Hoje escrevo para demonstrar minha gratidão às mulheres da minha vida. Amigas, filhas, irmã, tias, primas, cunhadas, mulheres próximas ou distantes geograficamente. Tenho sido carregada no colo por elas. Com chazinhos, bolo, passeios, mensagens, vídeos, abraços, palavras. Não sei o que seria de mim nesses últimos meses sem a minha rede de mulheres. Também não sei pensar meu futuro sem ela. O conforto que me trazem é imenso.
Deepak, obrigada
Dia desses, mexendo em meus papéis, encontrei escritos antigos. Um deles foi daquelas jornadas de abundância que foram muito comuns. Onde éramos convidados a participar de grupos fechados para completar uma série de “tarefas” num determinado período. A jornada do Deepak Chopra foi a que realizei. Uma das tarefas era projetar metas para o futuro. Lá, no distante 2015, uma das minhas metas foi a de ampliar a rede de afetos de amizades femininas. Hoje, passados nove anos, me encontro – apesar do momento difícil onde me encontro – com essa rede sendo fundamental em meio a ele.
Homens são de Marte. Mulheres são de Vênus. Por quê?
Noutro dia, assistia a uma série (desculpe, não lembro qual era, apenas que era um dorama…) e me chamou atenção num dos capítulos uma sequência de cenas. Na primeira, um grupo de casais em viagem batia papo animado, a seguir aparecia o grupo de mulheres, que antes não se conheciam, logo se familiarizando a partir de interesses superficiais como maquiagem, em seguida para questões como as dificuldades enfrentadas no trabalho e sobre suas relações afetivas. Logo já estavam agindo como se fossem “amigas desde a infância”. Enquanto isso, entre os homens, mesmo que amigos de longa data, a conversa era truncada, o assunto difícil, a ponto de eles irem buscar a companhia das companheiras. Claro que há diferenças culturais e, em alguns países, isso é mais marcado do que em outros. Mas se olharmos para cá, isso não é muito diferente.
Mulheres são difíceis de entender e fofoqueiras. Será?
Confiança mútua, colocar-se vulnerável, nomear sentimentos, nós mulheres aprendemos desde os tempos imemoriais. Ao redor das mesas de cozinha, nos fogões, em rodas de costura, cuidando dos filhos uma das outras. Criança, lembro de dormir embalada pelas conversas da minha avó, mãe e tias, confidenciando seus problemas e se aconselhando mutuamente. No entanto, sempre quiseram fazer com que a gente acreditasse que somos difíceis de compreender porque entendemos os subtendidos, as filigranas, os não ditos. Assim como quiseram nos fazer acreditar que somos fofoqueiras para barrar nossos encontros e cumplicidades. E ainda há muita gente que acredita em tudo isso. Porém, a história que não nos é contada é que isso tudo foi inventado para que a gente não experimentasse essa força que temos quando estamos em rede. Essa proteção, conexão e esteio que sabemos ser umas às outras. Leia A História Oculta da Fofoca, de Silvia Federici.
A fragilidade masculina varrida para debaixo do tapete
Essa dificuldade entre os homens tem explicação em pesquisa, conforme dois projetos realizados pelo Instituto PDH – Papo De Homem. No primeiro, com mais de 40 mil homens, intitulado “O Silêncio dos Homens”, um dos achados importantes foi o de que apenas três entre 10 homens conversavam sempre com amigos sobre seus sentimentos, enquanto que entre eles seis precisavam lidar com problemas de saúde mental (não diagnosticados), mas apenas um entre estes 10 afirmava buscar tratamento psicológico. Dificuldades que são transferidas para as gerações futuras, pois no segundo projeto realizado, chamado “Meninos, Sonhando os Homens do Futuro”, encontraram-se resultados que reforçam essas dificuldades, pois cinco em cada dez meninos entre 15 e 17 anos afirmam que não têm certeza de que seus pais os amam, 6 dizem que têm poucas referências positivas masculinas (mas que seu pai é a principal referência masculina, mas nem sempre a melhor referência). Metade dos responsáveis pela educação desses meninos afirma que não têm uma rede de apoio com quem compartilhar seus medos e os desafios para criá-los.
Nessa construção, os homens concordam terem sido ensinados em cada uma das crenças a seguir, durante a infância e adolescência:
- Ser bem-sucedido profissionalmente. (85%)
- Não se comportar de modos que pareçam femininos. (78%)
- Ser fisicamente forte. (73%)
- Ser o responsável pelo sustento financeiro da família. (67%)
- Não expressar minhas emoções. (57%)
- Dar em cima das mulheres sempre que possível. (48%)
Somente 2 a cada 10 homens dizem ter tido exemplos práticos de como lidar com as suas emoções. Como garantir uma geração de homens que possam se relacionar consigo mesmos e nas suas relações de forma mais saudável?
É possível tecer uma rede de afeto depois que cresce
Lá em 2015, me dei conta de que, com o passar do tempo, em função da família, dos atropelos da rotina, a “vida de adulta”, precisava incrementar a minha Saúde Social. Com a tal jornada do Deepak Chopra, como disse, uma das metas que me coloquei foi ampliar minha rede de afeto feminina, em especial, pois via nela a potência que desejava nas minhas relações pessoais. Isso levou tempo e aprendizado.
O que fazer para resgatar o círculo de amizades como antigamente? Aquecer esse círculo com gente que nos energize e nos reconheça só pelo olhar? Precisa de investimento de tempo e disposição, mas é possível. E vale muito a pena, pois incrementa a nossa saúde mental, física e é fator de aumento da nossa longevidade.
- Construir relacionamentos requer dedicação. Não fique em casa esperando. Ligue para seus familiares, amigas/os antigos para saber como vão, o que estão fazendo, convide para algum programa juntos. Se for convidada/o, aceite, mesmo que não seja muito do seu estilo. Dê uma chance. Seja flexível.
- Sabe aquela/e amiga/o da escola, do trabalho, do bairro, de quem você era muito próxima/o e que lhe traz boas recordações? Tente contato. Quem sabe pelas redes sociais? Mande uma mensagem. Pergunte sobre como vai a vida. Marque um encontro!
- Frequente lugares em que você vai encontrar pessoas com as mesmas afinidades que você. Gosta de fazer esporte, ciclismo, corrida? Quem sabe a academia ou um dos grupos de afinidade? Gosta de arte e cinema? Quem sabe exposições, museus, cursos a respeito desses temas. Jardinagem, literatura, voluntariado, clube do livro, igreja, etc. Isso irá potencializar o encontro com pessoas dispostas a viver as mesmas experiências, valores e saberes que você compartilha.
- Seja anfitriã/ão. Recebe as pessoas na sua casa. Isso fortalece as relações e permite acesso à sua intimidade.
- Mantenha aquecido o contato. Crie um calendário onde você ligará ou mandará uma mensagem para suas pessoas amigas continuamente, ou combinará uma frequência para os encontros com elas.
- Confie. Como? Confiando. Ajude e peça ajuda. Ou como tão bem escrito no poema Saber Viver, de autor desconhecido, larga e falsamente atribuído a Cora Coralina:
Não sei… Se a vida é curta
Ou longa demais pra nós,
Mas sei que nada do que vivemos
Tem sentido, se não tocamos o coração das pessoas.
Muitas vezes basta ser:
Colo que acolhe,
Braço que envolve,
Palavra que conforta,
Silêncio que respeita,
Alegria que contagia,
Lágrima que corre,
Olhar que acaricia,
Desejo que sacia,
Amor que promove.
E isso não é coisa de outro mundo,
É o que dá sentido à vida.
É o que faz com que ela
Não seja nem curta,
Nem longa demais,
Mas que seja intensa,
Verdadeira, pura… Enquanto durar.
Acredito no amor. Não estou falando desse amor romântico, em que a princesa está esperando o seu príncipe encantado. Mas naquele que a gente espalha pelo mundo. Para quem está na vida conosco. Acredito em energias que a gente emana e que, de algum lugar, voltam. Nem sempre da fonte para onde a gente mandou, é verdade. Mas te digo, esse texto é uma forma de eu retribuir esse amor que tenho recebido. Essa mulherada querida que me envolve e embala. Obrigada, de coração.
Foto da Capa: Freepik
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