Durante um bom tempo acompanhei rindo pra valer o programa “Larica Total”, que ia ao ar no Canal Brasil, de 2008 a 2012. O ator Paulo Tiefenthaler encenava um homem que morava sozinho num apartamento pequeno e ensinava receitas do que chamava “a cozinha de guerrilha”. Era o oposto dos programas refinados de culinária. Com o que encontrava na sua geladeira, sempre carente de grandes ingredientes, ele fazia pratos como o “Frango total flex”, “Só o macarrão salva”, “Vivendo e aprendendo a flambar” e por aí vai. A atuação envolvente do Paulo e as divertidas falas do seu texto, tudo num clima de intimidade e despojamento, colocavam o programa como um dos meus preferidos daquele período.
Em 2013, fiquei fã de uma outra produção que trazia humor de um jeito novo. Era “O último programa do mundo”. Passava na MTV Brasil. Apresentado por Daniel Furlan, tinha como mote o próprio fim da emissora que estava prestes a acontecer. Contracenava com Furlan um personagem totalmente non sense, o Vice-cônsul de Honduras, com o ator Juliano Enrico. No formato de talk show, os entrevistados eram os câmeras, o porteiro da emissora, trazendo o clima de desolação que se apoderava da finaleira daquele projeto. Um quadro divertidíssimo era o “Frases que valem um tapa na cara.” Também aparece mais para os últimos episódios um novo personagem: Rogerinho do Ingá, com o ator Caito Mainier. Novamente, o texto com surpresas e muita irreverência contrastava com tudo que estava no ar pelo Brasil naquele momento.
Seguindo Daniel Furlan, cheguei aos programas “Falha de Cobertura”, iniciado em 2014, e “Choque de Cultura”, que começou em 2016. No primeiro, Furlan, que encarna um ex-craque, e Caito, como um ex-presidiário, comentam, com seus pontos de vista hilários, partidas de futebol. No segundo, “os maiores nomes do transporte alternativo” comentam filmes. São quatro motoristas de van dando opiniões que nos fazem perder o fôlego de tanto rir. O quarteto é formado por Caito como Rogerinho do Ingá, Furlan como Renan de Almeida, Raul Chequer como Murilo dos Anjos e Leandro Ramos como Julinho da Van. Participou como diretor o Juliano Enrico, que criou também com Daniel em 2014 o desenho animado “O irmão do Jorel”, outra produção cheia de novidades que foi ao ar no Cartoon Network. Um dos roteiristas do desenho é o Raul Chequer, que dirigiu “O último programa do mundo”.
E, recentemente, ao assistir ao “Larica Total 10 anos depois”, um reencontro com Paulo Tiefenthaler e a equipe do programa, vi que, entre os redatores e diretores, estão o Caito e o Leandro Ramos.
Em todas essas produções com o que há de mais moderno no humor brasileiro atual, está a mesma turma. Fazem parte da TV Quase, que surgiu da revista em quadrinhos Quase, publicada em Vitória, no Espírito Santo, de 2002 a 2009. Daniel Furlan, Caito Mainier, Leandro Ramos, Raul Chequer e Juliano Enrico são os atores e roteiristas que estão fazendo um novo humor com textos inteligentes e grandes atuações.
Jerry Seinfield, numa série em que entrevista humoristas, “Comedians in Cars Getting Coffe”, disse que o princípio do humor, sobretudo o do que ele faz, é partir de uma afirmação ilógica e tentar provar que ela faz sentido. Os textos dessa turma da TV Quase levam ao infinito esse princípio. E, pensando na tragicomédia em que vivemos no Brasil de hoje, afirmar o ilógico e tentar provar que faz sentido parece estar na ordem, ou na desordem, do dia.
Termino com um poema do meu livro “O Menos Vendido”, que saiu em 2006 pela editora Nankin:
fim da utopia
ninguém quer dividir nada
só a conta