Chegou ao Brasil o fenômeno observado em países ricos de que as mulheres não desejam mais ter filhos. Isto ocorre em determinados estratos sociais e não impede que a população do Brasil e do Mundo continue crescendo. Mulheres com pós-ensino médio tendem a ter menos filhos do que aquelas com baixa escolaridade.
As previsões da ONU indicam que a população mundial crescerá até cerca de 2050 e depois começará a diminuir. Esse crescimento que vem ocorrendo está concentrado nas regiões mais pobres da África, Ásia e Oceania. Desde 2010, vinte e sete países tiveram uma redução de 1% ou mais no tamanho de suas populações devido aos baixos níveis de fertilidade. A taxa de natalidade só não é menor nos países ricos porque lá também existem pessoas pobres e com baixa escolaridade. Isso não acontece apenas com países europeus, Japão, EUA, Canadá, Austrália e Nova Zelândia, estima-se que a China terá uma redução de 31,4 milhões de pessoas entre 2019 e 2050.
A taxa de fecundidade indica a média de filhos por mulher durante seu período reprodutivo. Segundo o Fundo de População das Nações Unidas, a taxa de fecundidade mundial atual caiu de 3,2 nascimentos por mulher em 1990 para 2,5 em 2019. Para manter uma população estável, é necessário ter 2,1 filhos por mulher. No Brasil, a taxa de fecundidade é de 1,7, bem abaixo do necessário para a reposição.
Mas por que as mulheres com pós-ensino médio não querem mais ter filhos? Nos EUA, uma pesquisa mostrou que uma das principais razões é a forma como o mundo corporativo trata as mulheres. Embora a legislação brasileira garanta às mães melhores condições do que a americana, as mães brasileiras continuam a ser discriminadas no mercado de trabalho.
Deve-se considerar também que ter filhos no Brasil é muito caro, pois, ao contrário de outros países onde a educação pública é de qualidade, aqui, a mensalidade de uma creche pode ser mais cara do que a de uma faculdade. Com a chegada dos filhos, as despesas aumentam e, em alguns casos, a renda da família é reduzida devido à necessidade de afastamento ou redução da jornada de trabalho da mãe.
Especialistas citam outras razões, como uma certa desmistificação do “ser mãe é padecer no paraíso”. Hoje é bem maior o número de mulheres que investiram no autoconhecimento e que buscam informações sobre a gestação e a primeira infância. Mães influencers contribuem com isto e mostram suas rotinas sem glamour e descontroem a imagem da “mãe perfeita”.
Menos crianças, mais pets? Certa vez, perguntei a um grupo de alunas quem tinha filhos, e mais da metade das que levantaram a mão relataram que eram mães de filhos de quatro patas. Parece ser uma tendência de que cães e gatos ocupem o lugar de crianças. Ao caminhar nos parques, vejo pessoas empurrando carrinhos de bebê com pets. Uma pesquisa do Sindicato da Indústria de Produtos para a Saúde Animal em 2021 identificou que 21% das casas que têm cachorro são de casais sem filhos e 9% de pessoas que moram sozinhas. O percentual relativo a gatos é ainda maior: 25% das casas são de casais sem filhos e 17% de pessoas morando sozinhas.
Neste contexto, a pressão social para que casais tenham filhos vem diminuindo. A nova geração não sente necessidade de explicar por que não deseja ter filhos. Alguns até deixam claro que preferem não ter filhos e se arrepender disso mais tarde do que ter filhos e arrependerem de tê-los. Não ter filhos dá aos jovens casais uma sensação de liberdade que seus amigos pais não têm.
Decidir interromper uma carreira profissional para cuidar dos filhos por um período é uma exceção. Esta situação é muito bem ilustrada no vídeo “Ser madre es um plus” em que uma mulher muito competente, com um ótimo currículo, resolve fazer uma pausa na carreira profissional para dedicar-se aos filhos. Quando ela volta ao mercado de trabalho, não consegue emprego por ter “ficado fora do mercado” por alguns anos. Então ela inclui no seu currículo a informação de que passou este período desenvolvendo a capacidade de assumir riscos, de fazer esforço e sacrifício, comunicação e oratória, gestão de recursos, capacidade de motivação, organização e planejamento, perseverança e constância e trabalho em equipe e liderança. Na entrevista seguinte impressiona o entrevistador que a contrata e pergunta: “Em que empresa desenvolveste todas estas habilidades?”. Trata-se de uma homenagem a todas as mães que dedicam seu tempo, carinho e abnegação para cuidar dos filhos, qualidades que são valorizadas em todas as áreas da sociedade.
Uma sociedade que deseja atingir a taxa mínima de fecundidade para se manter estável, para ter jovens trabalhando para pagar a pensão dos aposentados, precisa prover os meios para garantir condições seguras e confortáveis para as mães que desejarem ter filhos. Talvez algum dia aprendamos com as tribos indígenas que consideram todas as crianças da tribo como seus filhos e todos são responsáveis por cuidar delas.
Referências:
– Taxa de natalidade e taxa de mortalidade
– Taxa de fecundidade no Brasil é baixa e está em queda acelerada
– População mundial deve ter mais 2 bilhões de pessoas nos próximos 30 anos
– Cada vez mais brasileiros veem pets como filhos, tendência criticada pelo papa
Foto da Capa: Samson Katt / Pexels