Não comentei na coluna anterior para não tirar o brilho dos maravilhosos concertos que desfrutei, mas não tenho como não comentar da frustração que foi perceber que a tão sonhada Casa da OSPA ainda não é o que a nossa orquestra e Porto Alegre merecem.
Reconheço e agradeço o esforço do governo do estado em encontrar uma solução para a OSPA. Hoje, graças à articulação iniciada pelo maestro Tiago Flores e seguida pelo maestro Evandro Matté, ela tem um lugar para ensaiar e se apresentar em boas condições, o que é ótimo. Alcançamos um novo patamar, mas não deveríamos ver isso como a solução definitiva.
Não tenho como não recordar da beleza que era escutar um concerto no antigo Salão de Atos da UFRGS ou até mesmo no antigo Teatro Leopoldina, um teatro que só uma cidade como Porto Alegre bota abaixo para construir no lugar um edifício sem graça. E nem preciso falar da inveja que sinto dos cariocas (Cidade da Música), paulistas (Sala São Paulo) e mineiros (Sala Minas Gerais) com suas salas sinfônicas. Vou parar por aqui para não deprimir ninguém.
O que me incomoda é justamente que não ouço, nos discursos oficiais, e mesmo nas falas dos frequentadores, que o espaço é provisório. Pelo contrário, há um orgulho exagerado nas referências a uma sala que foi concebida originalmente para ser o auditório do Centro Administrativo do Estado. Acho isso um problema e, por isso, escrevo na esperança de fazer voltar o desejo de termos uma sala sinfônica digna desse nome. Um estado que fez um Theatro São Pedro em 1858 pode fazer uma sala sinfônica de padrão mundial hoje.
Comecemos pelo o que o renomado consultor de acústica, José Augusto Nepomuceno (responsável pelas Sala São Paulo, Sala Minas Gerais entre outras), coloca: “Se você pode assistir a um espetáculo em alta definição, com som limpíssimo, sem enfrentar trânsito, sem fila para o banheiro ou café, por que raios, então, você iria a uma sala de concertos para assistir ao mesmo espetáculo? A resposta é esta: para participar de uma experiência memorável. E a acústica é parte central dessa experiência. Uma sala de concertos com acústica notável nos leva a um nível de emoção celestial. Se tiver um mínimo de humanidade dentro de você é impossível não se dobrar à emoção que a escuta em uma sala de acústica notável convida.”
Que a acústica é parte central, o próprio Marcos Abreu, responsável pelo projeto acústico da OSPA, reconhece: ele comenta que não tinha como elevar o teto da sala, não tinha como criar o volume de ar necessário para o som se expandir e se misturar adequadamente. Fez o que pode, e fez muito bem. A sala atual tem teto baixo, de 5,5 metros – o ideal seria 3 vezes mais. Como o som não pode subir como gosta e como a plateia está embaixo, ele é direcionado para frente como se saísse de um grande alto-falante, não se mistura antes de envolver o ouvinte.
Nas boas salas de concerto, a plateia fica acima do palco, olha-se, e ouve-se, de um plano mais elevado. A sensação é de imersão no som e a visualização dos instrumentistas é total. Na Casa da OSPA, infelizmente, isso não acontece. Nas primeiras fileiras, inclusive, sentamos num nível inferior aos músicos.
Outro aspecto importante, complementar, mas não secundário, é a localização. As melhores salas se encontram na beira de calçadas, em ambientes urbanos ricos de cafés e restaurantes, prontos para receber o público que sai de um espetáculo animado para confraternizar, socializar as boas energias que a audição solitária, em casa, não proporcionaria. O auditório Araújo Vianna, para shows, é um bom exemplo de ótima localização. Quando pensaram em localizar a nova sede da OSPA junto ao Shopping Total eu achei a ideia muito boa justamente por isso. Um endereço urbano. Infelizmente a ideia morreu.
Transporte público também é fundamental. Essa ideia de auditórios no meio de um parque de estacionamento (no Teatro do Sesi acontece a mesma coisa) está ultrapassada, é lamentável. É preciso inverter essa lógica. Nesse sentido, nunca vi com bons olhos – não gostava do projeto também – a ideia de uma sala ao lado da Câmara de Vereadores, num descampado cercado por estacionamento.
Meu sonho, desde a década de 1980, vou contar, é que se ocupasse a área daquele galpão dos Correios na Av. Sete de Setembro, para a nova sede da OSPA. Não tem sentido fazer triagem de correspondência em um endereço tão privilegiado.
Já pensaram? Em frente à Casa de Cultura Mario Quintana, a meio caminho entre o Gasômetro e os museus da praça da Alfândega, todos equipamentos ligados por um bulevar na 7 de Setembro que em seguida se encheria de bares e restaurantes e, quem sabe, de outras atividades culturais. É pedir muito?
Foto da Capa: Acervo do Autor
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