A decisão da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), que revogou a prisão preventiva do ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral Filho, sem prejuízo da imposição pelo juízo de origem de outras medidas cautelares, causou grande repercussão dentro e fora das redes sociais. Desde então, muitas pessoas debatem o assunto, algumas com conhecimento jurídico, outras com pouco ou nenhum domínio sobre o tema, todavia as reprovações a mais alta corte não são poucas. Some-se a isso que toda decisão ou fato recente envolvendo qualquer área do direito, da cultura, dos esportes, dos símbolos nacionais, das cores das roupas, virou para uma certa parcela mais passional, alvo de debate político.
Sei que a sensação de impunidade dos crimes cometidos pelos poderosos no Brasil é imensa. Não é preciso o IBOPE para se dar conta disso. Não faltam pessoas de todos os partidos e segmentos mencionando a toda hora que os políticos dos outros partidos deveriam ser presos, e vice-versa. Mas a realidade é que devem ser respeitados os direitos e garantias fundamentais previstos na Constituição Federal que determinam que ninguém será privado da sua liberdade sem o devido processo legal, e que ninguém será considerado culpado antes do trânsito em julgado da sentença condenatória.
Se serve de consolo, essa prisão preventiva era referente a apenas um dos crimes dos quais ele foi acusado. Assim, mesmo com esse Habbeas Corpus, o ex-governador, por enquanto, continuará preso, em razão de prisão domiciliar que foi decretada em outros processos que responde por ocultação de patrimônio ilegal. Cumpre lembrar que ele cumpria 5 (cinco) prisões preventivas, das quais 3 (três) foram revogadas mediante certas condições, e duas convertidas em prisão domiciliar.
Vale salientar que o ex-governador foi denunciado em 35 (trinta e cinco) processos, sendo que alguns estão em estágio inicial, e outros já em grau de recursos, inclusive no Superior Tribunal de Justiça (STJ). Entretanto, mesmo tendo decorrido um tempo considerável, ainda não há uma única condenação com trânsito em julgado, ou seja, uma condenação definitiva, da qual não se pode mais recorrer. Em razão desses processos ele chegou a receber 23 (vinte e três) condenações, com um total de penas que se somadas resultariam em 425 (quatrocentos e vinte e cinco) anos de prisão.
O voto do Ministro Gilmar Mendes foi decisivo e em síntese ele sustentou que a prisão preventiva do ex-governador seria uma antecipação do cumprimento de uma pena por algo que ele não foi condenado, o que indiscutivelmente é uma realidade que salta aos olhos, e viola os direitos fundamentais acima mencionados. Não é razoável que alguém fique mais de 6 (anos) preso preventivamente. Isso obviamente é uma antecipação de uma pena de uma condenação que pode nunca existir.
Prisão Preventiva
A prisão preventiva é uma prisão cautelar, cabível durante o inquérito policial, ou na fase da instrução criminal, ou seja, da durante a ação penal.
Conforme determinado na lei processual penal, ela poderá ser decretada:
- como garantia da ordem pública, da ordem econômica,
- por conveniência da instrução criminal ou para assegurar a aplicação da lei penal,
- quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria e de perigo gerado pelo estado de liberdade do imputado.
Além disso, ela também poderá ser decretada caso haja o descumprimento de obrigações impostas por outras medidas cautelares. Diante da gravidade dessa medida, ela precisa ser motivada e fundamentada, deve haver um receio de perigo e a existência concreta de fatos novos ou contemporâneos que a justifique.
A decretação da prisão preventiva será cabível:
I – nos crimes dolosos punidos com pena privativa de liberdade máxima superior a 4 (quatro) anos;
II- se o réu tiver sido condenado por outro crime doloso, em sentença transitada em julgado;
III – se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.
Quando houver dúvida sobre a identidade civil da pessoa ou quando esta não fornecer elementos suficientes para esclarecê-la, sendo que o preso deverá ser colocado imediatamente em liberdade após a identificação, salvo se outra hipótese recomendar a manutenção da medida.
Prisão domiciliar
A prisão domiciliar, como o próprio nome indica, é aquela que ocorre quando o indiciado ou acusado se recolhe em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial. Geralmente, nesses casos, o preso utiliza uma tornozeleira eletrônica.
A prisão domiciliar será uma possibilidade de substituição à prisão preventiva quando: o agente for maior de 80 anos; estiver extremamente debilitado por motivo de doença grave; for imprescindível para os cuidados de pessoa menor de 6 (seis) anos ou com deficiência; for gestante; mulher com filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos; homem, caso seja o responsável pelos cuidados do filho de até 12 (doze) anos de idade incompletos.
Com relação à soltura do ex-governador, achei algo correto sob o ponto de vista do direito, porém triste para o Brasil e para o judiciário. Não é razoável que os processos no Brasil demorem tanto tempo para serem solucionados com trânsito em julgado. Isso quando não prescrevem depois de anos aguardando julgamento dos recursos nos tribunais, deixando em liberdade alguns criminosos com muito poder e ganância por dinheiro.
O judiciário brasileiro precisa ser mais célere, pensar em uma reestruturação. Menos recessos e apenas um mês de férias seria um bom início. Essa demora para o julgamento dos processos viola o princípio da duração razoável do processo, prejudicando a sociedade, os advogados que na sua grande maioria dependem do resultado dos processos para sobreviverem, e também o erário público, pois boa parte dos recursos econômicos e humanos, colocados a serviço das investigações e para manter o judiciário funcionando, são desperdiçados quando ocorre uma prescrição, por exemplo. Aliás, prescrição esperando julgamento em um tribunal é sinal de que algo não vai bem, que a eficiência não é a esperada. Triste Brasil.