Cheguei em Paris no dia de São João, 24 de junho, e me dispus, após tanto tempo desejando conhecer esta cidade, mergulhar desde o início para saborear cada momento e experiência. Meu plano foi partir do aeroporto Charles de Gaulle de metrô para o 15º arrondissement, que eu não imaginava onde ficaria (kkk), simples assim.
Mas como fui ensinada pela minha mãe que quem tem boca vai a Roma, Paty dans le Paris também tem este mantra. Se desafiar a me comunicar na língua francesa errando, tentando, googlando, mas antes de tudo aprendendo e me comunicando. Me abrindo para a vida como tudo que fiz até agora nesta existência. Esta energia me levou a sair conversando em francês na imigração até a atendente do metrô. E notei que procurei inconscientemente me comunicar com pessoas negras ou árabes.
Hoje refletindo penso que esta sensação de chegada na Europa é a sensação dos imigrantes. De quem não é local, e consegue ter mais empatia com a barreira linguística e com a desorientação inicial. A moça do metrô me disse que era de Benin, me levou até o lugar de fazer o Navigo (passe de transporte). E me orientou a entender que eu precisava de trajeto. E ainda muito fofa me pediu pra guardar o celular. Tudo de forma elegante e prestativa. E eu que vim esperando patadas me surpreendi.
Entrei no trem do Charles de Gaulle para a estação Châtelet-Le Halles que seria o entroncamento para que eu pudesse pegar a linha 13 e neste trajeto de quase 40 min me chamou a atenção muitas questões:
1. A presença de africanos falando francês de forma fluida provavelmente de origem de países colonizados;
2. Muitos mulçumanos, árabes pretos e brancos;
3. Muitos europeus brancos, brancos tipo livro de história provavelmente alemães, nórdicos.
Em suma, o primeiro pensamento dentro do trem foi: esta é a torre de babel mundial. E eu achei tão lindo. Tão inspirador nos ver e nos sentir ali todos junto naquele trem como uma boa metáfora do que forma a humanidade. Era sábado, quente, trem lotado. Não senti o cheiro que me avisaram que ia sentir… achei até bem melhor mesmo lotado. Aí pensei: o preconceito sempre está por tudo. “Ah você vai sentir um cheiro horroroso”. “Aí eles fedem”. Senti cheiro de gente, de ser humano, com vários odores. Mas não senti nada ruim. E pensei: interessante. Como cada um tem que viver a sua experiencia porque dependendo de onde vem a percepção muda.
Fui perguntando, perguntando e descendo nas estações e cheguei no 15º arrondissement. E já com fome parei em um take way de saladas de um indiano que viu que eu estava perdida. Me fez sentar, conversou comigo em francês, me orientou e eu relaxei. Comi e logo depois segui em busca do Hostel. Me veio outro pensamento: como existe gente disposta no mundo a dar a mão a outras pessoas. De forma simples, de forma direta.
Na realidade minha chegada a Paris sem guia e por mim me fez colocar em prática o que sempre desejei que é ir além do debate étnico racial, e sentir a multiculturalidade. Uma vez em uma entrevista, a Laura Schiavone, da Metta, me disse isto: “Eu consegui compreender o poder e a beleza da diversidade multicultural vivendo fora do Brasil”. Na época aquilo me brilhou o meu olho, a curiosidade sobre o que é a tal multiculturalidade.
A multiculturalidade ocorre em grandes centros mundiais e o mais próximo que temos no Brasil é São Paulo onde muitas culturas se encontram, se conectam, se reconhecem e convivem formando um ambiente rico em culturas e interconexões. Com choques e delícias também das grandes megalópoles.
O Brasil tem a natureza histórica da multiculturalidade, mas algo aconteceu neste trajeto que se formou uma sociedade baseada em elitismo e exclusão. Das muitas primeiras percepções que estou tendo com uma ótica externa, claro, é que em Paris tem algo muito diferente.
Ainda não sei dizer ao certo, mas senti acolhimento. Muito acolhimento. E estou viajando sozinha. Talvez seja porque estou falando francês mesmo com os erros. Talvez porque eu esteja aberta sem preconceitos ou medos? Talvez seja porque estou sendo acolhida de verdade. Já me perguntaram se sou marroquina, espanhola (deve ser latina… kkk) ou árabe. Mas ninguém disse que sou brasileira. Fiquei intrigada com isto.
Não ser reconhecida como brasileira significa o quê?
Deixo para vocês esta reflexão.
Boné journee!!