado de sérvio. Engraçadinhos dispostos a uma zoação não faltam ao meu redor. Mas fui checar no Linkedin e vi que o professor é ele mesmo, um especialista em semiótica. Seus estudos começaram analisando a novela do século XIX, sob as lentes de Peirce, Umberto Eco e do próprio Jakobson. Agora ele está interessado em cotejar a função poética com a história, a partir de uma análise literária, conforme eu pude entender.
Falando em entender, o restante de sua carta é um fascinante hieroglifo. Parece que ele parte de duas vertentes, uma que compreende a função poética como decorrente dos fatos históricos descritos na obra, outra como independente deles, porque extraído nas entrelinhas das descrições. Acho que pode ser isso, mas o meu inglês anda mais capenga do que o dele, e o Google tradutor impõe limites (Até tu, Google?), negando aos encostados uma demanda que exceda os 5000 caracteres.
O professor Pavle Pavlovic espera meus insights sobre a articulação entre os dois pontos suscitados por ele, a partir do tal artigo. Estou perdido e já tentei explicar que sou só um poeta-analista desconfiando de que é preciso poesia para viver, analisar e se desenvolver. Esse é o meu único insight, embora, pensando melhor, possa haver outro: a Internet ajuda na ponte, mas, por mais ignorante que ele seja – e, no caso, é -, precisa escrever um texto para haver diálogo e esperança de encontrar algum sentido.
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Foto da capa: Freepik