Começo esta coluna relembrando que no dia 22, ocorrerá mais uma etapa do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano Ambiental de Porto Alegre (PDDUA-POA): o Seminário Leitura da Cidade. O evento é aberto ao público e “em breve” as inscrições estarão abertas (link aqui).
Neste mês, alguns lançamentos de livros de caráter crítico chamam a atenção. Semana passada fiz uma referência ao lançamento de “Reforma Urbana e Direito à Cidade em Porto Alegre” (aqui).
Hoje apresento às leitoras e leitores atentos outro lançamento instigante: “Movimentos Sociais e Autonomias: imaginação, experiências e teorias na América Latina” do querido Gustavo Oliveira e da querida Monika Dowbor. O livro é dividido em dez capítulos e traz alguns conteúdos que são muito pertinentes para às discussões de planos diretores, projetos de leis no âmbito ambiental e climático e outros instrumentos de políticas públicas tão cruciais para escaparmos do apocalipse subjetivo que estamos inseridos.
A narrativa dos conteúdos caminha por termos como “diluição banalizante”, “autogestión”, “marco del colapso”, “frustrar a catástrofe”, “labirintos da emancipação”, “autogoverno”, “limites da autonomia” e “utopia”. O livro é escrito por pesquisadores que produzem em português e em espanhol. Tem a beleza de trazer pesquisadores de outras partes da América Latina.
A questão da participação cidadã está tão associada à discussão que esse livro propõe que os espaços de discussão governamentais devem — ou deveriam — iniciar com debates com conteúdos de especialistas, críticos e pesquisadores sobre o crucial, nesse caso, sobre as formas de ordenamento social e os processos de mediação entre cidadãos. Os governantes simplesmente esquecem que são eleitos para governar para e com as cidadãs e cidadãos e não só para alguns.
A cidade de Porto Alegre e o estado do Rio Grande do Sul são casos emblemáticos dessa problemática. A destruição do Parque Harmonia e a privatização da Companhia Riograndense de Saneamento (Corsan) são exemplos sintomáticos do autismo governamental. Longe de radicalizar esta análise, alguns municípios e estados brasileiros estão sob comando de reacionários. Esses estão ancorados em uma distopia urbano-rentista sem limites. A distopia urbana é transformar o colorido em cinza, ou seja, derramar cimento em todas as áreas ainda com remanescentes de biomas da Mata Atlântica no Sul ou parques ainda em pé em Porto Alegre — só para ficarmos no exemplo da capital. E a distopia rentista é acelerar os níveis de especulação imobiliária ao máximo — onde o limite é o céu. Nesse futuro distópico, o céu em breve será cinza, mas não porque está coberto por nuvem carregadas de chuva.
Entre a distopia cimento-imobiliária e a utopia de uma cidade viva para e com humanos e não humanos, especialmente àqueles mais vulneráveis, a escolha é individual, mas os efeitos não. É preciso pensar que há outros mundos possíveis, e para que isso seja materializável é crucial atuar e participar ativamente dos espaços públicos e de decisão. Ser político é ser cidadão e ser cidadão é ser político.
Finalizo parafraseando alguns críticos sagazes: mais do que compreender o mundo, é preciso intervir para que seja possível coexistir em um mundo onde caibam muitos mundos.
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Leitura crítica indicada:
Oliveira, Gustavo; Dowbor, Monika. Movimentos Sociais e Autonomias: imaginação, experiências e teorias na América Latina. São Paulo: Lutas Anticapital, 2023.
Foto da Capa: Sergio Louruz / PMPA