Uma vez, quando jogava no Flamengo e entregava pouco, ou não entregava nada do que a torcida esperava dele, Vampeta fez a seguinte declaração: “Eles fingem que me pagam e eu finjo que jogo”…
Em 2002, você lembra, o Vampeta desceu rolando a rampa do Palácio do Planalto. A seleção penta campeã mundial tinha sido recebida pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso que, dali a seis meses, também desceria – só que andando – aquela rampa depois de passar a faixa para o primeiro ex-operário a conquistar o cargo de Presidente da República Federativa do Brasil.
Alguns fatos recentes, todos ligados diretamente, ou indiretamente, ao Palácio do Planalto, me fizeram lembrar do Vampeta. Bueno, como diria o ex-governador Olívio Dutra, então, vamos adaptar as palavras do craque campeão aos players do jogo político, onde alguns insistem em fingir entregar o que prometem. Aqui no Brasil, todo governo começa atuando com um time e uma estratégia anunciados com antecedência para que a torcida/eleitorado compareça/vote e ajude o vencedor a enfrentar os adversários.
Depois de algumas rodadas – meses de governo – como no futebol, abre-se uma janela de transferências que na arena política é tratada por reforma ministerial. O normal seria que quem não está entregando saia para que entre os que prometem entregar. Aí, todo mundo – até alguns times de segunda – quer emplacar representantes na equipe principal e ninguém quer perder espaço.
O presidente Lula está com a primeira janela de transferências aberta. A pressão foi tanta que ele precisou mexer em áreas sensíveis . Teve que tirar duas mulheres do time. E tirou até quem ele – Lula – sabia que estava entregando o que devia, como Ana Moser, substituída por desconhecido Fufuka. E criou mais um ministério para acomodar um homem.
Hoje, o governo Lula tem representantes de 11 partidos que têm juntos, 389 deputados. Resta esperar que eles entreguem o que o Brasil, mais do que Lula, espera deles. A equipe econômica do governo federal tem forte retrancas para furar. É preciso concluir a reforma tributaria, cobrar impostos da offshores, taxar os chamados fundos exclusivos e, ainda, evitar desonerações, aumento de margens de isenção.
Com toda essa diversidade partidária – haja ideologia para definir 11 legendas, não? – o mais provável é que o governo precise negociar caso a caso, projeto a projeto para chegar bem ao fim do campeonato. Para boa parte dessa base meio gelatinosa do governo vale a regra vampetiana: eles fingem que me pagam, eu finjo que jogo…
Agora, se esses novos players da seleção ministerial do Lula e os que estão por chegar viram a pesquisa A Cara da Democracia, do Instituto da Democracia (IDDC-INCT) publicada no portal de O Globo, eles vão precisar jogar muito. A pesquisa ouviu 2.558 eleitores em 167 cidades, de todas as regiões do país, entre 22 e 29 de agosto. E o resultado é desolador para quem entende que só partidos fortes garantem a democracia.
Veja: 80% dos entrevistados dizem não simpatizar com nenhum partido político. Dos 20% restantes, 65% citam o PT. Outros 15% dizem simpatizar com o PL de Bolsonaro (pouco para quem se pretende um cabo eleitoral importante) e 17% citaram outros partidos, enquanto 4% não souberam responder.
Tem mais. Quando perguntados se existe algum partido do qual eles não gostem, 36% dos eleitores disseram que sim e 54% deles citaram o PT como o partido do qual não gostam. Em seguida, vem, de novo, o PL. A legenda do Bolsonaro é negada por 19% dos brasileiros que não gostam de algum partido.
O recado está dado: o povo está aprendendo a cobrar a entrega dos que são escolhidos para cuidar do país. O povo paga. O povo quer receber. Se a entrega não vem, dá nisso que a pesquisa mostra; quem não entrega trabalho, não recebe apoio. Ou recebe desprezo.