Tento, em vão, encontrar um tema para a crônica de hoje. Minha cabeça dá voltas e voltas, mas acaba sempre no mesmo lugar. Então vamos a isto!
Entrei no supermercado, peguei, como de costume, o carrinho de compras e me vi andando entre as prateleiras sem saber o que comprar. Não foi esquecimento, tampouco indecisão.
Parece exagero, mas reaprender a viver sem a presença diária dos filhos vai muito além da melancolia de uma casa vazia. É um reconhecimento dos nossos gostos e vontades que, durante muitos anos, acabaram ficando em segundo plano.
O que vou comer no jantar? Perguntei mentalmente uma e outra vez antes de encontrar a resposta.
Peixinho grelhado, legumes assados e arroz integral. Não bastasse a demora em tomar a decisão, também é preciso recalcular as quantidades. Uma bandeja pequena de peixe, uma berinjela, uma abobrinha, alguns tomates e temperos frescos.
Ainda peguei seis bananas, no lugar de doze, e um pack pequeno de iogurte, no lugar do pote familiar. Resumindo: comprei meia dúzia de coisinhas e saí do supermercado com aquela sensação de que havia esquecido algo.
Me desculpem a redundância de tema, mas para quem utiliza a escrita como uma forma de terapia e autoconhecimento, é essencial falar sobre o assunto até que eu consiga ressignificar “meu ninho”.
Neste sentido, também tenho pensado bastante sobre como vivi esta fase quando fui eu que saí da casa dos meus pais. Confesso que não me lembro bem da intensidade dos sentimentos, lembro que tive saudades.
Muito se fala de quem fica. E quem sai, quais são as dores e angústias?
Como foi a primeira noite longe de casa, sabendo que muito provavelmente vocês só vão voltar nas férias?
Vocês sentem falta do beijo de boa noite e do cafezinho corrido antes de sair pela manhã?
Como está sendo ficar longe do espaço seguro onde vocês aprenderam a falar, comer, dar as mãos, ir ao banheiro, ler e escrever?
Como é chegar em casa tarde da noite e não ter ninguém esperando?
Tudo é novo. E está tudo bem! É um pouco dor e um pouco cura. Isso é crescer. Nós daqui e vocês daí.
Eu e o pai estamos fazendo mais coisas juntos. A casa inteira está arrumada – e um pouco sem graça. Fiquei duas horas limpando a varanda para passar a tarde de sábado. Todos os papéis e documentos estão em ordem. Pilhas de roupas vão para doação. Ainda abro as janelas dos quartos de vocês todos os dias e, quando vou fechá-las, passo a mão nas camas.
Tenho aceitado convites para tudo. Só esta semana fui três vezes a Lisboa.
A guitarra do pai está na sala e meu material de pintura também.
Não falamos o tempo todo, mas com frequência relembramos momentos da infância de vocês. Vou arrumar os álbuns de fotos.
Os gatos estão tristonhos.
Falta pouco mais de um mês para o Natal. Tenho que começar e encher a despensa.
Vou ao supermercado de novo.
Desta vez, encho o carrinho, devagarinho.
Um por semana até vocês chegarem.
Terá tudo o que gostam. E o que eu gosto também.
Todos os textos de Pat Storni estão AQUI
Foto da Capa: Freepik